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Leão Serva

TENDÊNCIAS/DEBATES

Cidade Limpa: de fios, minhocões e Maluf

Só um prefeito biônico poderia submeter os cidadãos a tanto barulho e poluição, gerados por uma via monstruosa colada em suas janelas

É incrível como a carnavalização faz pobres se vestirem de reis, ricos se andrajarem, homens livres se fantasiarem de presidiários e Paulo Maluf ressurgir na cena pública, no único país do mundo onde pode aparecer sem ser preso pela Interpol, para argumentar contra os fatos.

Em artigo na Folha ("Vamos salvar o elevado", em 8/2), o ex-prefeito defendeu o Minhocão, paradigma de suas obras faraônicas, assim como a avenida Roberto Marinho, esta que alimentou saldos bancários no exterior, agora prestes a serem repatriados por decisão da Justiça (estrangeira).

Não é o trânsito, estúpido! A verdade histórica comprova que, com Maluf, fazer a obra era o meio, enquanto as contas no exterior eram o fim. O Minhocão (anos 70) já congestionava dois anos após a inauguração; a Nova Faria Lima (anos 90), menos de dois meses depois. A Roberto Marinho idem. Se era para resolver o trânsito dos carros particulares, as obras de Maluf fracassaram. Se era para movimentar contas em Jersey, pelo menos uma delas foi bem-sucedida.

O Minhocão recebeu o nome oficial de elevado Costa e Silva, dado para bajular um ditador militar. O povo logo constatou a futilidade da obra, ressaltando que a via ligava a praça Roosevelt, no centro, ao escritório da Eucatex, da família Maluf, na avenida Francisco Matarazzo.

O monstrengo viário que o ex-prefeito defendeu na Folha, na véspera do Carnaval, foi a maior tragédia urbanística da cidade em muitas décadas. A começar pelo nome oficial, passando pela poluição (visual, auditiva e do ar), tudo enfiado pela goela dos moradores de uma área que era uma perfeita miniatura da pluralidade e da democracia social paulistana.

Só uma ditadura podia impor um prefeito biônico a uma capital brava como São Paulo. Só um prefeito biônico poderia submeter dezenas de milhares de cidadãos a tanto barulho e a tanta poluição, gerados por uma via monstruosa a poucos metros de suas janelas.

Embora a indignação popular tenha sido imediata, só em 1975, no início da "abertura lenta, segura e gradual", a TV Globo pôde veicular a novela "O Grito", de Jorge Andrade. Todo o país viu, então, as agruras dos moradores de um prédio submetido à construção do malfadado Minhocão à sua frente.

Quando o prefeito Kassab criou o projeto Cidade Limpa, em 2006, dizia que a obra só estaria completa quando fossem enterrados os fios elétricos que poluem nosso visual. Depois, lançou um projeto, em tramitação no Legislativo, para criar uma avenida paralela ao Minhocão, sobre os trilhos da antiga Fepasa, que faça uma ligação mais longa e larga entre as zonas leste e oeste, permitindo a derrubada da herança malufiana. Assim o combate à poluição visual estaria completo.

Deve ser porque não pode por os óculos fora do Brasil, para não ser preso, que Maluf ficou tão desatualizado. Ele diz que "há elevados em todas as grandes cidades do mundo e ninguém pensa em derrubá-los". Em verdade, estão caindo.

Neste mesmo 2013, milhares de paulistanos podem visitar o Highline, de Nova York, via elevada transformada em jardim; ou conhecer o "Big Dig" de Boston, onde o minhocão foi "enterrado"; ou irão a Seul, que eliminou de uma só vez duas obras ao estilo malufista: derrubou um minhocão e descanalizou um rio urbano ao lado.

Lendo a história recente da cidade e do noticiário político-policial, vê-se que São Paulo só será realmente uma cidade limpa quando se livrar dos fios e do Minhocão, mas também -por que não dizer?- de Paulo Maluf.


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