Descrição de chapéu mudança climática

Planeta passa por branqueamento massivo de corais, que deve ser o maior já registrado

Fenômeno, provocado pelo aquecimento do oceano, é confirmado por agência dos EUA e rede de cientistas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Catrin Einhorn
The New York Times

Os recifes de coral do mundo estão passando por um evento global de branqueamento causado por temperaturas oceânicas extraordinárias, anunciaram a Noaa (Administração Nacional Oceânica e Atmosférica) e parceiros internacionais nesta segunda-feira (15).

É o quarto evento global desse tipo registrado e espera-se que afete mais recifes do que qualquer outro. O branqueamento ocorre quando os corais ficam tão estressados que perdem as algas simbióticas de que precisam para sobreviver. Os corais branqueados podem se recuperar, mas se a água ao redor deles estiver muito quente por muito tempo, eles morrem.

Recifes de coral branqueados
Recifes de coral branqueados na Grande Barreira de Corais australiana no recife Moore, em 27 de fevereiro de 2024 - Australian Institute of Marine Science/Grace Frank/Reuters

Os recifes de coral são ecossistemas vitais: berços de calcário da vida marinha que nutrem cerca de um quarto das espécies oceânicas em algum momento de seus ciclos de vida, apoiam peixes que fornecem proteína para milhões de pessoas e protegem as costas de tempestades. O valor econômico dos recifes de coral do mundo foi estimado anualmente em US$ 2,7 trilhões (R$ 14 trilhões).

No último ano, as temperaturas oceânicas têm sido fora do comum.

"Isso é assustador, porque os recifes de coral são tão importantes", disse Derek Manzello, coordenador do programa Coral Reef Watch da Noaa, que monitora e prevê eventos de branqueamento.

A notícia é o mais recente exemplo das previsões alarmantes dos cientistas do clima se concretizando à medida que o planeta se aquece. Apesar de décadas de alertas dos cientistas e promessas dos líderes, as nações estão queimando mais combustíveis fósseis do que nunca e as emissões de gases de efeito estufa seguem aumentando.

Mortes substanciais de corais foram confirmadas ao redor da Flórida e do Caribe, especialmente entre as espécies Acropora cervicornis e Acropora palmata, mas os cientistas dizem que ainda é cedo para estimar qual será a extensão da mortalidade global.

Para determinar um evento global de branqueamento, a Noaa e o grupo de parceiros globais, a Iniciativa Internacional de Recifes de Coral, usam uma combinação de temperaturas da superfície do mar e evidências dos recifes.

De acordo com seus critérios, todos os três oceanos que abrigam recifes de coral —o Pacífico, o Índico e o Atlântico— devem passar por branqueamento dentro de 365 dias, e pelo menos 12% dos recifes em cada oceano devem ser submetidos a temperaturas que causam branqueamento.

Veja antes e depois de coral branqueado na costa brasileira

Carregando imagens...
Corais saudáveis da espécie Millepora alcicornis
Corais branqueados da espécie Millepora alcicornis

Corais da espécie Millepora alcicornis em Tamandaré (PE) em fevereiro de 2024, ainda saudáveis, e no mês seguinte, já branqueados devido ao excesso de calor marinho - Ágatha Naiara Ninow/Projeto PELD-Tams

Atualmente, mais de 54% da área de corais do mundo experimentou estresse térmico de branqueamento no último ano, e esse número está aumentando cerca de 1% por semana, disse Manzello.

Ele acrescentou que dentro de uma ou duas semanas, "este evento provavelmente será o evento global de branqueamento mais extenso em termos de área já registrado".

Cada um dos três eventos globais de branqueamento passados foi pior que o anterior. Durante o primeiro, em 1998, 20% das áreas de recifes do mundo sofreram estresse térmico de branqueamento. Em 2010, foram 35%. O terceiro ocorreu de 2014 a 2017 e afetou 56% dos recifes.

O evento atual deve ser de curta duração, disse Manzello, porque o El Niño, um padrão climático natural associado a oceanos mais quentes, está enfraquecendo e os meteorologistas preveem que um período mais frio de La Niña se estabelecerá até o final do ano.

O branqueamento foi confirmado em 54 países, territórios e economias locais, tão distantes entre si quanto Flórida, Arábia Saudita e Fiji. A Grande Barreira de Corais na Austrália está sofrendo o que parece ser seu evento de branqueamento mais grave; cerca de um terço dos recifes observados por via aérea mostraram prevalência de branqueamento muito alto ou extremo, e pelo menos três quartos mostraram algum branqueamento.

"Às vezes fico deprimido, porque a sensação é como, 'Meu Deus, isso está acontecendo'", disse Ove Hoegh-Guldberg, professor de estudos marinhos na Universidade de Queensland, que publicou previsões iniciais sobre como o aquecimento global seria catastrófico para os recifes de coral.

"Agora estamos no ponto em que estamos em um filme de desastre", disse ele.

A confirmação mais recente de branqueamento generalizado, que motivou o anúncio de segunda-feira, veio do Oceano Índico Ocidental, incluindo Tanzânia, Quênia, Maurício, Seychelles e a região ao largo da costa oeste da Indonésia.

Swaleh Aboud, cientista de recifes de coral da Cordio East Africa, um grupo sem fins lucrativos de pesquisa e conservação com sede no Quênia e focado no Oceano Índico, disse que espécies de corais conhecidas por serem termicamente resistentes estão branqueando, assim como recifes em uma área mais fria considerada um refúgio climático.

Recentemente, ele visitou uma comunidade de pescadores no Quênia chamada Kuruwitu, que atuou para reviver seu recife. Muitas das colônias de corais restauradas haviam ficado brancas como fantasmas. Outras estavam pálidas, aparentemente a caminho do branqueamento.

"Ação global urgente é necessária para reduzir futuros eventos de branqueamento, principalmente impulsionados por emissões de carbono", afirmou Aboud.

Os cientistas ainda estão aprendendo sobre a capacidade dos corais de se adaptarem às mudanças climáticas. Há esforços em andamento para criar corais que tolerem temperaturas mais altas. Em alguns lugares, incluindo Austrália e Japão, os corais parecem estar migrando em direção à região polar, começando a ocupar novos lugares.

Mas os cientistas dizem que uma variedade de fatores, como a quantidade de luz que penetra na água e a topografia do fundo do mar, tornam essa migração limitada ou improvável em grande parte do mundo.

Além disso, há o problema da acidificação dos oceanos; à medida que a água do mar absorve dióxido de carbono da atmosfera, ela se torna mais ácida, tornando mais difícil para os corais construírem e manterem os recifes.

Hoegh-Guldberg, que estudou o impacto das mudanças climáticas nos recifes de coral por mais de três décadas, foi autor de um relatório de 2018 do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas que descobriu que o mundo perderia a grande maioria de seus recifes de coral com 1,5°C de aquecimento, e praticamente todos a 2°C. As promessas atuais feitas pelas nações colocam a Terra em um caminho para cerca de 2,5°C de aquecimento até 2100. Ainda assim, ele não perdeu a esperança.

"Acho que resolveremos o problema se nos levantarmos e lutarmos para resolvê-lo", disse Hoegh-Guldberg. "Se continuarmos apenas fazendo discursos vazios e não partirmos para as soluções, então estamos nos enganando."

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.