Siga a folha

Descrição de chapéu
Daniel Guanaes

O que pastores estressados nos ensinam sobre saúde mental

Dar atenção aos sintomas quando não há mais como ignorá-los é custoso e, às vezes, irreversível

Assinantes podem enviar 7 artigos por dia com acesso livre

ASSINE ou FAÇA LOGIN

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Daniel Guanaes

PhD em teologia pela Universidade de Aberdeen, é pastor presbiteriano, psicólogo e líder do movimento Pastores pela Vida (Visão Mundial)

Pastores estão entre as pessoas mais estressadas que eu conheço —e eu sei disso por ser psicólogo, além de pastor. O que, então, a sociedade pode aprender sobre saúde mental a partir de como vivem, os erros que cometem, e como se tratam (ou não se tratam) esses líderes religiosos?

Pastores trabalham a semana inteira, inclusive nos finais de semana. Em um dia comum, acolhem vítimas de violência, ajudam casais atravessando crises de casamento e orientam pais com problemas na educação dos filhos. Isso sem falar nos sepultamentos, nas visitas hospitalares e nas ligações a qualquer hora para socorrer alguém da sua congregação.

O período da pandemia foi particularmente desafiador para nós. Um amigo sepultou cinco pessoas de uma mesma família nesse período. Ele não foi o único.

Apesar da rotina estressante, poucos pastores fazem terapia, vão ao psiquiatra ou têm uma vida pautada por hábitos saudáveis. E não é porque ignoram a importância do tratamento. É pelo medo de como isso pode repercutir entre os fiéis. "Claro que precisam de terapia", me disse certa vez Josman França, pastor da Assembleia de Deus. "Só que não pega bem um líder dizer que vai ao psicólogo".

Essa ideia de que pastores não podem se expor é arrogante. Já vi muitos líderes religiosos com a vida destruída por causa da forma como se dedicaram à igreja. Levaram a sério o "ame o próximo", mas negligenciaram o "como a si mesmo".

Em nome de aliviar o sofrimento alheio, com o tempo muitos de nós desenvolvem estafa, ansiedade, irritabilidade, depressão, fazem uso abusivo de remédios, além de negligenciar cuidados com alimentação, descanso e exercícios. E essa não é uma atenção que apenas os pastores devem ter.

Lembro de quando um senhor que aparentava ter 60 anos de idade veio ao meu consultório, sentou no sofá e chorou ininterruptamente por 40 minutos. Ao término da catarse, me disse: "Perdão, doutor. Eu sou policial e não posso chorar lá fora. Eu precisava vir aqui desabafar".

Na igreja eu também converso com adultos cansados, às vezes com sintomas parecidos aos de pastores que acompanho. Carla, uma engenheira de 55 anos, foi diagnosticada com a síndrome do cuidador. Desde que sua mãe, uma idosa com demência, precisou de atenção especial, ela apresentou um quadro de tristeza profunda, estado de vigilância ininterrupta e ansiedade.

A identificação desses quadros de estresse nem sempre é simples, porque na maioria das vezes as tensões são provocadas pelo cotidiano das pessoas. Muitos pensam que são apenas questões do dia a dia que vão passar, e acabam não percebendo o acúmulo de carga emocional a que estão submetidos.

No geral, os homens resistem mais do que as mulheres até pedirem ajuda. A vergonha é um dos principais fatores para isso. É como se buscar o auxílio de um profissional de saúde mental revelasse uma fragilidade que os homens não gostam de admitir publicamente.

Esse preconceito agrava quadros e retarda a melhora da saúde emocional das pessoas. Dar atenção aos sintomas quando não há mais como ignorá-los é custoso, e às vezes irreversível.

O cuidado da saúde mental precisa ser encarado de forma preventiva, que é algo que as gerações mais jovens estão aprendendo a fazer. Continuarão enfrentando estresse, já que os seus fatores causadores não deixarão de existir. Mas provavelmente saberão superá-los com mais facilidade.

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas