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Economista, mestre em filosofia pela USP.

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MP dos cartórios digitais corre o risco de caducar

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Vamos cada vez menos ao banco. Pagar uma conta, fazer uma transferência, conferir um extrato; pouco tempo atrás, isso exigiria um deslocamento. Hoje, fazemos de casa ou do celular.

Agora imagine se os bancos se unissem e fizessem lobby no Congresso para proibir o internet banking, obrigando-nos a voltar às agências. É exatamente isso que o lobby dos cartórios e tabelionatos faz neste momento.

Já existe tecnologia para que realizemos online muitas das funções dos cartórios. Transferir propriedade, certificar documentos e contratos, conferir titularidades. Isso já é rotina em diversos países. E há, aqui no Brasil, uma medida provisória no Congresso para viabilizar esse avanço: é a MP 1085/21, ou MP dos cartórios digitais. Graças ao poder de pressão dos cartórios, contudo, ela corre o risco de caducar.

MP 1085/21, ou MP dos cartórios digitais, corre o risco de caducar - Pixabay

A digitalização dos cartórios reduz o custo de se fazer negócios. Transferir um imóvel levaria poucos dias, e não semanas ou até meses. Para cada um de nós pode parecer pouca coisa, porque compramos e vendemos imóveis poucas vezes na vida. Mas o custo agregado das transações de toda a sociedade é alto.

A possibilidade de se consultar os registros instantaneamente também facilitaria o processo caro e demorado de averiguação de documentos numa compra ou venda. Hoje, são dezenas de profissionais e semanas de trabalho que as imobiliárias gastam para fazer essa tarefa, que poderia ser resolvida em poucas horas se fosse tudo digital.

Num estudo da Câmara Brasileira da Indústria da Construção ("O Custo da Burocracia no Imóvel", de 2015), a burocracia encarece em 12% o preço final dos imóveis, cerca de R$ 18 bilhões por ano.

A digitalização também ajudaria o mercado de crédito. Com registros públicos digitais, facilmente verificáveis, uma instituição financeira pode ter mais segurança em aceitar uma propriedade como garantia. Isso sem falar no ganho para todas as transações com a assinatura digital e o fim do ritual arcaico de ir e voltar a cartórios para reconhecer firma.

É claro que nem todo mundo fica feliz com isso. Cartórios temem que essa digitalização, centralização e disponibilização da informação que eles hoje possuem seja o início de seu fim. Tabeliães também perderiam muitas das suas prerrogativas. Ninguém gosta de abrir mão de privilégios. Para se ter uma ideia, a renda média de um titular de cartório ultrapassa os R$ 100 mil mensais. Por isso mobilizam um poderoso lobby e sustentam diversos políticos pelo país.

Em toda disputa social há interesses antagônicos em jogo. Neste caso, imobiliárias, financeiras e construção civil são favoráveis à certificação digital, enquanto os cartórios e seus apadrinhados são contra.

Não é escolhendo um predileto entre esses dois grupos que chegaremos à solução. Precisamos olhar para além da disputa imediata de interesses privados e pensar no interesse social, no qual não há a menor dúvida: toda a sociedade ganha com uma economia mais digital, mais rápida e mais acessível. Afogar-se em papelada, carimbos, taxas e deslocamentos desnecessários é um atraso geral.

Às vezes o jeito mais eficaz de sabotar uma mudança é simplesmente deixar o assunto morrer. É o risco atual.

Se não for votada até 1º de junho, a MP perde a validade. Ainda nem tem relator.

Ou a sociedade se organiza e mostra aos deputados a importância dessa pauta ou seguiremos reconhecendo firma e autenticando cópia. Se você adora perder uma tarde no cartório, é só não fazer nada. Agora, se você não gosta, não adianta lembrar do assunto só na próxima vez em que estiver na fila de um carimbo.

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