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Análise

Escritor defendeu capacidade de renovação do modernismo

BERMAN INSISTIU QUE MARX, AO ENTENDER O CAPITALISMO COMO UMA ERA INQUIETA, ESTEVE MAIS PRÓXIMO DE SEUS INIMIGOS LIBERAIS QUE DE SEUS PRECURSORES COMUNISTAS

IDELBER AVELAR ESPECIAL PARA A FOLHA

Há um vídeo de Marshall Berman (1940-2013) sobre o grafite e o rap em que ele se refere a um conto da nova-iorquina Grace Paley (1922-2007) que inclui a frase "os prédios queimavam de um lado da rua e a garotada tentava construir algo do outro lado". Vê-se aí um emblema do olhar de Berman ao seu grande tema, a modernidade. Por um lado, a ênfase na destruição e na ruína. Por outro, a crença na resistência e na renovação.

Fascinado por ruas, construções, barricadas e pela turbulência do espaço público, Berman sempre acreditou na capacidade do modernismo para a autocrítica e a renovação. Foi inimigo declarado dos pós-modernos, que já na época de "Tudo o que É Sólido se Desmancha no Ar" insistiam no esgotamento do impulso vanguardista.

De "Política da Autenticidade" (1970) a "Aventuras no Marxismo" (1999), passando por seu clássico "Tudo que É Sólido" (1982), Berman foi o teórico que conjugou marxismo e modernismo, vendo naquele uma grande manifestação deste.

Se György Lukács sistematizou o Marx hegeliano, dialético, e Louis Althusser inventou o Marx cientista, Berman alinhou Marx com Goethe e Baudelaire como visionários do modernismo.

Ao analisar Goethe, recuperou a segunda parte de "Fausto", muito menos estudada, para ver no personagem uma antecipação da face opressiva do urbanismo moderno, um precursor do arquiteto Le Corbusier e do construtor Robert Moses, responsável pelo privilégio às grandes estradas e aos viadutos na região de Nova York.

Berman insistiu que Marx, ao entender o capitalismo como uma era inquieta, aberta, sem limites, esteve mais próximo de seus inimigos liberais e conservadores que de seus precursores comunistas.

Visitando Brasília, provocou a ira dos nacionalistas ao descrevê-la como cidade antidemocrática, sem espaço público, só para depois reconhecer que talvez esse caráter impopular também fosse parte do espírito moderno.

É pena que Berman não tenha ido mais longe na investigação de um sentimento moderno que reconheceu ter sido pouco explorado em "Tudo que É Sólido": o medo da liberdade, o desejo de escapar dela a qualquer custo.

Sua parábola definitiva foi "O Grande Inquisidor", de Dostoiévski: "O homem prefere a paz e até a morte à liberdade de escolha no conhecimento do bem e do mal ["¦]. Estão convencidos de que são mais livres do que antes, mas nos trazem sua liberdade e humildemente colocam-na a nossos pés".

Na humildade com que ex-revolucionários frequentemente abdicaram da liberdade de escolha pela segurança de servir a um novo poder, na renúncia dos próprios marxistas às virtudes que observou em Marx, Berman bem poderia ter visto o embrião de uma crítica pertinente a seu inquebrantável otimismo.


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