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Contra desmatamento na Amazônia, Bolsonaro copia proposta do PT

Para pesquisador, conselho para a Amazônia presidido por Mourão poderá ressuscitar mentalidade nacionalista da ditadura militar

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Manaus

Anunciada pelo pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nesta terça-feira (21) a criação de uma força nacional ambiental contra o desmatamento repete uma iniciativa fracassada do governo Lula da Silva (PT).

Segundo a ex-presidente do Ibama Suely Araújo, que comandou o órgão no governo Michel Temer (MDB), a criação de uma força nacional ambiental voltada à fiscalização da Amazônia foi proposta em 2008 pelo então ministro do Meio Ambiente Carlos Minc, mas na prática não prosperou.

Na época, Minc afirmou, via nota à imprensa, que planejava usar alguns milhares de policiais militares estaduais e bombeiros em ações contra crimes ambientais, “em termos semelhantes ao que constituiu a Força Nacional”. 

Equipes da Força Nacional convocadas para ajudar no combate ao incêndio na Amazônia em agosto de 2019 - Antonio Cruz/Agência Brasil

Em 22 de julho de 2008, Lula assinou o decreto 6.515, para a instituir a Guarda Ambiental Nacional e o Corpo de Guarda-Parques. As medidas não foram levadas adiante, mas a normativa nunca foi revogada. 

Quase 12 anos depois, Bolsonaro determinou a criação de uma Força Nacional Ambiental “à semelhança da Força Nacional de Segurança Pública, voltada à proteção do meio ambiente da Amazônia”, segundo escreveu no Twitter.

Em entrevista ao Blog da Andréia Sadi, no G1, o ministro Ricardo Salles (Ambiente) afirmou: “Serão policiais militares dos estados, um espelho da força de segurança pública com potencial de reunir milhares de agentes para atuar nas operações da Amazônia”.

Para Araújo, a criação de uma força nacional não terá impacto significativo sobre o desmatamento, que cresceu 29% entre agosto de 2018 julho no ano passado, segundo o sistema Prodes, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

“Reconhecendo que o apoio dos militares nas operações em áreas críticas pode ser necessário, há de compreender que a fiscalização ambiental tem de ir muito além da presença de tropas no campo”, afirmou a ex-presidente do Ibama, que defende o fortalecimento dos órgãos ambientais federais, mais capacitados e experientes.

“A saída não está na militarização da política ambiental. Nesse âmbito, cabe lembrar que o Orçamento 2020 prevê apenas R$ 77 milhões para a fiscalização do Ibama em todo o país, valor 25,3% menor do que o autorizado em 2019.”

Via telefone, Minc, hoje deputado estadual (PSB-RJ), disse que a ideia da Força Nacional Ambiental foi descartada logo após o seu anúncio, em junho de 2008, devido ao longo tempo que seria necessário para criá-la. 

“Substituímos o conceito de uma força nacional exclusiva por uma coordenação ambiental operacional”, afirmou o ex-petista. Faziam parte dessa coordenação a Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Ibama e ICMBio, além da implantação de bases do Exército em áreas críticas.

Sobre a proposta ressuscitada por Bolsonaro, o ex-ministro afirmou que “um slogan por si só não resolve nada se o conjunto das políticas for no sentido contrário”.

“É preciso estar fundado em várias outras políticas. Por exemplo, ele desacreditou o Inpe, atou as mãos do Ibama e do ICMBio, desmontou o Fundo Amazônia, que demorou um tempão pra criarmos.

Conselho da Amazônia

Na mesma postagem no Twitter, Bolsonaro anunciou o Conselho da Amazônia, a ser presidido pelo vice-presidente, o general Hamilton Mourão. O objetivo, disse, é “coordenar as diversas ações em cada ministério voltadas para a proteção, defesa e desenvolvimento sustentável da Amazônia.”

Para o geógrafo Maurício Torres, da Universidade Federal do Pará (UFPA), a criação do conselho sob comando militar gera temores da volta das diretrizes da ditadura (1964-85), incluindo a construção de grandes obras com impactos socioambientais, como a rodovia Transamazônica, sob o lema nacionalista de “integrar para não entregar”. 

“A experiência do comando militar agindo na Amazônia é um desastre ambiental e social sem precedentes. Até hoje, não sabemos a dimensão exata do genocídio indígena. As grandes rodovias da ditadura são vetores de desmatamento, muito em prol da grilagem e do latifúndio. O dano é socializado, e o benefício foi privatizado por uma minoria”, afirma Torres.

“Essa visão desenvolvimentista não mudou quando vemos Mourão defendendo a mineração de potássio em território do povo mura [no estado do Amazonas]. São grupos que partem de um nacionalismo que vê o índio como um estrangeiro a ser combatido”, diz o geógrafo.

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