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Conselheira do CEERT (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades), é doutora em psicologia pela USP

Carnaval, herança e cultura

Persiste na festa a força da música e da religiosidade, numa celebração à vida

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"As baianas ...quando giram na avenida, primeiro no sentido anti-horário, vão de encontro aos Orixás para pedir licença para a comunidade desfilar, quando retornam, no sentido horário, trazem a energia para a limpeza e axé para a passagem da escola. A bênção às mães do samba..."

Nesta semana que antecede o Carnaval, os escritos da jornalista Claúdia Alexandre nos lembram da essência feminina e negra do samba. Ela exemplifica mostrando que muitas baterias foram "batizadas" com o ritmo dedicado a um Orixá, em agradecimento às mães de santo, que acolheram as organizações carnavalescas e ofereceram proteção religiosa ao samba.

As cores das escolas, muitas vezes, foram escolhidas em homenagem a algum Orixá, assim como o toque de suas baterias, configurando uma das diferentes manifestações dos Carnavais que marcam o Brasil.

Assim como o frevo e o maracatu de Recife, as danças indígenas e negras do Amazonas, o Carnaval baiano com os blocos afro, quase sempre originários das favelas, periferias e regiões majoritariamente negras.

Por essa razão, são também manifestações de resistência, em vozes críticas e irreverentes: 
"Brasil, compartilhou, viralizou, nem viu/E o país inteiro assim sambou/Caiu na fake news...", lembra o enredo da São Clemente, enquanto a Grande Rio faz um apelo: "Pelo amor de Deus, pelo amor que há na fé/Eu respeito seu amém/ Você respeita o meu axé".

E a desigualdade denunciada se manifesta também no coração do próprio Carnaval. 

O economista Marcel Balassiano lembra que no ano inteiro, em barracões e quadras das escolas, milhares de ferreiros, costureiras, artistas plásticos, faxineiros, segurança, carnavalescos, cantores, compositores, movimentam muito dinheiro (neste ano, R$ 8 bilhões, segundo estimativa da CNC, Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) e geram empregos. 

Mas os vultosos recursos financeiros não retornam aos protagonistas do Carnaval, o que se reflete nos cortes de recursos para escolas de samba, blocos afro, grupos carnavalescos de várias regiões, contrariando o samba-enredo da Mangueira deste ano, que diz "Favela, pega a visão/ Não tem futuro sem partilha".

Ainda assim, em tempos em que muitas pessoas mais parecem "mortos-vivos" só "fazendo amor" com poder e dinheiro e pregando o ódio e a violência, persiste a força da música, religiosidade, corpos e dramaturgia comunicando vigorosamente conhecimentos sobre o país numa celebração à vida.

É a vibração que se observa também em São Paulo, que nunca fez jus ao apelido de "túmulo do samba", pois exibe uma grande riqueza de escolas, trazendo enredos que recontam de maneira criativa e poética a história do país.

Nascida na Casa Verde, região negra da cidade, com grandes escolas de samba, não posso deixar de aspirar que escolas tradicionais da cidade, que dignificam o sentido de samba-enredo, retornem ao Grupo Especial, pois é lá o seu lugar. 

E, falando em São Paulo, destaco a homenagem que será feita pela Mocidade Unida da Mooca, do Grupo de Acesso, a uma das principais lideranças negras da história brasileira: Abdias do Nascimento, poeta, ator, escritor, professor, dramaturgo e parlamentar que, com sua luta incansável e vasta obra, auxiliou e auxilia o Brasil a se encontrar consigo próprio. 

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