Descrição de chapéu desmatamento

Cadastro ambiental pode ser usado para grilagem de terras públicas no AM, aponta estudo

Pesquisa indicou que 9 de cada 10 hectares registrados no CAR na região sul do estado estão irregulares

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São Paulo

Instrumento importante para regularização ambiental, o Cadastro Ambiental Rural (CAR) pode estar sendo utilizado para declarações ilegais de posse de terras públicas no sul do estado do Amazonas, aponta uma nova pesquisa.

O estudo, publicado na revista Land Use Policy, apontou que aproximadamente 90% da área presente nos cadastros da região não estão de acordo com as leis ambientais brasileiras.

Área desmatada em Apuí, município na região sul do estado do Amazonas
Área desmatada em Apuí, município na região sul do estado do Amazonas - Lalo de Almeida - 20.ago.20/Folhapress

O geógrafo Gabriel Carrero, que liderou a pesquisa, explica que essa ação pode facilitar a grilagem de terras no futuro. Isso porque uma das funções do CAR é permitir que pequenos agricultores registrem terras que ocupam, mesmo que eles não tenham a titulação oficial. A ideia é que o cadastro possa ajudar a obter o documento de posse no futuro.

Para Carrero, grileiros acabam se aproveitando dessa situação ao registrar terras públicas como se fossem deles. Depois, usam o CAR para reivindicar a posse dessas áreas.

A Folha entrou em contato com o SFB (Serviço Florestal Brasileiro), órgão vinculado ao Ministério da Agricultura responsável pelo CAR, que respondeu após a publicação da reportagem.

O órgão afirmou que os cadastros são analisados pelos órgãos estaduais de cada unidade da federação.
"Se há irregularidade e o órgão estadual confirmar, o problema será identificado e corrigido", disse a nota.

Afirmou também que o fato de existir CAR em terras públicas e em unidades de conservação não significa que essa área já teve a posse legalizada. O SFB disse que, ao serem identificadas as irregularidades, o governo tomará as medidas para corrigir a situação. "De forma alguma será legalizada área grilada."

Ainda de acordo com o órgão, a velocidade de análise do CAR atualmente "não é a adequada". Por isso, o órgão disse já ter disponibilizado para os estados uma nova plataforma que pode agilizar o processo.

O Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas), órgão do governo estadual responsável pelo CAR, afirmou que quando uma pessoa faz seu cadastro no sistema, ela se compromete a dar informações verdadeiras e que há punições administrativas e penais para o caso de fraudes.

O órgão disse que realiza uma análise de todos os registros feitos no ​CAR, inclusive checando se determinada área não é protegida. Caso seja comprovada alguma irregularidade, o processo é interrompido e a posse da terra não é concedida.

O cadastro foi criado em 2012 e deve ser feito por qualquer pessoa que tenha uma propriedade rural. Ele compila uma série de dados e auxilia no combate ao desmatamento, por exemplo, ao permitir que o poder público saiba quem ocupa uma área que está sendo destruída. É a partir dele que um proprietário obtém a regularidade ambiental do imóvel.

Os pesquisadores responsáveis pelo novo estudo usaram dados públicos para analisar uma região de 300 mil quilômetros quadrados no sul do Amazonas, que envolve sete municípios.

O grupo então comparou os registros feitos no CAR em áreas de terras públicas com outros cadastros existentes, e encontrou uma série de irregularidades.

No total, 90,6% da área dos cadastros observados é considerada ilegal, diz Carrero. Alguns, por exemplo, reivindicavam áreas de proteção, que não podem pertencer a pessoas físicas. São os casos, por exemplo, de territórios indígenas, unidades de conservação e áreas militares —estas são responsáveis por 45,8% do total da área de terras consideradas ilegais.

Outros CARs até estavam registrados em terras públicas que permitem a propriedade privada, como assentamentos rurais convencionais e terras públicas não destinadas. Nesses casos, estavam irregulares porque ultrapassavam o limite estabelecido em lei para esses tipos de propriedade, de 2.500 hectares, explica o pesquisador.

Além de uma possível ocupação irregular, a área analisada também sofre com o desmatamento. A região corresponde a 20% do tamanho total do Amazonas, e, no ano passado, respondeu por 63% do desmatamento no estado —o equivalente a mais de 1.700 quilômetros quadrados.

Em 2020, os sete municípios tinham concentrado 80% do desmatamento no estado.

"Nosso estudo mostrou que 35% de todo o desmatamento acumulado no sul do Amazonas ocorreram dentro dessas áreas do CAR que estão sobrepostas com terras públicas e que a metade disso, ou seja, cerca de 17%, foi dentro de cadastros considerados ilegais", afirma Carrero.

"O desmatamento ocorre ali porque é uma região de acesso por estradas, onde o governo também criou alguns projetos de assentamento e tem incentivado a expansão da agricultura. Além disso, é mais perto de Rondônia e Mato Grosso, onde se facilita a migração de uma cultura agropecuária ", diz o pesquisador.

Erramos: o texto foi alterado

A região analisada pela pesquisa teve cerca de 1.700 quilômetros quadrados desmatados, não mais de 19 mil quilômetros quadrados, como foi publicado em versão anterior deste texto.
 

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