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Alexander W. A. Kellner

O Museu Nacional vive

Monumento não pode servir de centro turístico de veneração à família imperial

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Alexander W. A. Kellner

Diretor do Museu Nacional

Fomos surpreendidos com reportagem da Folha (“Governo quer transformar Museu Nacional em Palácio Imperial e deixar acervo fora”; 27/3) revelando “reuniões” para discutir o futuro do paço de São Cristóvão, que há quase 130 anos é a sede do Museu Nacional da UFRJ.

De acordo com a reportagem, redutos monarquistas em diferentes órgãos do governo, particularmente no Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), querem alienar o palácio da UFRJ, procurando descaracterizar a vocação científica e cultural do monumento para servir de centro turístico de veneração à família imperial.

Todo o procedimento relatado no texto causa espécie, não apenas pela discussão em si, um tanto anacrônica, mas por estar sendo travada com exclusão da UFRJ e do Museu Nacional. É importante frisar que a nossa postura sempre tem sido de total transparência. Recentemente houve reuniões separadas com o Ministério da Educação e com a presidência do Iphan (Brasília), onde foi apresentada a evolução do projeto, com explicitação de apoio dos presentes, o que aumenta o estranhamento do envolvimento dessas instituições no contexto da reportagem.

O Museu Nacional foi fundado em 1818 por D. João 6º, cujo decreto real deixava a sua finalidade bem clara já nas primeiras palavras: “Querendo propagar os conhecimentos e estudos das ciências naturais do Brasil...”. Os imperadores e imperatrizes que se seguiram foram grandes incentivadores da ciência, cultivando no paço de São Cristóvão um museu particular de história natural e antropologia. D. Pedro 2º reuniu em seu “Museu do Imperador” coleções de plantas e minerais herdadas pela Imperatriz Leopoldina, coleções arqueológicas, como peças de Herculano e Pompeia feitas sob os auspícios da imperatriz Teresa Cristina, a múmia egípcia Sha-Amun-Em-Su, entre outros itens.

Após a Proclamação da República, o palácio serviu como local da primeira Constituinte republicana, e, em 1892, recebeu o museu, devido ao interesse institucional pelo “Museu do Imperador”. A proposta foi manter e ampliar o espaço de ciências que ali existia. Em 1946, foi incorporado à UFRJ, o que proporcionou novo desenvolvimento, resultando em um aumento de público para 350 mil visitantes por ano, quando a população brasileira era um terço da atual.

Porém, o contínuo estrangulamento financeiro ao longo de décadas resultou na maior tragédia científica e cultural do país. Por ironia, justamente no ano em que o Museu Nacional completava o seu bicentenário e havia obtido a confirmação de uma dotação de R$ 21,3 milhões do BNDES para diversas melhorias, incluindo segurança.

O dia 2 de setembro de 2018 ficará marcado para sempre na memória. Em face à comoção mundial, dias após o incêndio uma comissão da Unesco chegou ao Brasil para ajudar. A Alemanha, de imediato, concedeu aporte financeiro para o resgate das peças sob os escombros. Ajuda concreta veio também de instituições de Reino Unido, EUA, Portugal e França. Sem contar as cartas de apoio de museus de todo o mundo.

No âmbito do projeto Museu Nacional Vive, que abriga as iniciativas de reconstrução institucional, temos que destacar a fundamental ajuda de MEC, Unesco, deputados federais do Rio de Janeiro, Alerj, SPU-RJ, Instituto Cultural Vale, Bradesco e BNDES, que se mantêm firmes no projeto. Outras parecerias estão a caminho.

Fica claro que o palácio é inseparável do Museu Nacional/UFRJ e faz parte da memória afetiva do povo brasileiro como museu de história natural. Assim, esperamos poder voltar a contar com o Iphan, que até meados do ano passado foi um importante parceiro do museu, atuando com celeridade, sem o véu de ideologias ou tentativas de obstrução. O mesmo vale para o Ministério de Relações Exteriores, que em 2018 se empenhou em auxiliar nas ações com outros países.

Finalizando, cabe ressaltar que o projeto de reconstrução é vencedor e resultará em um espaço de destaque que não se limita apenas ao turismo. É uma oportunidade que temos para ter um museu de história natural e antropologia inovador, sustentável e acessível, que promova a valorização do patrimônio científico e cultural e que, pelo olhar da ciência, convide à reflexão sobre o mundo que nos cerca, ao mesmo tempo em que nos leve a sonhar...

Tudo isso sem perder a sua importante vertente histórica, que nos é tão cara e que será valorizada nas novas exposições da instituição. O Museu Nacional vive!

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