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Crítica / Drama

Longa mais do que agrada o espectador, permanece com ele

RICARDO CALIL CRÍTICO DA FOLHA

"Era Uma Vez Eu, Verônica" começa com uma cena de sexo grupal na praia. Para a protagonista (Hermila Guedes), é uma cerimônia de despedida: da juventude, de seu descompromisso e exuberância.

Para o filme, também: depois dessa cena, o diretor Marcelo Gomes ("Cinema, Aspirinas e Urubus") passará a recusar, de maneira quase sistemática, qualquer ideia de cinema como espetáculo, como um catálogo de eventos extraordinários.

De mãos dadas, Verônica, personagem e filme, irão iniciar daí em diante sua jornada rumo à ambiguidade, à indefinição, ao transitório -a essa massa disforme tradicionalmente renegada pelo cinema brasileiro.

Verônica acabou de se formar em Medicina e logo começou uma residência em psiquiatria em um hospital público do Recife.

Tem 24 anos, um pai amoroso (W.J. Solha), um pretendente dedicado (João Miguel), casa própria e situação financeira confortável.

Não há motivos aparentes para insatisfações materiais ou afetivas. Mas, ainda assim, Verônica não se satisfaz -a não ser, fugazmente, no sexo. Ela não se sente segura para abraçar a carreira nem para assumir o namoro.

Gomes oferece a sua protagonista a possibilidade de uma vida existencial, não determinada pelas condições externas. Além disso, não se interessa em diagnosticar sua personagem (como esta é obrigada a fazer com seus pacientes), não tenta padronizar seu coração.

O diretor "simplesmente" cola sua câmera a Verônica e tenta captá-la com a intimidade e a naturalidade de um diário.

É claro que essa operação só daria resultado se uma grande atriz estivesse do outro lado. E Hermila Guedes ("O Céu de Suely") responde à altura, vasculhando nuances para os silêncios, revelando significados para sua personagem quando esta não os encontra.

Para a Verônica de Marcelo Gomes, não há vida dupla, como para a Verónique de Krzysztof Kieslowski (1941-1996). E, se a vida é uma só, só lhe resta viver.

Ao final das duas horas de projeção, ficará claro, para quem quer ver, que a jornada de Verônica não tem nada de ordinária. E que o filme de Gomes consegue, à sua maneira, um feito espetacular: mais do que agradar o espectador, permanecer com ele.


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