Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria
Dança refaz formas de dominação do corpo pela tortura
'Colônia Penal', de Sandro Borelli, será apresentada neste fim de semana em SP
A tortura é a gênese dos movimentos na coreografia "Colônia Penal", da Cia. Carne Agonizante. Dirigida pelo coreógrafo Sandro Borelli, a dança começou a ser criada a partir do livro homônimo de Franz Kafka (1883-1924).
Na trama kafkaniana, um observador de um país "evoluído" é enviado a uma nação "bárbara" para avaliar seus sistemas de tortura.
"Quando comecei a pensar por que estava fazendo esse trabalho, a relação com a história da ditadura no Brasil ficou evidente", diz Borelli.
Ele considera "Colônia Penal", dedicada às vítimas do regime militar, uma dança realista. "O que acontece no espetáculo é de conhecimento de todos. Ou deveria ser", afirma o coreógrafo.
Na coreografia, um bailarino tem seu corpo seguidamente subjugado por um personagem engravatado.
Ao fundo, enquanto esperam a sua vez, outros engravatados bebem vinho e destrincham um frango, ao lado do "observador estrangeiro", representado por um manequim. O grupo é "a alta patente do mal", diz Borelli.
O realismo é construído sem sangue ou gritos. Fica mais real quando é mais dança, nas cenas em que, sem tocar sua vítima, o algoz, como um titereiro, conduz com seus gestos os do torturado, consumando a dominação total de seu corpo.