Siga a folha

Médico cancerologista, autor de “Estação Carandiru”.

Haverá uma nova pandemia, só não sabemos como virá nem de onde

Não podemos ser pegos de surpresa outra vez, não vamos repetir os erros

Assinantes podem enviar 7 artigos por dia com acesso livre

ASSINE ou FAÇA LOGIN

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Será fundamental estarmos preparados para enfrentá-la, sem repetir os erros que cometemos quando o vírus da Covid-19 chegou até nós.

O Brasil é o único entre os países mais desenvolvidos que não conta com uma instituição especializada na gestão de emergências em saúde pública e no controle de doenças, como são as dos países europeus e os Centers for Diseases Control and Prevention (CDC), dos Estados Unidos, por exemplo.

Assim que surgirem os primeiros casos de uma doença desconhecida em nosso território, será necessário detectá-los de imediato, isolar o agente causador, sequenciar seu genoma e caracterizar os modos de transmissão e o padrão de disseminação entre seres humanos e animais. Esses conhecimentos são fundamentais para a elaboração de vacinas e demais estratégias de combate.

O mesmo vale para doenças conhecidas que podem reemergir num dado momento. Veja a epidemia de dengue que estamos vivendo. Se contássemos com uma estrutura especializada em responder de forma emergencial, capaz de aplicar modelos epidemiológicos para avaliar a extensão e a gravidade dos surtos com antecedência, o SUS teria tido tempo de se mobilizar com mais eficácia para evitar tanta morbidade.

Com as mudanças climáticas atuais, a pobreza e as condições de moradia da nossa população, é impossível acabar com a proliferação do Aedes e com a dengue, mas as mortes podem ser evitadas com uma medida simples: a hidratação.

A dificuldade não é saber como tratar, mas como organizar as redes formadas pelo programa Estratégia Saúde da Família, pelas Unidades Básicas de Saúde, pelas Unidades de Pronto Atendimento e pelos hospitais de forma racional para garantir o acesso irrestrito ao atendimento, num país das dimensões do nosso.

Ilustração de Líbero para coluna de Drauzio Varella de 24 de abril de 2024 - Libero Malavoglia/Folhapress

É um desafio gigantesco, que não pode depender de iniciativas isoladas das prefeituras. Emergências em saúde pública exigem coleta de dados confiáveis, respostas rápidas e coordenação nacional e internacional.

Precisamos de um órgão técnico supervisionado pelo Ministério da Saúde, integrado ao SUS, para assessorá-lo com autonomia e estabilidade funcional, independente do voluntarismo dos governantes da ocasião. Não podemos repetir absurdos recentes, como o de depender da imprensa para checar os números da epidemia uma vez que os oficiais não eram confiáveis.

Não é preciso reinventar a roda. Apesar das dificuldades e dos descasos, a ciência brasileira dispõe de cientistas da melhor qualidade, distribuídos em universidades e institutos de pesquisas respeitados internacionalmente, como o Butantan, a Fiocruz e o Instituto Evandro Chagas, entre vários outros.

Temos também cientistas altamente capacitados que trabalham nos maiores centros de pesquisa americanos e europeus. São brasileiros dispostos a voltar para o país assim que lhes forem oferecidas condições decentes para prosseguir com suas pesquisas. Não é sensato desperdiçar talentos que nos fazem falta.

As mudanças do clima, o desmatamento, o crescimento desordenado das cidades, a superpopulação em algumas áreas e a desigualdade econômica formam o caldo de cultura ideal para a disseminação de doenças infecciosas e de outros agravos.

As ameaças à saúde da população no mundo atual estão cada vez mais complexas. Não há mais espaço para improvisações. As políticas públicas devem ser adotadas pelo SUS depois de análises de dados e avaliações técnicas baseadas nas melhores evidências científicas.

O Brasil tem um dos sistemas de saúde mais abrangentes do mundo, o SUS, mas não é fácil oferecer assistência para 200 milhões de habitantes espalhados numa extensão continental, com grandes massas populacionais vulneráveis.

A próxima emergência em saúde pública não pode provocar tragédia semelhante à da Covid-19. Faz falta um órgão técnico adaptado à nossa realidade, com recursos financeiros, gestão moderna, livre de interferências políticas e com agilidade administrativa para contratar profissionais, desenvolver estudos colaborativos com as universidades e os institutos de pesquisa, integrado ao SUS com o objetivo de assessorá-lo e fortalecê-lo.

Perderam a vida mais de 700 mil brasileiros na última pandemia. Não podemos ser pegos de surpresa outra vez. Não vamos repetir os mesmos erros, não é possível que não tenhamos aprendido nada.

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas