Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Ilustrada

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Crítica - Drama

Espetáculo oferece ao público experiência estética deslumbrante

'O Livro da Grande Desordem e da Infinita Coerência' justapõe com harmonia teatro, música e artes visuais

MARCIO AQUILES DE SÃO PAULO

Utilizando o conceito de arte total como procedimento, o espetáculo "O Livro da Grande Desordem e da Infinita Coerência" justapõe elementos visuais, sonoros e textuais com excelência rara.

A montagem dirigida e protagonizada por André Guerreiro Lopes proporciona uma experiência estética ímpar, ao retratar o universo do autor sueco August Strindberg (1849-1912) combinando com mesma potência todos os elementos cênicos disponíveis.

A paranoia de seu romance autobiográfico "Inferno" e o simbolismo de sua peça "O Sonho" são retratados por meio de uma atmosfera onírica, criada a partir de um cenário soturno e um sofisticado desenho de luz.

Existe apuro igual tanto pelos aspectos visuais macro --cenografia, iluminação, projeção de vídeo-- quanto pelos micro --a gestualidade milimétrica das mãos de Djin Sganzerla, a expressão enigmática de Eduardo Mossri.

Cada cena forma quadros estilizados independentes.

O figurino de Sonia Ushiyama é elegante e apropriado ao enredo, com casacos acinturados para os atores e vestuário longo para as atrizes. Junto com a maquiagem dark, o figurino compõe o ambiente expressionista da peça.

A trilha sonora é executada ao vivo por Gregory Slivar. À frente de uma parede de luz, que lhe dá um recorte de sombra silhuetado, toca piano, violino e flauta, além de coordenar sons pré-programados em computador.

A concepção de "paisagem sonora" prioriza também a musicalidade ruidosa de diversos objetos espalhados pelo palco.

André Guerreiro conduz com maestria a encenação.

Como ator, invoca as microcenas que vão formando a narrativa fragmentária, doando-se com paixão ao papel (estratégia muitas vezes arriscada no campo da atuação) sem erros. Em outros momentos ele desliza como um bailarino contemporâneo, abusando de movimentos descontínuos a abruptos.

PEÇA DENTRO DA PEÇA

Ao dirigir e atuar simultaneamente, potencializa as camadas de interpretação do espetáculo, já que até mesmo seu personagem ficcional dirige a peça dentro da peça.

A discussão matrimonial entre Djin e Mossri tem intensidade dramática perturbadora, assim como o debate entre professor e aluno.

Helena Ignez faz rápidas aparições com um livro nos braços. Com sua vocalização grave, transita pelo tablado recitando trechos esparsos, ampliando a estranheza que a obra de Strindberg sugere.

A arriscada sobreposição de tantos elementos poderia ruir o sistema cênico proposto, causando superabundância de significantes e significados, não fosse o andamento tranquilo entre as cenas.

Nunca há excessos. Se a ação é tomada por efeitos de luz mirabolantes, a penumbra volta na sequência. Quando o labirinto sonoro ameaça perturbar a compreensão, o ritmo lento ressurge. E a pantomima e o diálogo estão em harmonia. Obra de arte completa, sem ressalvas.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página