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Marianne Pinotti

TENDÊNCIAS/DEBATES

Adoção e deficiência

Lei que prioriza processos de adoção de crianças com deficiência não mudará a preferência dos pais, mas ao menos amenizará danos

Um importante passo em relação à adoção no Brasil foi dado em fevereiro último, com a sanção pela presidenta Dilma Rousseff de uma lei que dá prioridade de tramitação a processos que envolvam crianças e adolescentes com deficiência ou doença crônica.

Embora a medida vise acelerar os trâmites burocráticos para adoção, uma situação que nos inquieta é como fazer com que essas crianças e adolescentes sejam escolhidos por futuros pais. Estamos falando de um grupo considerado como excluído entre os excluídos.

Se a situação pudesse ser apresentada por uma figura geométrica, o triângulo serviria como representação fiel da atualidade no Brasil. A base seria composta pelos casais interessados e o topo pelas crianças e adolescentes aptos à adoção.

Em números, são quase seis casais para cada um adotável. Segundo dados do CNA (Cadastro Nacional de Adoção), existem 5.406 crianças aptas à adoção e 30,1 mil pretendentes a pais em todo o Brasil.

No entanto, a realidade não esbarra apenas na burocracia judicial; ela transcende para questões individuais de preferência. De acordo com o CNA, os futuros pais têm preferência por meninas brancas, com idade inferior a três anos e que não incluam irmãos na adoção.

O fato é comprovado por dados do Conselho Nacional de Justiça. Apenas 8% das adoções no Brasil são de crianças com deficiência. Quase 90% dos pretendentes a pais dizem não quando perguntados se querem ter filhos com alguma necessidade especial.

A situação fica alarmante quando se percebe que, no Estado de São Paulo, do universo da classe adotável de 1.339 crianças e adolescentes, a maioria tem idade avançada, 44,4% são pardos, quase 82% têm irmãos e mais de 11% têm algum tipo de deficiência, não figurando, assim, entre as preferências dos pais cadastrados no programa. A verdadeira contramão de um final feliz.

Ainda bem que não faltam situações de famílias que souberam lidar com a questão da deficiência como condição humana de seus filhos.

Um exemplo que tive a oportunidade de acompanhar de perto foi o de Silvia, de 51 anos, que tem uma filha biológica de 26 anos e há seis optou por adotar uma criança.

Ela fez seu cadastro para adoção sem impor qualquer tipo de restrição de cor, idade ou sexo. Depois de sete meses de trâmite legal, foi contatada para uma conversa com um médico da vara da infância que a informou tratar-se de um menino de quatro meses que apresentava deficiência visual total.

A futura mãe não teve dúvida, aceitou de pronto, já que outros 13 candidatos anteriores haviam recusado a criança. Perguntei o motivo de ter aceitado uma criança com deficiência e ela foi categórica ao responder: "Adotar não é fazer caridade. É um ato de amor e, acima de tudo, de instinto materno".

A nova lei provavelmente não mudará a preferência dos pais por adotar filhos sem deficiência, mas configura um relevante avanço ao amenizar os danos a crianças que, por si sós, são preteridas desse processo extremamente moroso.


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