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Crítica - Sistema financeiro
Para evitar crises, livro pede mudanças no crédito dos EUA
Obra explica problemas nos empréstimos do país, mas tem visão restrita
Está no endividamento imobiliário a principal explicação para a crise desencadeada em 2008. Para escapar de novas hecatombes, é preciso fazer mudanças no sistema de crédito, com os bancos facilitando o crescimento econômico.
Hoje, "o sistema financeiro trabalha, de fato, contra nós, não para nós", defendem os economistas Atif Mian, professor de economia e políticas públicas da Universidade Princeton, e Amir Sufi, professor de finanças da Universidade de Chicago.
Em torno dessas ideias eles escreveram o livro "House of Debt - How They (and You) Caused the Great Recession, and How We Can Prevent it from Happening Again" [casa da dívida, como eles (e você) causaram a grande recessão e como podemos prevenir que ela aconteça novamente, em inglês].
Os autores expõem estatísticas sobre o endividamento norte-americano no setor imobiliário. Avaliam o drama das hipotecas e constatam que os devedores mais pobres sofreram mais perdas do que os mais ricos. A crise resultou em mais desigualdade.
Entre os donos de imóveis, os 20% mais ricos tinham uma alavancagem média de 7%. Já essa percentagem era de 80% para os mais pobres. A casa era praticamente seu único ativo --os investimentos financeiros só eram opção para os mais ricos.
Nesse quadro, o livro comprova que, na crise, "os ricos permaneceram ricos, enquanto os pobres ficaram mais pobres".
Os autores argumentam que a questão dos cortes nos gastos familiares, decorrente do endividamento, é chave para explicar a recessão.
"A queda nos empregos aconteceu porque as famílias pararam de comprar, não porque houve parada nos investimentos dos negócios", afirmam os economistas.
Na avaliação de Mian e Sufi, na origem da crise está um avanço agressivo por empréstimos por parte dos donos de imóveis --um comportamento que classificam de irracional. Assim, para eles, parte da culpa é do consumismo desmedido dos americanos.
Limitado à questão do crédito, o livro não explora os motivos para o aumento do endividamento. Escapa aos autores o movimento consistente de queda nos salários reais nas últimas décadas e o achatamento do poder aquisitivo da classe média --em oposição ao incremento dos ganhos dos mais ricos.
Como já notaram vários economistas, é a redução nos ganhos dos assalariados (com o desmantelamento do movimento sindical) que explica o aumento do endividamento dos americanos.
Sem abordar a crise de uma forma mais ampla, Mian e Sufi também fazem uma avaliação simplista do desemprego.
Eles ignoram a transferência de indústrias norte-americanas para a China e outros países, uma desindustrialização que devora bons postos de trabalho.
Da mesma forma, quando observam a distribuição geográfica da crise das hipotecas (mais aguda os Estados da Flórida e da Califórnia), omitem que foram migrantes, pobres e negros os mais afetados pelas tramoias arquitetadas pelos bancos.
Os autores tratam das fraudes nas hipotecas, mas de forma superficial, sem citar as grandes instituições envolvidas ou a desregulamentação desenfreada. Avaliam, no entanto, que a ajuda aos financistas nos Estados Unidos foi muito além da proteção do sistema de pagamento. "Salvar os bancos não vai salvar a economia", afirmam.
Advogam um programa de reestruturação no crédito, fixando contratos que compartilhem mais os riscos. Parece pouco para o tamanho da encrenca. Embora recheado de dados, o livro padece de uma visão mais abrangente. Tem um foco incapaz de explicar a crise por inteiro.