As notícias aceleram meu batimento cardíaco feito comprimidos de cloroquina: nem gripezinha nem pneumonia, a Covid-19 é uma endotelite; o epicentro é aqui e não há leitos, nem respiradores, nem ministro da Saúde; governo federal garante a sobrevida da vida pública de Mário Frias; oposição divulga nota de repúdio à nota de repúdio divulgada por general Heleno; liberado o vídeo de uma reunião que poderia ter sido um churrasco em um grande acordo nacional, com boiada, com hemorroida, com trozoba, com o Supremo na cadeia, com tudo.

Em meio a tantos absurdos, a notícia de que a Nasa teria descoberto evidências de um universo paralelo me pareceu bastante razoável. Segundo a reportagem, um projeto financiado pela agência
espacial identificou uma movimentação anômala de partículas fantasmas, justificando a teoria de que o Big Bang teria formado dois universos simétricos. O nosso e outro, invertido, onde o tempo passa ao contrário e o Brasil derrotou a Alemanha por 7 a 1 na Copa de 2014.

Quando a notícia foi desmentida, no dia seguinte, já era tarde demais —OK, a existência de um universo paralelo ainda não foi comprovada cientificamente, mas estamos em 2020, comprovações científicas saíram de moda e já não nos impedem de acreditar no que quisermos. Mesmo sem fazer parte do grupo de risco vulnerável às fake news, também fui contaminada.

Posso ter sido reprovada em física no ensino médio, mas sou formada em três temporadas de “Stranger Things” e seis temporadas de “Lost”. Finalmente entendo como se sentem os terraplanistas, os antivax, os cloroquiners e os negacionistas do coronavírus.

O portal para esse antiuniverso se abriu como uma rota de fuga e, quando tudo parece perdido, me pergunto o que estaria aprontando Aleunam, a doce e despreocupada Manuela ao contrário, nesse exato instante. Certamente não está hiperventilando por causa do noticiário enquanto banha um saco de batata palha e discute com seu vizinho bolsonarista pela janela. O universo invertido faz mais sentido do que o nosso.