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Eduardo Escorel relê 1968 em diário de irmã no É Tudo Verdade

Impressões e imagens de arquivo guiam jornada que revela como o ano que não terminou segue ecoando hoje

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1968, Um Ano na Vida

Avaliação: Bom
  • Quando: São Paulo: sáb. (15), às 18h, no Cine Marquise; Rio de Janeiro: sex. (14), às 17h, no Net Botafogo
  • Classificação: 14 anos
  • Produção: Brasil, 2023
  • Direção: Eduardo Escorel

O ano de 1968 é um que não terminou, na concepção de Zuenir Ventura. Mal tinha começado 1968, quando Silvia Escorel volta ao Brasil de uma longa viagem, disposta a sedimentar seu casamento.

Silvia ainda não havia entrado de fato naquele ano. O marido já. O casamento se desfaz, para desgosto do pai. A palavra para casamentos desfeitos, na época, era desquite. E era um tanto vergonhosa.

Cena do documentário '1968, Um Ano na Vida', de Eduardo Escorel - Divulgação

Em suma, Silvia entra de cabeça em 1968, querendo ou não. É seu diário daquele ano que alimentará este filme de Eduardo Escorel, seu irmão um pouco mais novo. Ela chega àquela ano um tanto pasma com o que vê e com o que o futuro reserva a ela.

Esse caráter surpreendente embala o filme, pois o espectador vai reencontrando —ou encontrando— as vertigens daquele momento —movimento estudantil no Rio de Janeiro, contracultura, intensificação da ditadura, rebelião em Paris, invasão de Praga pelos russos, Hélio Oiticica, Glauber Rocha e Rogério Sganzerla, as novas amizades.

Silvia deixa o cabelo crescer. Adeus à caretice. O gosto pelas colagens, desenvolvido em pleno diário, onde anota e recorta as suas perplexidades parece que se acentua.

O assassinato de Martin Luther King, golpe profundo em quem esperava um mundo melhor. O de Robert Kennedy, outro golpe. Parece espantoso que um diário pode revelar sobre uma era e a própria Silvia. O diário —com o significativo nome de "Lost", perdida— é escrito em inglês. Não por pedantismo. Essa filha de diplomata foi educada no exterior.

Eduardo Escorel navega nas águas tranquilas do filme de arquivo. Sua paixão nos últimos anos é a memória. Sincronizar um texto a uma imagem de época. No caso, os arquivos ajudam. A excessiva preocupação em sincronizar texto e imagem prejudica um pouco o filme, mas é assim —a verossimilhança parece ser outra paixão profunda do autor.

Por vezes, ela imprime no filme uma monotonia que os fatos desmentem. Em compensação, não há abuso da música, como no filme sobre a ditadura de Getúlio Vargas.

O ano de 1968 é visto pelos olhos de uma jovem que não se pode chamar de burguesa nem pequeno burguesa. O olhar da jovem da elite intelectual é revelador e inquietante. As coisas não param de acontecer —o Vietnã, o black power etc.

Podemos nos perguntar onde estarão hoje os ferozes estudantes esquerdistas da Paris de 1968. Fora os que já morreram, é claro. Em quem votarão? Em Macron, em Le Pen?

E no Brasil? O canto que irrompe não nos é estranho. O povo unido jamais será vencido, diziam estudantes, intelectuais, artistas —isso que chamamos de sociedade civil.

Essa que existe ao lado do exército, esse estado dentro do Estado brasileiro, representado aqui pelos cavalos e cavaleiros que reprimem as passeatas. Mas onde está o povo desse povo unido? Não está lá. Está, provavelmente, na greve de Osasco, mas ali a sociedade civil ficava de fora.

O ano de 1968 ainda não terminou. Sempre há algo mais a descobrir nesse baú interminável, e sempre que se mexe nele algo aparece. Como a irredutível distância entre a sociedade civil e os pobres, os negros. Tudo no diário de Silvia e no filme de Eduardo Escorel é atravessado por essa dilaceração.

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