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Um filho de Francisco

O padre argentino José María di Paola começou a atuar em favelas de Buenos Aires por incentivo do atual papa; para ele, o amigo irá lutar por uma igreja mais inclusiva

LÍGIA MESQUITA DE BUENOS AIRES

"Te espero no dia 24 de agosto para tomarmos um mate." Foi com essas palavras que o papa Francisco respondeu à carta do argentino José María di Paola, que lhe informava que estaria na Itália na semana de 20 de agosto e gostaria de se encontrar com o sumo pontífice.

Na manhã da data marcada, Di Paola, mais conhecido como Pepe, compartilhava uma cuia de mate e comia biscoitinhos com o líder da Igreja Católica na Casa Santa Marta, no Vaticano.

O visitante entregou presentes enviados por fiéis argentinos e, de brincadeira, também lhe deu a camisa de seu time, o Huracán, rival do San Lorenzo do papa.

Brincadeiras à parte, falaram sobre o que levou o caminho dos dois a se cruzar 15 anos atrás, quando Francisco ainda era Jorge Mario Bergoglio: o trabalho nas "villas" (favelas) de Buenos Aires.

Pepe, 51, é um dos mais famosos "curas villeros" (padres que atuam em favelas) de Buenos Aires. Durante quase 14 anos, viveu e trabalhou na Villa 21-24 de Barracas, uma favela com subdivisões no centro da capital, onde vivem 73 mil pessoas no total.

INCENTIVO

Quando Bergoglio foi nomeado arcebispo de Buenos Aires, em 1997, incentivou o trabalho da pastoral "villera" que existe na cidade há 40 anos. E foi assim que Di Paola chegou à Villa 21-24.

"Ele é uma referência permanente para mim. Isso explica um pouco quais são suas preocupações enquanto líder da igreja. Não é à toa que disse querer uma igreja pobre para os pobres, inclusiva", diz o sacerdote à Folha enquanto dirige um antigo Fiat Prêmio branco, com adesivo da Virgem Maria na porta e ventilador no painel, rumo a um hospital para fazer algumas visitas.

Também foi Bergoglio quem rezou a missa de despedida de Pepe da comunidade, no dia 8 de dezembro de 2010.

Um ano antes, junto com outros "curas villeros", o padre escrevera um manifesto dizendo que as drogas estavam descriminalizadas dentro das favelas e que o "paco", pasta base da cocaína, era oferecido facilmente aos garotos.

Ele virou alvo de ameaças de morte. Quando a intimidação atingiu também pessoas próximas, decidiu que era hora de partir e se mudou para uma paróquia na zona rural de Santiago del Estero, a 1.000 km de Buenos Aires.

Há seis meses, Pepe retornou à capital. Seu endereço ainda é o de uma "villa", agora a La Cárcova, na conurbação bonaerense. Lá, continua seu trabalho de prevenção às drogas e ajuda no tratamento de dependentes.

"O trabalho nas villas' é minha vocação. Qualquer coisa que eu proponha fazer lá é mais fácil. Se tenho que montar um grupo de apoio escolar, não temos que fazer reuniões e ver a agenda de cada um, essas coisas próprias da vida de classe média."

DESAFIOS

Mas a tarefa em uma comunidade com tanta pobreza tem muitos desafios. Um deles, segundo o padre, é aceitar que não é possível ajudar a todos.

"O importante é não entrar em desespero. Tem que ir naquele que você pode ajudar", diz ele, que teve sua trajetória contada no livro "Pepe "" El Cura de La Villa", de Silvina Premat, lançado neste ano.

Para Pepe, o papa Francisco vai buscar que as pessoas se sintam incluídas, e não "rechaçadas dogmaticamente".

A principal mudança na igreja, em sua visão, não está em acabar com o celibato, mas sim transformá-la em uma estrutura não verticalizada.

"Se amanhã disserem que agora todos os padres podem se casar, isso mudar a igreja? Não. Eu até acho que se um padre já não trabalhava tanto, casado vai trabalhar menos (risos)", afirma.

"Não foi à toa que Francisco disse na Jornada Mundial da Juventude para os jovens fazerem barulho. Ele pode mudar um cardeal, um arcebispo, mas sabe que as mudanças na igreja vêm de baixo."


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