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Pelo cano

Em Hableh, na Cisjordânia, palestinos usam tubo de esgoto para ir a Israel, mesmo sem permissão

DIOGO BERCITO ENVIADO ESPECIAL A HABLEH

A fronteira entre Israel e os territórios palestinos da Cisjordânia, guardada com segurança como uma divisa dura e impenetrável, respira no vilarejo de Hableh por meio dos canos de esgoto.

Atravessam por ali trabalhadores palestinos que, apesar de não terem a documentação necessária, desafiam a lei e o controle israelenses para procurar emprego do outro lado da cerca.

A situação lembra a dos túneis de Gaza, usados para contrabandear produtos vindos do Egito para o território.

A Folha visitou Hableh e, após a orientação de moradores desconfiados, encontrou um dos túneis de infiltração, escondido nos fundos de uma estufa, só acessível por um caminho de terra.

O cano, pelo qual é possível caminhar de pé, é coberto por uma resistente grade metálica. Parte das hastes foi porém serrada, deixando aberto um estreito espaço para a passagem. Após cerca de 30 metros o duto chega à cidade israelense de Matan.

Há cerca de dois meses o construtor Ribhe Jida, 56, passou por ali em busca de trabalho em Israel. Pego pelo Exército, diz ter assinado um termo comprometendo-se a não repetir essa tentativa, sob a pena de ser detido.

O buraco visto pela reportagem foi aberto recentemente, ele afirma. "Cortamos o ferro, mas as pontas ficam afiadas. A gente se corta, quando passa. Alguns ficam com cicatrizes na barriga."

Durante a entrevista, um veículo do Exército estaciona do outro lado da cerca e pede que o repórter se aproxime. Os palestinos se escondem, receosos de serem punidos. Todos são instruídos para que se afastem do local.

Procuradas, as Forças de Defesa de Israel não comentaram o caso. A Administração Civil também não se manifestou a respeito dos túneis.

Segundo a Autoridade Palestina, há 103 mil palestinos da Cisjordânia trabalhando hoje em Israel ou nos assentamentos israelenses. Desses, 34 mil não detêm a permissão necessária.

A operação em torno da passagem, em Hableh, é complexa. Envolve não apenas os trabalhadores, mas batedores de binóculo para determinar o momento mais seguro para cruzar.

Também é preciso convencer os proprietários dos terrenos em que é feita a passagem, assim como ter contatos no outro ponto.

Trabalhadores afirmam pagar o equivalente a R$ 150 para cruzar e serem levados a cidades israelenses dentro de um carro compartilhado.

Entre eles está um dos filhos de Jida, não identificado a pedido dele. O rapaz encontrou-se com a Folha na cidade israelense de Ramat Gan, na construção que ajuda a erguer, sem permissão para trabalhar ou cruzar a cerca.

"Enquanto eu passo pelo túnel, não sei se vou chegar com segurança. Há histórias de colegas presos, feridos pelo Exército, à espreita."

Ele diz permanecer em Israel por um mês, antes de voltar à Cisjordânia. "Durmo com medo, trabalho com medo", afirma. Mas a remuneração lhe convence a correr o risco, já que recebe R$ 150 por dia ali, enquanto o mesmo trabalho renderia R$ 50 diários em seu vilarejo.

Durante o tempo em que fica no território israelense, ele conta que dorme na construção. "Não tomo banho o mês inteiro e, como não há geladeira, preciso comprar comida todo dia."


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