Por que a proibição de sacolas plásticas não funcionou na Califórnia

Público, em vez de reutilizar, passou a descartar no primeiro uso embalagens de material mais grosso disponíveis nas lojas

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Hiroko Tabuchi
The New York Times

Há quase uma década, a Califórnia se tornou o primeiro estado dos Estados Unidos a proibir sacolas plásticas descartáveis, na tentativa de combater um problema persistente de resíduos plásticos.

Então vieram as sacolas plásticas reutilizáveis e resistentes, oferecidas aos clientes por US$ 0,10. Projetadas para aguentar dezenas de usos e tecnicamente recicláveis, muitos varejistas as trataram como isentas da proibição.

Mas, como elas não pareciam muito diferentes das sacolas frágeis que substituíram, muitas pessoas não as reutilizaram de fato. E, embora viessem com um símbolo de reciclagem, descobriu-se que poucas, se algumas, eram realmente recicladas.

O resultado infeliz: no ano passado, os californianos jogaram fora mais sacolas plásticas, considerando o peso total, do que quando a lei foi aprovada pela primeira vez, de acordo com dados da CalRecycle, a agência de reciclagem da Califórnia.

Sacolas verdes de plástico grosso colocadas em uma mesa ao lado de homem que segura cenouras
Distribuição de alimentos em Oakland, na Califórnia, em sacolas reutilizáveis - Justin Sullivan - 15.jul.2022/Getty Images/AFP

Agora os legisladores estão tentando corrigir esse problema. Um novo projeto de lei busca proibir todas as sacolas plásticas oferecidas no caixa, incluindo as resistentes. Os compradores ainda poderiam pagar por sacolas de papel.

"É hora de nos livrarmos completamente das sacolas plásticas", disse o senador estadual Ben Allen, democrata que é um dos apoiadores do projeto de lei.

Segundo relatos, a proibição inicial de sacolas plásticas da Califórnia foi uma experiência bem-intencionada, mas fracassada, uma regra ambiental que teve efeito contrário e inadvertidamente piorou a situação.

"Não nos preocupamos com a exceção para essas sacolas mais grossas nos primeiros dias", disse Mark Murray, diretor do grupo Californians Against Waste (californianos contra o desperdício). "Não parecia que elas se tornariam o que se tornaram."

A pandemia, que causou o temor de que reutilizar sacolas poderia ajudar a espalhar o vírus, levou a "uma explosão dessas sacolas plásticas mais grossas", disse ele. Basicamente, as pessoas passaram a utilizar as sacolas mais grossas apenas uma vez.

O tempo médio que os compradores usavam uma sacola plástica? Doze minutos, de acordo com os responsáveis pelo projeto de lei.

Alguns defensores da medida dizem que a proibição inicial teria sido eficaz se devidamente aplicada. A proibição, adotada em 2014, permitia a venda de sacolas plásticas aos compradores apenas se fossem recicladas na Califórnia.

No entanto, "nenhum fabricante de sacolas ou varejista conseguiu demonstrar qualquer evidência de que elas estavam sendo recicladas", disse Jan Dell, fundadora do The Last Beach Cleanup, grupo sem fins lucrativos.

No último ano, ela liderou um esforço para processar varejistas que vendem as sacolas plásticas mais grossas, alegando que a sua venda é proibida, com base na proibição original desses itens.

Mesmo que a nova lei seja aprovada, bilhões de sacolas provavelmente ainda serão vendidas antes que ela possa entrar em vigor em 2026, disse ela. "Se a lei inicial fosse aplicada, não teríamos mais essas sacolas hoje."

Daniel Conway, da California Grocers Association, que representa os estabelecimentos, diz que os varejistas seguiram a lei "à risca". Ele afirma esperar que a nova legislação esclareça qualquer confusão que ainda posssa existir em relação às sacolas mais grossas.

"Vemos isso como terminar algo que começamos", diz. "As pessoas estão realmente começando a levar sacolas reutilizáveis quando vão ao supermercado."

Os fabricantes de plástico dos EUA afirmaram, em comunicado, que "se mantiveram firmes na ampliação de um sistema pelo qual transformam plástico usado em plástico novo". Os formuladores de políticas públicas precisam trabalhar com as empresas para que as regras não resultem em "resultados ambientais piores", disse Ross Eisenberg, presidente do grupo.

Outros estados aprenderam com a experiência da Califórnia. Em Nova York, que proibiu sacolas plásticas na maioria dos caixas de lojas em 2020, defensores do meio ambiente conseguiram resistir a uma proposta que permitiria que as lojas continuassem fornecendo sacolas plásticas mais grossas. Segundo relatos, há inúmeros exemplos de lojas que não cumpriram a proibição.

Havaí, Connecticut, Delaware, Maine, Oregon, Vermont e Nova Jersey também adotaram algum tipo de proibição de sacolas plásticas.

"Os legisladores em todos os níveis precisam estar atentos e saber que os fabricantes de sacolas plásticas buscarão todas as oportunidades para continuar inundando o mercado com sacolas plásticas mais grossas", disse Judith Enck, presidente do grupo Beyond Plastics e ex-administradora regional da Agência de Proteção Ambiental.

Apesar do revés com as sacolas plásticas, a Califórnia continua na vanguarda dos esforços para reduzir o lixo plástico, que está em todos os lugares, poluindo praias e rios e também contaminando alimentos e a água potável na forma de microplásticos.

Em 2021, a Califórnia aprovou uma lei que proíbe as empresas de usar o símbolo de reciclagem (aquele de "setas em movimento") a menos que possam provar que o material é, de fato, reciclado na maioria das comunidades da Califórnia.

No ano seguinte, foi aprovado um projeto de lei que transfere a responsabilidade da reciclagem e do descarte de resíduos das comunidades locais para os produtores de plástico e empresas de embalagens.

A Califórnia também voltou sua atenção para as empresas de combustíveis fósseis, que produzem o petróleo a partir do qual os plásticos são feitos. Em 2022, o procurador-geral da Califórnia, Rob Bonta, abriu uma investigação sobre alegações de que a indústria enganou o público ao fazer com que acreditasse que a reciclagem poderia resolver a crise dos resíduos plásticos.

Grupos da indústria rejeitaram essas alegações e prometeram continuar focados na melhoria da reciclagem. Nos Estados Unidos, a taxa de reciclagem tem se mantido abaixo de 10% há décadas.

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