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Análise

Madrinha do punk não se encaixa em estereótipos

ANDRÉ BARCINSKI ESPECIAL PARA A FOLHA

A palavra "punk" conjura imagens de jovens anarquistas de cabelos moicanos e bochechas furadas por alfinetes, cantando letras raivosas contra a rainha e o capitalismo. Mas Patti Smith, a "madrinha do punk", não se encaixa nesse estereótipo.

Quando lançou seu primeiro LP, "Horses", em 1975, Patti já tinha quase 29 anos e era uma veterana da cena de poesia alternativa nova-iorquina. Tinha feito teatro de vanguarda com Sam Shepard, era amiga de poetas beats como Allen Ginsberg e de fotógrafos cultuados como Robert Mapplethorpe.

Havia morado em Paris, escrito textos sobre música para as revistas "Creem" e "Rolling Stone" e, por pouco, não ganhara o emprego de vocalista do grupo de rock pesado Blue Oyster Cult. Patti Smith já tinha uma vida e tanto.

"Horses" foi um choque. Um disco que celebrava o passado do rock ao mesmo tempo em que lhe sugeria caminhos mais maduros e ambiciosos. O LP abre com "Gloria", regravação de um sucesso do grupo irlandês Them, lançado originalmente em 1964.

Na versão de Patti, a faixa ganhou um verso famoso e polêmico: "Jesus morreu pelos pecados de alguém, mas não pelos meus". Era uma provocação dela, que crescera em uma família ultrarreligiosa ""a mãe era Testemunha de Jeová"", mas renegara a Igreja e a religião organizada.

"Horses" trazia homenagens a alguns dos ídolos de Smith ""Jim Morrison, Rimbaud, Charlie Parker, Jimi Hendrix"" e letras misteriosas e fascinantes.

Definitivamente, não era um moleque cantando "no future" ou falando da delícia de cheirar cola. E o disco começou a ser ouvido em quartos escuros de adolescentes sensíveis.

Na Inglaterra, Morrissey e Ian McCulloch ouviram. Nos Estados Unidos, Michael Stipe ficou obcecado. Anos depois, surgiriam The Smiths, Echo and the Bunnymen e R.E.M., bandas que entenderam, via Patti Smith, que o punk podia ser muito mais que barulho e niilismo.

Não que houvesse nada errado com barulho e niilismo. Patti Smith sempre gostou dos dois. Mas ela percebeu que havia uma linha direta entre Baudelaire, Rimbaud e os moleques sujos que infestavam o Lower East Side de Nova York no início dos anos 1970. Eram todos flores do mal, a legião do underground de veludo liderada por Lou Reed, John Cale e outras criaturas sombrias.

E ela ajudou a fazer essas pontes: guitarras com poesia, Hendrix com os beats, Ramones com William Burroughs. Era tudo parte de um todo. Só faltava alguém para abrir os olhos do pessoal.


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