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Do crowdfunding ao mutirão, cidadãos se engajam por praças de SP

Iniciativa do vereador Police Neto (PSD), edital aberto até 12/7 destina verbas a projetos comunitários

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São Paulo

Enquanto caminha pela praça Amadeu Decome, Carolina Tarrio cata do chão uma garrafa vazia. Conversando com a reportagem, mostra as trilhas inicialmente abertas pelos vizinhos e que agora estão sendo pavimentadas pela subprefeitura da Lapa.

 

Tarrio faz parte do Movimento Boa Praça, que organiza mutirões para melhorias no espaço público e faz a mediação com a administração pública para garantir sua manutenção. O engajamento pessoal é o cerne do grupo, nascido em 2008 na zona oeste da capital.

O interesse por garantir a qualidade desses lugares tem se disseminado em toda a cidade, como bem frisa Tarrio. As formas de atuação, porém, variam de acordo com a capacidade de organização de cada vizinhança. 

O que iguala as diferentes formas de mobilização é a ideia de não esperar sentados pelo trabalho do poder público, garantindo que as praças se tornem locais de convívio agradáveis e seguros. 

Apostando que o “protagonismo da sociedade na decisão do investimento público vai virar uma regra num próximo período”, o vereador José Police Neto (PSD) lançou uma chamada cívica para estimular a renovação de praças.

A iniciativa é em parceria com a plataforma Praças (pracas.com.br), que organiza, de forma remunerada, a ação de grupos, atuando desde a mobilização até a obtenção de fundos.

O edital distribuirá R$ 600 mil, vindos de emenda parlamentar, para projetos em cinco subprefeituras da cidade. Neste ano, cada um dos 55 vereadores paulistanos pode indicar ao Executivo propostas no valor de R$ 4 milhões. 

Até 12 de julho, podem se inscrever no concurso projetos nas subprefeituras da Sé, de Pinheiros, Vila Mariana, Santo Amaro —que terão direito a R$ 100 mil cada uma— e Perus —que receberá R$ 200 mil. 

Os projetos devem ser propostos por moradores, conter descrição, desenhos e um orçamento, de R$ 30 mil a R$ 100 mil reais. Os contemplados serão anunciados em 28 de julho. A administração municipal tem de agosto a dezembro para realizar as melhorias. 

 

Para Police, a chamada é uma forma de fomentar que as pessoas saiam do engajamento virtual para “criar comunidade de fato”.

 
O engajamento no mundo real exige do cidadão uma grande dose de boa vontade.

A mobilização é a parte mais difícil do processo, diz a arte-educadora Renata Laurentino, que também faz parte do Boa Praça. “Geralmente as pessoas veem só o mutirão, mas tem um trabalho de adesão de meses.”

Entre outras dificuldades está a própria definição de praça. Em São Paulo, 5.023 logradouros atendem pelo nome —desde áreas verdes de quase 10 mil m², como a Amadeu Decome, a rotatórias ou canteiros de avenida.

A criação de um cadastro que permita entender a definição e as necessidades desses espaços é um desejo do Movimento Boa Praça. 

Reconhecer os problemas poderia ajudar não só novas associações espontâneas de moradores mas também a expansão da atuação do movimento.

Tarrio e Laurentino veem a iniciativa de Police com bons olhos. É uma medida que “democratiza o acesso à verba parlamentar, que ainda é pouco acessada, vai muito para o nicho do vereador”, diz a primeira.

Tarrio pondera, porém, que nem sempre a população tem tanto poder de influir quando o recurso vem de emendas. Ela defende um instrumento legal que já existe e permite a mobilização dos moradores. 

Aprovada em 2015, a Lei de Gestão Participativa de Praças (lei 16.212/2015), que estabelece entre outros mecanismos comitês de vizinhos responsáveis pelo espaço, não foi ainda regulamentada pelo Executivo, o que dificulta sua aplicação. 

Na opinião de Tarrio, a iniciativa mais inócua, em termos de qualificação dos espaços, é o mecanismo de adoção de praças da Prefeitura de São Paulo. 

Na adoção, uma empresa ou pessoa física assina um termo se responsabilizando pelo espaço e em troca divulga nele seu nome. O modelo vige em cerca de 20% das praças da cidade.

“Corta a graminha, coloca a plaquinha, e tudo o mais fica sem acontecer”, resume.

A adoção é o mecanismo utilizado pela AME Jardins. A associação de moradores adotou 9 praças e 12 rotatórias no quadrilátero de cerca de 5 km² em que atua há quase 12 anos. 

Daniela Seibel, presidente da AME, estima que a associação empregue cerca de 60% de sua receita na manutenção dessas áreas. 

“Nosso intuito nessa conservação é que elas cada vez possam ser mais utilizadas. Tem praças muito descuidadas, um pouco por falta de educação e civilidade.”

A AME agora está tocando a reforma completa da praça Gastão Vidigal. Um morador doou o projeto, e a associação, um levantamento planialtimétrico, necessário para refazer todo o pavimento e mitigar problemas de permeabilidade. 

A execução virá de emenda parlamentar da vereadora Janaína Lima (Novo) —a estimativa é empregar cerca de R$ 400 mil.

A AME não inscreveu projeto na chamada cívica de Police. “Tinha que apresentar todo o projeto e a gente não teve braço para isso”, diz Seibel. Embora precise de recursos para a praça San Martin, preferiu tentar levantá-los junto a moradores.

Para a arquiteta Luciana Royer, professora de planejamento urbano na FAU-USP,  a chamada cívica é uma “articulação muito importante”, com um “desenho diferente” para distribuir os recursos orçamentários. 

Mas, diz ela, o engajamento da população, em qualquer medida, é necessário para a boa manutenção das praças, como de outros espaços públicos.

“O que a gente vê em em políticas de construção de infraestrutura é que há uma relação direta entre o engajamento e a sustentabilidade, a manutenção daquele espaço e a sociabilidade que se cria em torno dele.”

Carolina Tarrio resume a questão. Sempre que se pergunta de quem é uma praça, conta, as respostas que vêm se dividem em “de ninguém” e “de todo mundo”. "Queria que viesse 'essa praça é minha'." 

Erramos: o texto foi alterado

Diferentemente do informado, a associação AME Jardins atua em uma área de 5,1 km², e não 100 km². O texto foi corrigido.

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