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Para ministros do STF, Câmara ignorou a lei
Integrantes do Supremo veem 'corporativismo' na absolvição de Donadon; precedente foi aberto em decisão da corte
Entendimento sobre perda de mandato de condenados foi alterado após mudança na composição do tribunal
Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) criticaram ontem a decisão da Câmara dos Deputados que manteve o mandato do deputado Natan Donadon (ex-PMDB-RO) apesar de ele estar preso desde o final de junho.
"Agora temos essa situação de alguém com direitos políticos suspensos, mas deputado com mandato. A Papuda que está homenageada. Vai causar inveja muito grande aos demais reeducandos", afirmou o ministro Marco Aurélio Mello, referindo-se ao presídio de Brasília em que o parlamentar está detido.
Colega de Marco Aurélio no STF, o ministro Gilmar Mendes também criticou a decisão da Câmara. Para ele, a manutenção do mandato está em desacordo com a Constituição, uma vez que presos têm seus direitos políticos suspensos.
"Parece tão evidente porque o texto constitucional diz claramente que cessam os direitos políticos", disse.
Ele ainda classificou a ação como "corporativista" e disse que ela representa a "crônica de uma morte anunciada". Isso porque, durante o julgamento do mensalão, tanto Mendes quanto Mello estiveram junto ao grupo vencedor que decidiu pela perda do mandato de políticos condenados.
Ocorre que, no começo do mês, com a nova composição do STF, a corte julgou e condenou o senador Ivo Cassol (PP-RO), mas, graças aos votos de Luís Roberto Barroso e Teori Zavascki, o entendimento sobre a perda do mandato foi alterado.
Ficou acertado que caberia ao Congresso, e não mais ao Supremo, decretar a perda.
"Agora nós temos o deputado preso, condenado, que continua com o mandato. [...] Esse constrangimento é crônica de uma morte anunciada. Nós já sabíamos disso quando vimos aquela decisão recente aqui do plenário [no caso do senador Cassol]", disse Gilmar.
Com base no que foi decido para Cassol, os parlamentares condenados no mensalão viram crescer suas próprias chances de manutenção de seus mandatos.
Como o deputado João Paulo Cunha (PT-SP) apresentou recurso pedindo para que a última palavra sobre sua cassação seja da Câmara, o tema terá de novamente ser discutido pelo plenário do Supremo.
Ontem, durante sua sabatina no Senado, o indicado para ocupar o cargo de procurador-geral da República Rodrigo Janot também se mostrou incomodado com a existência de um preso com mandato.
"Temos que compatibilizar mandato com a perda dos direitos políticos. Vamos ter que compatibilizar o parlamentar e a restrição da liberdade dele com ausência nas sessões do Congresso Nacional. São vários os problemas jurídicos que daí decorrem. Esse pacote vamos ter que desembrulhar", disse.
A presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Cármen Lúcia, evitou críticas contundentes à Câmara. Ela, que nos julgamentos do STF sempre votou no sentido de que cabe à Câmara decretar a perda dos mandatos, disse que, da mesma forma que os ministros do Supremo cumpriram seu papel condenado Donadon, os deputados cumpriram o seu votando a cassação.
"Se o resultado é benéfico ou não, aí compete ao próprio povo verificar", afirmou.