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Crítica - Romance

Fiel a seus temas, Michel Laub reflete sobre acaso e destino

Colunista da Folha evoca show do Nirvana no Brasil no livro 'A Maçã Envenenada'

ALFREDO MONTE ESPECIAL PARA A FOLHA

Pode-se ler "A Maçã Envenenada" sem saber que era a segunda parte de uma trilogia (iniciada com o excelente "Diário da Queda", 2011). Fez diferença?

Em certo aspecto, não. Pois Michel Laub é um autor fiel aos seus temas: no novo romance, assim como no anterior ou em "Longe da Água" (2004), a narração evolui em volutas retomando um ponto fortuito da juventude, que se revestiu, na dinâmica da trajetória de vida, como signo de desvio, de "queda", cristalizando a irrevogabilidade do acaso e prefigurando um destino.

Agregam-se a esse "instante inflexivo" as amizades e lealdades escorregadias e a reflexão geracional. "A Maçã Envenenada" evoca, já pelo título, o Nirvana, e aquela concepção romântica que a morte precoce de um artista carrega, de não conseguir lidar com a realidade corrompida.

Ao rememorar o suicídio de Kurt Cobain, revive também o namoro tumultuado com a intensa e destrutiva Valéria, à época do show do cantor e sua banda aqui no Brasil.

O gancho para esse recuo aos anos 1990 é a entrevista com uma sobrevivente do genocídio em Ruanda, cuja vontade de viver mesmo tendo passado por horrores funciona como a "sombra" desse drama afinal tão burguês.

Quando canta a inocência, ou algo muito parecido com ela, apesar da contenção e parcimônia do narrador, o relato é incisivo. Faz falta um aprofundamento da "experiência".

De fato, sempre elogiada por inserir na narrativa um veio ensaístico, esse é o ponto onde, conforme amadurece e requinta sua fabulação, a prosa laubiana se mostra mais frágil.

Raramente sai da zona de conforto, da moldura que adotou como base, eximindo-se de aprofundar os temas perturbadores e dramáticos que suas histórias nos oferecem, contentando-se com afirmações genéricas e alusivas.

Por exemplo, ao falar da sobrevivente de Ruanda: "Adianta esta mulher ter passado por uma experiência tão radical, Valéria, se ao término tudo o que ela faz é dar uma lição aguada de breguice...".

Como ele não vai muito adiante na reflexão, parece a opinião fútil de alguém comodamente refestelado na sua melancolia pós-moderna.

O que é injusto, claro, pois a prosa de Laub não é superficial. O que ele, como autor, não pode, ou não deveria, é continuar mantendo a mesma parcimônia de seus personagens e suas meias-vidas. Pois tem muito a dizer.


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