Coordenadora da Associação de Defesa Etnoambiental - Kanindé e do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia
'Guarani' indígena nos Campos de Piratininga significa nós falando por nós
Orquestra e coro guaranis estão em nova montagem da ópera no Municipal de SP
Já é assinante? Faça seu login
Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:
Oferta Exclusiva
6 meses por R$ 1,90/mês
SOMENTE ESSA SEMANA
ASSINE A FOLHACancele quando quiser
Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.
"O Guarani", de Carlos Gomes, ganhou um novo olhar e estreou nesta sexta-feira (12) no Theatro Municipal de São Paulo, sob direção musical de Roberto Minczuk, concepção de Ailton Krenak, direção cênica de Cibele Forjaz e, em especial, a participação do povo guarani, com sua Orquestra e Coro Guarani do Jaraguá Kyre’y Kuery.
O romance "O Guarani", de José de Alencar, publicado em 1857, foi transformado em ópera e estreou em 1870, em Milão.
Obras literárias estão ligadas ao momento em que foram criadas. Por isso as datas são importantes para entender o pensamento da época, o qual muitas vezes não condiz com outras realidades.
O romance de José de Alencar foi escrito durante o início do romantismo brasileiro, movimento que buscava encontrar fontes de identidade nacional. No entanto, a obra representa uma visão estereotipada e preconceituosa sobre os povos indígenas e não conta verdadeiramente como foi a colonização; expõe apenas o olhar do colonizador sobre nós.
"O Guarani" retrata a história do fidalgo Dom Antônio de Mariz, que sai de Portugal para morar no interior do Rio de Janeiro com sua família. Lá, ergue uma pequena comunidade em torno de sua fazenda e conhece Peri, um indígena que se encanta por sua filha Ceci ao salvá-la de um ataque.
Ailton Krenak agora reconta a obra e corrige, por exemplo, o romance entre um indígena e uma mocinha branca, o que o leva a se tornar católico, por "amor", não por sobrevivência, relembrando um passado genocida e escravocrata.
Trata-se de rever a própria história do Brasil e reparar os erros cometidos contra os povos originários deste país.
A obra de Alencar termina como a metáfora de que o indígena Peri e a portuguesa Ceci seriam o início do Brasil. Entretanto, a verdade é que estávamos aqui nestas terras muito antes da invasão e sofremos com ela até hoje.
Krenak afirma que o "Brasil não existia, o Brasil é uma invenção, e a invenção do Brasil ela nasce exatamente da invasão inicialmente feita pelos portugueses e depois continuada pelos holandeses e depois continuada pelos franceses. Num moto sem parar, que nunca tem fim, e nós estamos sendo invadidos até hoje".
Essa montagem minora o enorme desconhecimento sobre os povos originários, a nossa representatividade na arte e sobre como a arte fala sobre nós. Trata-se de nós falando por nós mesmos.
Pela primeira vez, indígenas da nação guarani, muitos que nunca tiveram a oportunidade de assistir a uma ópera que fala sobre um indígena do seu povo, participarão com sua orquestra e coro, cantando em sua língua.
A peça tem direção de arte de Denilson Baniwa e Simone Mina.
Receba notícias da Folha
Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber
Ativar newsletters