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03/10/2012 - 15h09

Republicanos versus monarquistas: a mais civil das guerras

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CONAL URQUHART
DO "OBSERVER"

Na terça-feira, 25 de setembro, foi a vez dos espíritas; na quarta, 26, a do Partido Liberal Democrata; na quinta, 27, a Friends Meeting Room de Taunton estava reservada aos republicanos.

Indignados pela revelação de que a rainha havia questionado o secretário do Interior em 2003 por que o líder religioso muçulmano Abu Hamza ainda não estava preso, oito republicanos de Taunton e de aldeias vizinhas estavam presentes para ouvir Graham Smith, presidente da organização ativista Republic, que delineou os planos do grupo para a derrubada da monarquia britânica.

PA
Elizabeth 2ª, que neste ano completou seu jubileu de diamante
Elizabeth 2ª, que neste ano completou seu jubileu de diamante

Os dois últimos anos de pompa monárquica talvez pareçam um ponto baixo para os esforços dos republicanos do Reino Unido, mas, paradoxalmente, a organização cresceu de 9.000 integrantes antes do anúncio das núpcias reais para os 26 mil de hoje. A cobertura generosa ao casamento entre o duque e a duquesa de Cambridge e ao jubileu da rainha gerou emoções que variam de entusiasmo a indiferença simpática à monarquia, mas também despertou oposição.

Uma pesquisa de opinião pública conduzida pelo jornal "Guardian" no começo do ano constatou que 69% dos britânicos acreditavam que o país estaria pior sem a monarquia, enquanto 22% acreditavam que melhoraria.

"A maior parte das pessoas tolera a monarquia, mas isso muda quando são forçadas a engolir imagens da realeza. O casamento nos beneficiou. A família real ganhou destaque, e isso nos ajuda", disse Smith.

Os republicanos enxergam a incerteza cercando uma idosa soberana como uma grande oportunidade para dar mais destaque à causa deles. "Digamos que a rainha viva mais 20 anos. Isso seria uma grande oportunidade. À medida que ela envelhece, mais haverá debate sobre o que acontece a seguir. Quando ocorrerá a sucessão? As pessoas querem Charles ou William no trono? É um tanto mórbido e estranho, e reforçará o absurdo da situação toda", diz Smith.

"A sucessão será um grande momento. Em 1952, ninguém questionou. Mas desta vez as pessoas perguntarão porque dada pessoa estará recebendo um cargo para o qual não foi eleita."

A questão não é popular entre os jovens, por enquanto. Na sala de reuniões, sete dos participantes do debate tem pelo menos 50 anos de idade; dois são professores e um é um engenheiro na fábrica de helicópteros da AgustaWestland, em Yeovil.

Divulgação
Rainha Elizabeth 2ª (centro, de óculos escuros) durante visita ao Terraço Itália, em 1968
Rainha Elizabeth 2ª (centro, de óculos escuros) durante visita ao Terraço Itália, em 1968

A questão referente a Abu Hamza, que chegou ao conhecimento do público há três semanas quando Frank Gardner, correspondente da BBC, revelou que a rainha o havia informado sobre sua preocupação pelo fato de o líder religioso não ter sido preso em 2003, e sobre suas perguntas ao secretário do Interior com relação ao tema. O assunto virou tem a de discussão assim que a BBC pediu desculpas por ter violado a confiança da rainha.

"Isso ilustra que a ideia de a rainha estar acima da política é um mito, e o relacionamento confortável da BBC com o palácio. Se ela faz perguntas ao secretário do Interior, não é difícil imaginar que faça perguntas ao chanceler do Erário [ministro das Finanças] do tipo : 'Por que o deficit não está caindo?'. Isso seria explosivo", diz Smith.

"Boa parte da popularidade da monarquia perdura porque ela está envolta em segredo. Se as pessoas soubessem o que realmente acontece, o questionamento seria muito maior", afirma.

PAPEL DE PAREDE

Durante a discussão, uma mulher descreveu a família real como "um papel de parede meio sinistro", e outro participante comparou a propensão deles a se concederem medalhas e promoções militares aos costumes da Coreia do Norte. A coroação do príncipe Charles também é vista como propícia pelos republicanos porque ele continua impopular --apenas 39% dos britânicos desejam vê-lo no trono-- e devido à percepção de que ele desempenharia papel mais ativo que a mãe, como monarca. "Se pudermos impedir que ele assuma o trono, seria melhor", disse Smith.

O movimento Republic foi estabelecido em 1983. Smith é seu único integrante de período integral, e a organização conta ainda com dois funcionários em tempo parcial. O grupo não tem sede e recebe fundos via doações e assinaturas.

Na semana passada, Smith viajou de Bristol a Taunton, uma cidade parcialmente destruída pelas forças monarquistas durante a guerra civil inglesa nos cercos de 1644 e 1645, para distribuir panfletos aos lojistas e conversar com ativistas locais. Depois participou de um debate na Universidade de Exeter e foi a Truro para lançar uma campanha pela abolição do lucrativo ducado da Cornualha, cujo titular é Charles.

Em Taunton, não existem muitos sinais de jacobinismo, embora Kate Forsyth, de Chard, tenha descrito como ela sugeriu uma nova proposta, de demolir o Palácio de Buckingham para a construção de moradias populares. "Sempre odiei a desigualdade. Precisamos ter uma cultura na qual seja possível conquistar respeito, em lugar de receber deferência automática", afirmou.

Smith não conhece um país que tenha passado de monarquia para república sem uma guerra ou revolução, mas acredita que uma mudança pacífica seja possível no Reino Unido.

O Republic defende um chefe de Estado eleito, como na república da Irlanda. "Robinson, McAleese e Higgins (os três últimos presidentes irlandeses) são uma forte inspiração", diz Smith.

Ele não acredita que a idade da rainha a torne imune a críticas. "Creio que seria falsa condescendência afirmar que ela é velha demais para ser criticada. Minha posição é a de que ela é adulta, tem idade para responder por seus atos, ocupa um cargo público e deveria ser responsabilizada pelo que faz e diz", afirmou.

O público modesto presente à Friends Meeting House não sugere uma revolução incipiente, pacífica ou de outra ordem. Mas um dos republicanos mencionou um exemplo encorajador aos colegas: "Fui a uma reunião liberal democrata alguns aos atrás e o número de presentes era o mesmo que aqui. E veja até onde chegamos".

Tradução de PAULO MIGLIACCI.

 

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