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Economista, mestre em filosofia pela USP.

Uma coisa não podemos negar: Datena foi 'autêntico'

O candidato do PSDB fez aquilo que seu coração mandou, sem autocensura

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Datena mostrou-se desequilibrado e violento na lamentável cadeirada que desferiu em Pablo Marçal. Há, contudo, um adjetivo positivo que não lhe podemos negar: ele foi autêntico. Fez aquilo que seu coração mandou, sem autocensura.

E não é isso que mais valorizamos em nossos representantes hoje em dia? Só de falar como eu gostaria de falar —sem papas na língua, falando o que sente, sem medo de ofender; ou melhor, querendo ofender— já se torna um herói popular. Se acusar a todos de crimes hediondos sem provas, como faz Marçal, é bonito, por que não também a agressão? Refrear o ato das mãos e forçar-se a verbalizar nossos impulsos é já uma forma de matar nossa reação vital.

O candidato José Luiz Datena ao deixar o debate da TV Cultura, na noite de domingo (15) - Folhapress

Levada à sua conclusão lógica, a autenticidade pura termina justamente na agressão física. Já que nenhum de nós quer que a política dê lugar à guerra (estamos de acordo nisso, não?), precisamos nos indagar sobre os limites da autenticidade. Quais outros valores importam?

Em favor da autenticidade, reconheço um ponto: a linguagem política profissional é intragável. Ela domina maneiras sofisticadas de apagar a própria responsabilidade por coisas ruins; sabe ser ambígua para não se comprometer futuramente; sabe inclusive transmitir segurança no uso da linguagem pretensamente técnica para fingir competência. É arredondada, diplomática, pretensamente séria. E, por isso mesmo, engana.

Uma linguagem que quebre com isso, que fale a língua do cidadão normal, já é uma ponte para se identificar com ele. Melhor o assumidamente imperfeito do que a perfeição fingida da política. Sim, o "não político" pode cometer erros, pode falar besteira às vezes, mas "diz a verdade". Não a verdade literal dos dados, e sim uma verdade interior: a da revolta com a política tradicional (e da imprensa), que, mesmo sabendo articular dados e fatos quando lhe convém, o faz justamente para enganar e manter tudo como está.

Na raiz disso está a revolta contra a política tradicional, descartada em bloco como se fosse "tudo a mesma porcaria" indigna de qualquer crédito. Mas é claro que não é tudo a mesma porcaria. Na política, assim como em todas as áreas, existem melhores e piores. Há aqueles que deixam em sua cidade um legado de instituições e programas que seguem funcionando em benefício da população e aqueles que deixam um vazio de escândalos e obras abortadas. Selecionar os melhores e rejeitar os piores é parte do aprendizado.

Uma pessoa que tenha dificuldade de se expressar e por isso prefira textos ensaiados será bem pouco autêntica em suas falas, mas nem por isso má gestora. A entrada de novos rostos e novos jeitos de se comunicar é muito bem-vinda, mas não torna desnecessário o senso crítico do eleitor. A autenticidade promete mudança. Mas essa mudança dá algum indício de que será para melhor?

Frases duras contra quem eu não gosto; saber enfurecer os membros do lado contrário ao meu. Capacidade de causar barraco em debates. São características positivas num programa de TV ou num post de redes sociais. O trabalho de gerir uma cidade e decidir como investir seus recursos de forma a melhorar a vida dos cidadãos precisa de outras capacidades além dessas.

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