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New York Times

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Inteligência - Charles Fishman

Problemas hídricos ganham urgência

Quando março começou, a Califórnia inteira estava molhada: chuvas torrenciais, nevascas, deslizamentos de lama. Mas a seca mal tomou nota.

A crise de água nesse Estado já chega ao terceiro ano. Alguns cientistas acham que 2013 foi o ano mais seco na Califórnia desde 1580. O Estado que tem a maior população entre os Estados americanos recebe 75% de sua água da neve, e 70% do volume usual de neve está faltando neste ano.

O problema no Reino Unido é o oposto: inundações de proporções bíblicas. O Tâmisa está fluindo há mais tempo no nível mais alto desde 1883. As tempestades que fustigaram o sudoeste da Inglaterra obrigaram os britânicos a usar caiaques para se movimentar nas cidades. De acordo com o serviço meteorológico britânico, as chuvas na Inglaterra e no País de Gales vêm sendo as mais pesadas em 240 anos.

Sempre houve enchentes e secas. Mas os problemas hídricos de todos os tipos parecem estar mais comuns e mais urgentes que no passado. E estão.

Em 2013 o mundo sofreu um número recorde de desastres climáticos com custos de US$ 1 bilhão: 41, superando o recorde anterior, de apenas três anos antes. Quase todos os 41 desastres envolveram água: inundações, secas ou danos provocados por ciclones.

Há três razões pelas quais andamos tendo mais problemas ligados à água.

A primeira delas é o crescimento populacional. A seca na Califórnia foi agravada pelo fato de a população desse Estado hoje ser um terço maior do que era em 1990. O consumo adicional de água gerado por essas pessoas equivale a um lago de 40 hectares e 15 metros de profundidade -por dia. O desafio de fornecer água a populações crescentes é exacerbado em megacidades como Pequim, Déli e Los Angeles.

Os padrões de vida vêm subindo em países em desenvolvimento. Quanto mais as pessoas ascendem para a classe média, mais água consomem: em vasos sanitários, para lavar roupas, em seus banhos diários.

Em terceiro lugar, é provável que as mudanças climáticas tornem os ciclos climáticos habituais mais graves e possivelmente mais frequentes. A barreira do Tâmisa, uma barragem mecânica que protege Londres contra enchentes, foi usada 35 vezes na década de 1990. Apenas em janeiro deste ano, foi acionada 17 vezes. As inundações deste ano ocorrem apenas dois anos após outro desastre natural na mesma região da Inglaterra: a pior estiagem em cem anos.

As consequências têm amplo alcance. A seca americana paralisou os agricultores californianos, que cultivam 60% dos hortifrútis consumidos no país, e deixou os EUA com o menor rebanho de gado em 60 anos, provocando uma alta recorde no preço da carne bovina. Economistas estimam que as inundações no Reino Unido podem subtrair um ponto percentual do PIB britânico.

Nossa reação às condições do tempo muitas vezes é suportá-las e torcer para que as coisas voltem ao "normal". Mas o que temos visto com a água nos últimos dez anos talvez seja um aviso. A turbulência talvez tenha se tornado a nova normalidade.

Há dois segredos para entender e lidar com problemas hídricos. O primeiro é que todos os problemas hídricos são locais. Sejam quais forem as ligações com os padrões climáticos no Pacífico, as enchentes na Inglaterra precisam ser resolvidas na Inglaterra. A seca é problema da Califórnia -investir em conservação no Kansas não vai ajudar. Mas isso é boa notícia, na realidade. As comunidades -cidades, Estados ou bacias hidrográficas compartilhadas por mais de um Estado- possuem a capacidade de resolver problemas in loco.

A segunda coisa a lembrar é que a água não reage aos nossos desejos. Ela reage a modificações cuidadosas e permanentes em nossos modos de vida, nossas práticas agrícolas, nossas práticas de construção e ao que cobramos pela própria água.

A maioria das grandes comunidades na Califórnia ainda não impôs medidas de redução do consumo de água, em parte porque o consumo de água já vem mudando no Estado, lentamente, mas de modo dramático. Em 1972 o residente médio de Los Angeles consumia 715 litros de água por dia. Hoje a média é 465 litros.

A mudança significa o seguinte: a área metropolitana de Los Angeles hoje tem 50% mais habitantes do que tinha 20 anos atrás, mas consome o mesmo volume de água. A seca teria sido muito pior se as pessoas ainda consumissem tanta água quanto antes.

A quantidade de água existente na Terra não muda. A água simplesmente é usada, evapora e é usada outra vez. Mas estamos sendo obrigados a ver que a água não vai parar onde queremos, quando a queremos.

Em um mundo repleto de grandes problemas, os problemas hídricos estão entre os maiores. Mas, diferentemente de muitos outros problemas graves -mudanças climáticas, desigualdade econômica-, a maioria dos problemas hídricos pode ser resolvida. Geralmente há água suficiente e até dinheiro suficiente. O que precisamos é de tempo e realismo para fazer frente aos problemas.


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