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Brasil exótico já não vende, diz consultor
Abordagem 'caricatural' do país do 'samba e do futebol' deixou de interessar às TVs estrangeiras, segundo especialista
Para francês Yves Jeanneau, produção não está pronta para demanda por filmes que expliquem o país
A realização da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016 no Brasil despertou o apetite de canais estrangeiros por documentários feitos no país. Porém, na avaliação do produtor e consultor francês Yves Jeanneau, a oportunidade não está sendo bem aproveitada pelos produtores de filmes brasileiros.
"Há uma demanda real. Mas a produção documental brasileira ainda não responde a isso, porque se preocupa sobretudo com o mercado doméstico", diz Jeanneau.
Ele é fundador da Sunny Side of The Docs, iniciativa que promove coproduções. Nesta semana, esteve no Brasil a convite da Associação Brasileira de Produtores Independentes de TV, para workshops com produtores.
Segundo Jeanneau, a atração estrangeira pelo exotismo brasileiro acabou. "Os canais não querem falar de futebol. Querem saber dos desafios e soluções desse país."
A seguir, trechos da entrevista que deu à Folha, em São Paulo, na última segunda.
Folha - O retrato de um país exótico é o que o público estrangeiro espera ver em documentários sobre o Brasil?
Yves Jeanneau - Não. O exotismo acabou. Isso que vimos durante anos com uma abordagem um pouco caricatural do samba, do Carnaval e do futebol não é mais visto como original e perdeu interesse. O Brasil é parte dos Brics [grupo político-econômico formado ainda por Rússia, Índia, China e África do Sul], e há um real interesse por compreender o que está em jogo nesses países, que fazem parte de um contexto econômico e geopolítico complexo.
Há uma receita para produzir um documentário que interesse ao mercado internacional?
Sim. É preciso conhecer bem o mercado e suas tendências, saber o que os canais querem e, sobretudo, o que o mercado não quer. É quase impossível que um filme sobre o mal de Alzheimer, embora sendo uma doença universal, interesse ao mercado internacional. Isso porque cada país já fez seu próprio filme sobre Alzheimer.
O sr. concorda com a avaliação de que, na média, o documentário brasileiro abusa do recurso de entrevistas e da voz em off e é pouco criativo?
Esse problema não é particular do Brasil. Ocorre em todo lugar, por duas razões. É muito mais fácil fazer um filme dizendo coisas do que mostrando, o que exige um trabalho artístico, de dramaturgia e montagem muito mais difícil de realizar.
Em segundo lugar, há a pressão dos canais de televisão, que têm tendência de querer filmes muito explicativos, para dar ao público um acesso mais fácil à obra. É o que pensam. Mas acho que eles estão errados.