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No Quadrado do Torcedor: meu dia de francês na arquibancada olímpica

André Fontenelle relata como foi assistir ao ciclismo de estrada em área sorteada

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Paris

"Parabéns, você foi selecionado para participar da arquibancada mais festiva e com mais atmosfera de todas durante os Jogos: o Quadrado dos Torcedores."

Eu nem me lembrava mais que, no longínquo mês de dezembro de 2023, tinha respondido a um e-mail propondo participar do sorteio para "uma zona festiva no coração das arquibancadas, posicionada e pensada para empurrar os atletas rumo à vitória, com os espectadores mais ferventes, prontos a dar tudo de si e um clima enlouquecido."

O Quadrado dos Torcedores! Eu e mais dois convidados teríamos o privilégio de ver bem de perto prova de ciclismo de estrada, na esplanada do Trocadéro, em frente à Torre Eiffel, no dia 3 de agosto.

A prova de ciclismo de estrada, em Paris - Reuters

O ciclismo é uma paixão nacional na França, junto com o futebol e o rúgbi. O Tour de France, maior competição do esporte, para o país todo mês de julho.

A prova olímpica de estrada, portanto, prometia ser um dos pontos altos das Olimpíadas.

Na manhã do grande dia, saímos de casa, eu, esposa e filha, com camisas da França —afinal, era preciso estar a caráter—, imaginando que estaríamos misturados a centenas de franceses em delírio, agitando bandeiras tricolores em uma arquibancada privilegiada.

Expectativa versus réalité.

Eu devia ter desconfiado, pois já havia um precedente. Também ganhei em um sorteio quatro ingressos para a cerimônia de abertura dos Jogos.

Ficamos de pé, encharcados de chuva, divisando de longe, pela fresta de uma grade, o desfile de barcos no rio Sena.

Desta vez, pelo menos, fazia sol. Chegamos cedo ao Trocadéro (mesmo palco da parte final da cerimônia de abertura). Perguntamos ao primeiro voluntário: S'il vous plaît, onde fica o Quadrado dos Torcedores?

Perguntamos ao segundo. Ao terceiro. Todos faziam expressão de estupor. Je ne sais pas. Deve ser ali. Nunca ouvi falar. Não faço a menor ideia. Como é o nome? Pergunte àquele ali. Já tentaram ali?

Supostamente capacitados para orientar o público, os voluntários simplesmente desconheciam o tal Quadrado. Subimos à arquibancada para tentar localizá-lo. Nem sinal.

Depois de rodar bastante, acabamos topando com uma faixa: "Carré des Supporters". Ficava bem em cima da ponte de l'Alma, que liga a Torre Eiffel ao Trocadéro.

O Quadrado dos Torcedores não era um quadrado, nem tinha muitos torcedores. Era uma faixa estreita de uns 100 metros de extensão, ao longo da qual se espalhavam uns 50 torcedores, das mais diferentes nacionalidades.

Não era festivo, não tinha espectadores ferventes nem clima enlouquecido. A única vantagem era ficar bem perto dos ciclistas, mas nada diferente de uma largada de etapa do Tour de France.

O voluntário Gauthier Laborde nos entregou bandeiras da França e leques de papelão, daqueles usados para bater e fazer barulho. Tentou nos animar. "Contamos com vocês! Veio pouca gente para a largada."

Fantasiado de batata frita, petisco nacional em seu país, o belga Olivier Dusart tirava selfies com quem lhe pedia. "Vim ver os belgas, eles têm chance de ouro", explicou.

Debruçados na grade, assistimos aos ciclistas se posicionarem para a largada. Passou o representante do Brasil na prova, Vinícius Costa.

Minha filha acenou para ele. Ele acenou de volta, provavelmente sem entender a atenção daquela moça com a camisa da França.

Outro competidor, o francês Christophe Laporte, parou ao nosso lado: vinha falar com a companheira, Marion.

Depois que se despediram, ela ficou debatendo com a família onde seria o almoço. Só voltariam para a chegada.

Ao contrário do que costuma ocorrer com ingressos esportivos, em que "toda saída é definitiva", esse permitia entrar e sair quantas vezes desejado. Afinal, os ciclistas só voltariam ao Trocadéro dali a seis horas, para a chegada.

Chegou a hora da largada. Quem já assistiu in loco a uma etapa do Tour de France sabe como funciona. Depois de horas à beira da pista, esperando, o torcedor vê o pelotão passar em poucos segundos, como um borrão. Parece sem sentido, e é.

E assim terminou minha experiência no Quadrado do Torcedor. Nem eu nem minha mulher podíamos esperar a chegada. Minha filha saiu e voltou. Contou que a arquibancada estava bem mais animada. Sorte dela.

Olivier, o da fantasia de batata frita, tinha razão. O ouro ficou com o ídolo belga Remco Evenepoel. Na cerimônia do pódio, depois do hino da Bélgica, os franceses entoaram a Marselhesa à capela.

Tomara que Marion tenha voltado: Laporte, seu companheiro, acabou conquistando a medalha de bronze.

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