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Crítica - Romance

'De Gados e Homens' falha no engenho e também na arte

LUÍS AUGUSTO FISCHER ESPECIAL PARA A FOLHA

Qualquer objeto artístico depende de engenho e arte, no tempo de Camões ou no nosso. Num romance, engenho é a capacidade de fabular, de inventar mundos e o que neles há, enquanto arte é a capacidade de correto manejo técnico da linguagem específica do relato.

Nas duas dimensões o romance de Ana Paula Maia falha, e falha muito.

O romance pretende tratar da rotina de um abatedouro de bovinos que abastece uma fábrica de hambúrgueres.

No centro está um sujeito com o improvável nome de Edgar Wilson, encarregado de desferir o golpe que mata os animais. Com ele trabalham outros nomes estranhos, como Erasmo Wagner, Helmuth, Bronco Gil, Vladimir e Burunga.

Tudo no romance é esquemático. O matador é mau, mas mau de filme infantil. Chega a assassinar imotivadamente um companheiro de trabalho, jogando-o no fundo do rio. Motivo: o sujeito mata errado os bois, os faz sofrer. Simples assim.

PANFLETO

Desde os movimentos iniciais o leitor percebe que está diante de uma peça de ideologia, não de uma obra de arte.

Se as ações dos personagens não forem suficientes na tarefa pedagógica, o narrador mesmo se encarrega do serviço. Referindo-se a Edgar Wilson, diz: "Ele, que é a própria besta assassina". O que esperar de um romance assim?

Bem, ele poderia ao menos ser verossímil, já que sua pauta é o mais pedestre realismo. Mas não. Para citar um exemplo: pelas tantas, vai trabalhar com Edgar um novo matador, Santiago, que acaba de chegar da Finlândia, onde trabalhava como... abatedor de renas! Em momento que era para ser chave, ele se fantasia de rena, depois de ingerir cogumelos.

Nem falemos da chegada de vacas libanesas, em meio às quais há vacas israelenses (sic!). Nem da descrição do cenário, de uma inconsistência que dá pena, um prado a perder de vista numa região montanhosa, cheia de abismos, e ainda recortada de rios.

Nem do Bronco Gil, criado entre índios até os 12 anos, e por isso impiedoso, "imerso numa cultura pouco afeita ao carinho", que perdeu um dos testículos num ritual de iniciação à vida adulta. E o pior é que não dá para ler nem como paródia ou farsa.

A editora, se de fato acredita no livro, poderia ao menos ter feito uma revisão atenta, mas nem isso. O leitor sai da leitura com a nítida e certa sensação de ter gastado seu tempo à toa, lendo uma doutrinação anticarnívora mal concebida e pessimamente executada.


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