Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Ilustrissima

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Arquivo Aberto

MEMÓRIAS QUE VIRAM HISTÓRIAS

Um talento de arrepiar

São Paulo, 1969

LUIZ CARLOS MIELE

Em novembro de 1969, eu voltei a São Paulo para a apresentação do espetáculo "Elis com Miele & Bôscoli", no teatro Maria Della Costa. Tínhamos terminado a temporada carioca de quatro meses e iriamos iniciar o mesmo período na capital paulistana.

Levamos a sério o ditado "antes só que mal acompanhado". Estavam conosco Roberto Menescal na guitarra e direção musical, Wilson das Neves (hoje uma estrela do samba) na bateria, Zé Roberto Bertrami no teclado, Jurandir no baixo e Hermes na percussão.

Elis ensinou a todos nós que palco "a gente só divide com quem gosta muito". Eu realmente a adorava. E ela sempre me honrou com a maior amizade e consideração.

Tanto que, nas páginas do programa do show, o texto dela sobre mim assim dizia: "Miele, força de leão, coração de beija-flor. Dorme entre oito pastores alemães. Acorda de smoking. Janelas abertas. Corpo fechado. O Luiz artista, bom de bola, de papo, de copo. De copas, o rei de copas. O barba. O Barrabás. O mielofone. Mais motivos pro Miele estar no show? Eu adoro o Miele".

Bem, a história de dormir entre os oito pastores alemães é mais ou menos verdade. E ela também inventou outra história saborosa, que contou no palco. Disse que certa noite pediu que eu não bebesse nada depois do show de sexta-feira, pois teríamos duas sessões no sábado.

Fui então pra casa obediente, sem beber. Mas chegando lá, os cachorros não me deixaram entrar. Como era uma das raras vezes em que me viam sóbrio, não me reconheceram.

Nosso show era bem descontraído, permitia esse tipo de brincadeira. E Elis se divertia muito, dançava, sapateava (um pouquinho, de mentira, como eu), imitava o Carlitos, vestida e maquiada como ele.

Depois, ia tirando a maquiagem e o bigodinho, o chapéu-coco, e cantava "Minha", do Francis Hime e do Ruy Guerra. Era de arrepiar.

A grande maioria da crítica elogiou nosso show. Nós tínhamos a segunda maior bilheteria de teatro em São Paulo.

Ficamos quatro meses em cartaz. A produção ficou a cargo do Zé Nogueira --grande especialista em uísque, peladas de futebol e Adoniran Barbosa. Acho até que foi por conta dessa amizade que a Elis gravou "Tiro ao Álvaro" depois.

Elis era superprofissional. Todos tinham que chegar cedo ao teatro. Durante nossas apresentações, mesmo quando não estava em cena, nunca me afastava no palco. Ficava na coxia, ouvindo Elis e sua musicalidade extraordinária.

De tantos artistas que Ronaldo Bôscoli e eu produzimos (nossa dupla realizou 86 shows), Elis foi a única cujo talento sempre me surpreendeu.

Também tive o prazer de ser o diretor de seus especiais na TV Globo, mas, infelizmente, quando ela rompeu com o Bôscoli, era natural que eu também me afastasse de seu convívio pessoal.

Não foi mais possível estar no palco ao seu lado, ou na produção de seus espetáculos, e assim passei para a plateia de seus maravilhosos shows.

Mas, repito, não sou fã, sou devoto de Elis Regina. E, agora, estou perto dela novamente, como um dos personagem do espetáculo em sua homenagem, "Elis, a Musical", em cartaz no Rio.

Elis foi a estrela maior que eu conheci, ao lado de quem fui tão feliz no teatro Maria Della Costa.

Ave Elis.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página