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Palavra Aberta

O que a Finlândia pode nos ensinar sobre 'fake news'

País nórdico investe em educação midiática desde o ensino básico

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Quando se trata do reconhecimento público da qualidade de um sistema educacional, as escolas finlandesas figuram há anos no topo das discussões pedagógicas e rankings de avaliação de desempenho. Tida como um modelo a ser seguido, pauta de inúmeras reportagens na imprensa nacional e internacional e tema de estudos acadêmicos mundo afora, tanto na educação como nas políticas públicas, a Finlândia tem resultados sólidos no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa).

Mas, para além das ótimas e longevas notas em leitura, matemática e ciências, áreas avaliadas pelo exame da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o país nórdico tem se destacado por outro tipo de ação educacional: o combate à desinformação.

O título de "nação imune às 'fake news'" difundido na mídia estrangeira não foi dado à toa. Um relatório divulgado em 2019 mostra que os finlandeses são o povo mais resistente a crer em boatos e mentiras espalhados nas plataformas digitais. O país ficou em primeiro lugar entre 35 países em um estudo que mediu a resiliência ao fenômeno pós-verdade. O índice, denominado Media Literacy Index, é medido pelo Open Society Institute de Sofia (Bulgária). Logo atrás da Finlândia estão Dinamarca, Holanda, Suécia e Estônia.

Crianças de oito anos em sala de aula na Finlândia - Olivier Morin - 17.ago.2005/AFP

Vale ressaltar também que a Finlândia aparece em outro ranking de prestígio: o da liberdade de imprensa. Em lista divulgada no ano passado pela organização sem fins lucrativos Repórteres Sem Fronteiras, o país está em segundo lugar, logo após a vizinha Noruega. O Brasil ocupa a 105ª posição. 

Mais recentemente, uma reportagem do The Guardian publicada em janeiro deste ano mostrou como a educação midiática foi introduzida no currículo das escolas finlandesas desde 2016, privilegiando o pensamento crítico e o contato com informações produzidas nas mais diversas plataformas. 

Em entrevista ao jornal britânico, Jussi Toivanen, responsável pela comunicação do escritório da primeira-ministra Sanna Marin, disse que a desinformação tem como “objetivo corroer os valores e normas” finlandeses, destruindo “a confiança nas instituições que mantêm a sociedade unida”.

Sua fala vai ao encontro do que propõe o Ministério da Educação e Cultura finlandês ao instituir uma nova política nacional de educação midiática. De acordo com a pasta, a iniciativa é intersetorial, pois conta com o apoio do Instituto Nacional do Audiovisual do país, e foi baseada em evidências diversas, como uma pesquisa online com a participação da população e entrevistas com pesquisadores das universidades. 

Com isso, o objetivo é “oferecer educação midiática abrangente, de alta qualidade e sistemática”, uma vez que “um alto nível de conhecimento da mídia promove uma vida boa e significativa e é uma habilidade cívica que pertence a todos” os cidadãos finlandeses.

Por aqui, o quadro é diametralmente oposto, não só nos dados do Pisa como na relação dos brasileiros com a disseminação de conteúdo nefasto nas redes sociais. Outro estudo, com metodologia e amostra diferentes, colocou o Brasil no mais alto lugar do pódio entre os países que mais creem em boatos e mentiras. Segundo o Instituto Ipsos, em relatório publicado em 2018, 62% da população já acreditou em uma informação falsa. 

Mas há caminhos já constituídos. O Brasil começa a dar seus primeiros passos na direção de implantar uma política nacional consistente que trate desse tema. Nesse contexto, é necessário destacar a relevância e a urgência da implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para o sistema educacional brasileiro. 

A base tem uma sólida ênfase em cultura digital como uma das competências primordiais a serem desenvolvidas em crianças e jovens do ensino fundamental e médio. Ademais, o campo jornalístico-midiático ocupa uma boa parte dos conhecimentos em língua portuguesa que os alunos e alunas devem adquirir ao longo da trajetória escolar, sabendo diferenciar gêneros midiáticos (como propagandas, reportagens etc), consumir informação com responsabilidade e participar do ambiente informacional de maneira ética.

Tudo isso deve, é claro, contar com apoio das redes de ensino, que devem atuar na formação dos professores e no fornecimento de recursos e materiais que permitam o trabalho pedagógico correspondente ao que demanda a BNCC.

É claro que é sempre bastante raso –e perigoso– ranquear sistemas de ensino e comparar países, uma vez que, de partida, suas populações apresentam muitas diferenças em aspectos socioeconômicos e culturais. Por outro lado, é importante conhecer iniciativas que demonstram evidências e resultados, especialmente se sustentadas ao longo do tempo, como ocorre na Finlândia.  

Educação de qualidade, imprensa livre e conscientização sobre a desinformação não podem ser expressões vagas. São elementos fundamentais para uma democracia forte, e são indissociáveis em um mundo conectado, dentro e fora das escolas.  

Mariana Mandelli

Coordenadora de comunicação do Instituto Palavra Aberta

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