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Militar alemão virou mito depois de morrer em combate durante o dia D

Erro tático de Wittmann, garoto-propaganda do nazismo, foi esclarecido anos depois

RICARDO BONALUME NETO DE SÃO PAULO

Michael Wittmann morreu aos 30 anos em 1944, mas antes disso já era um ícone da propaganda nazista. E continua sendo, apesar de a Alemanha de Adolf Hitler ser hoje apenas a mais triste memória do século passado.

O jovem oficial e comandante de tanques terminou seus dias lutando contra as forças aliadas que tinham desembarcado no Dia D na Normandia, 70 anos atrás. Sua trajetória de vida e morte é um perfeito exemplo de como a história pode ser manipulada, falsificada e transformada em mitologia.

Wittmann era um perfeito produto da ideologia nazista. Nascido na Bavária --o conservador sul da Alemanha, onde Hitler começou sua carreira política--, ele logo se alistou em organizações nazistas e também no Exército.

Mas suas fortes convicções nazistas o fizeram se mudar para a Waffen-SS, o braço militar da infame organização responsável pela "pureza" ideológica e racial do Estado, e que executou crimes hediondos como o genocídio de judeus e eslavos.

Ele era um bom comandante de blindados e tirou a sorte grande quando foi designado em 1943 para comandar um tanque Tigre, o mais poderoso então em todo o planeta.

Duas coisas faziam o Tigre (armado com um canhão de calibre 88 mm) ser superior aos tanques aliados da época, como o soviético T-34 (canhão de 76 mm), o americano M-4 Sherman canhão de 75 mm) ou o britânico Cromwell (canhão de 75 mm).

O calibre dos canhões era um dos pontos. O 88 mm do Tigre tinha muito maior poder de penetração de blindagem.

Mas o Tigre também era bem melhor blindado que seus rivais aliados.

Foi por isso que Wittmann pôde criar um currículo invejável. A propaganda nazista afirma que ele destruiu 138 tanques inimigos e 132 canhões antitanque.

Como lembra o historiador americano Steven Zaloga, o principal pesquisador atual da guerra blindada, até o Dia D, Wittmann nunca tinha encontrado um tanque aliado com desempenho capaz de destruir um Tigre, a não ser na arriscada chance de conseguir atirar contra a sua traseira --algo que um bom comandante não deixaria acontecer.

Isso mudaria graças a uma "gambiarra" produzida pelos britânicos. Sabendo bem que o canhão de 75 mm do Sherman era incapaz de penetrar a blindagem frontal dos principais tanques alemães, eles trocaram o canhão original pelo mais poderoso 17 libras. Para designar o calibre de canhões, usavam o peso da granada --17 libras (isto é, 7,7 kg).

Em 8 de agosto de 1944, Wittmann teve o azar de liderar um pequeno grupo de tanques Tigre contra um avanço britânico ao longo da estrada entre Caen e Falaise. Eram, segundo os melhores relatos, meros sete tanques.

Cinco foram destruídos em poucos minutos por Shermans armados com o 17 libras. Um deles era o de Wittmann.

O mito nasceu então. A propaganda nazista falou da morte heroica do oficial da SS. Os britânicos nem perceberam o que tinha acontecido. Os restos mortais da tripulação do Tigre foram enterrados ali perto, e só seriam descobertos em 1983.

Um autor alemão de livros populares de história militar, Paul Carell, impulsionou o mito: Wittmann teria morrido como um super-herói, avançando com seus sete tanques contra mais de 600 tanques britânicos...

Essa visão de um cavaleiro heroico atacando uma grande horda, uma massa anônima inimiga, fez sucesso. Até historiadores acadêmicos compraram a tese.

Mas, com a descoberta dos restos mortais da tripulação do Tigre e com pesquisas de vários entusiastas, uma nova visão surgiu.

O autor francês Nicolas Aubin publicou um excelente artigo recente na revista especializada "Batailles & Blindés" descrevendo a morte do SS-Hauptsturmführer Wittmann (posto equivalente a capitão).

Para Aubin, o último combate do garoto-propaganda nazista foi antes de tudo incompetente. Foi um "fiasco". Ele atacou sem preparação, sem reconhecimento, sem apoio de fogo; subestimou o inimigo; reagiu de modo "estereotipado".

Ele de fato era um mito. Bastou fazer besteira, e topar com um Sherman melhor armado e com um inimigo mais capaz taticamente, que o mito virou pó.


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