Manuela Cantuária

Roteirista e escritora, é criadora da série 'As Seguidoras' e trabalha com desenvolvimento de projetos audiovisuais

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Manuela Cantuária
Descrição de chapéu Todas violência

Um trem fora dos trilhos

O 'oásis' vagão rosa nada mais é do que uma miragem

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As portas do "vagão rosa" do metrô se abrem como um portal para um universo utópico, onde mulheres não correm o risco de serem assediadas no transporte público –ou distópico, onde mulheres precisam ser segregadas daqueles que cometem esses crimes corriqueiros?

Fantasiar um vagão não me parece ser a resposta, já que esse trem mal-assombrado sempre me transporta de volta ao mundo real. Um mundo que, bem sabemos, não é cor-de-rosa.

Confinada em uma sala de espera sobre trilhos, persevera a expectativa, abafada por estalos, rangidos e guinchos metálicos, do dia em que não precisaremos de um vagão exclusivo ao gênero feminino, como um band-aid da Hello Kitty para estancar uma fratura exposta nas entrelinhas.

No Rio de Janeiro, cidade onde moro, o "carro exclusivo para mulheres", cuja aparência parece ter sido idealizada pela Penélope Charmosa —a personagem do antigo desenho animado "Corrida Maluca" que, diga-se de passagem, frequentemente precisava ser resgatada–, existe desde 2006.

Ilustração de um trem do Metrô visto a partir do primeiro vagão desenhado em linhas rosas pink e preenchimento rosa claro. O fundo é cinza.
Silvis/Folhapress

Há dez anos, o projeto de lei do "vagão rosa" era vetado pelo governo estadual de São Paulo, após intensa mobilização de coletivos feministas. Lembro, como se fosse ontem, das máximas estampando cartazes nas ruas e postagens nas redes: "contra o assédio, vagão rosa não é remédio"; "a cidade que a gente quer não segrega a mulher"' e "o vagão das mulheres só anda para trás".

Mais gritante que o rosa-pink escolhido para decorar a carroceria do famigerado vagão é o fato de que a medida é mesmo problemática quando o objetivo é a igualdade de gênero. Não preciso desperdiçar o colágeno das minhas leitoras com explicações óbvias.

Esse oásis feminino nada mais é do que uma miragem. E a grande questão é que deixamos de fora –literalmente– aqueles que deveriam ser responsabilizados pelo problema: os homens.

A chegada de um espalhafatoso vagão feminino, enquanto aguardo na estação do metrô, não me traz nenhum conforto. Até hoje não me acostumei com a hesitação entre adentrá-lo ou não, em protesto. Apressada pelo alarme, decido evitar o problema (leia-se os homens) e embarcar nesse mundinho cor-de-rosa.

Como parte da iniciativa Todas, a Folha presenteia mulheres com dois meses de assinatura digital grátis

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