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Crítica - MPB

'Cavalo' é marcado por melancolia e vazios

Disco solo de Rodrigo Amarante investiga identidades nacional e musical, com canção sobre exílio e estrangeirismos

LUIZ FERNANDO VIANNA ESPECIAL PARA A FOLHA

Depois das experiências no Little Joy e na Orquestra Imperial, Rodrigo Amarante chega sem pequenas ou grandes alegrias ao seu primeiro trabalho solo. É um disco de tristezas, distâncias e, como ele mesmo diz, vazios.

A faixa mais bela e que traduz melhor a ideia do CD é "Irene", em que ele faz o avesso do avesso da música homônima de Caetano Veloso.

A original era uma falsa canção alegre, marcando com a risada da irmã o embarque para o exílio forçado.

Em uma legítima torch song, Amarante apresenta uma Irene sem ironia, que também ri, mas é para explicitar àquele que canta a solidão do exílio voluntário (porém necessário, segundo o artista). "Milagre seria não ver/ No amor essa flor perene/ Que brota na lua negra/ Que seca mas nunca morre", diz uma das estrofes.

Há palavras que se repetem ao longo das 11 faixas.

Uma delas é "nome" (em português, inglês e francês), insistência reveladora da perda e da busca de identidade inerentes à vida em outro país. "Je suis l'étranger" é o primeiro verso de "Mon Nom", deixando claro, junto com o palíndromo do título, o deslocamento existencial causador e consequência do deslocamento físico.

Outras quatro canções são em inglês. Tanto ou mais do que influência da temporada que passou nos Estados Unidos, a opção reflete esse mergulho no estrangeirismo e no estranhamento.

Uma avaliação rigorosa poderia desmerecer parte dos versos, mas eles se integram bem à proposta e ao desalento que perpassa todo o CD --com relativa exceção para a única roqueira, "Hourglass", mas em que a melancolia também está presente.

Logo no segundo verso da primeira faixa, há um erro de português: "No espaço entre eu e você" (o certo é "entre mim e você").

Esse tipo de estranhamento não parece voluntário. Ainda assim, é uma bela bossa nova, com acentos orientais e mais ritmo do que harmonia, tratando de reflexos: ele vendo a si mesmo na imagem do outro. De novo, a identidade embaçada --a cultural, inclusive.

"Maná" mistura introdução com violão à moda do antigo Jorge Ben, ponto de macumba e sintetizador (a cargo do produtor Noah Georgeson). Outra vez, as identidades nacional e musical estão sendo investigadas.

Postas em sequência, "O Cometa" (feita para o poeta e escritor Ericson Pires, morto em 2012), "Cavalo" e "I'm Ready" têm suas belezas um pouco arrefecidas pelo entorpecimento que as melodias algo repetitivas provocam.

Mas a guitarra na música "O Cometa" é uma boa tradução instrumental da concisão sonora com que Rodrigo Amarante procurou tratar a temática do vazio.

O CD termina com a comovente "Tardei", que se assemelha ao fim de uma busca, à chegada em algum lugar. Curiosamente, Amarante, que, grosso modo, era visto como a face mais pop do Los Hermanos (em contraponto à MPB de Marcelo Camelo), surge solo e solitário mais parecido com o seu colega de banda, no despojamento musical e na melancolia como matéria-prima. Outro caminho que se fecha.


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