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Descrição de chapéu Eleições 2022

Eduardo Leite diz que PSDB não pode se acorrentar às prévias e nega ter Aécio como guia

Tucano defende que partido discuta alternativa a Bolsonaro-Lula até mesmo fora do PSDB

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Porto Alegre

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), está de saída do cargo com papel ainda indefinido para as eleições deste ano.

Diz, porém, ser legítimo que quem já foi prefeito ou governador tenha aspiração de ter protagonismo e disputar a Presidência da República.

Embora negue virada de mesa na disputa interna do PSDB em que foi derrotado há quatro meses, Leite afirma que ​muitas coisas mudaram no cenário desde então e que "não faz sentido ficar acorrentados às prévias" que definiram a pré-candidatura do governador paulista, João Doria.

O tucano Eduardo Leite - Felipe Dalla Valle/Palácio Piratini

Prestes a deixar o cargo, Leite se divide entre entrevistas sobre a renúncia ao mandato e a permanência no PSDB, agendas oficiais e empacotar a mudança de saída do Palácio Piratini, sede do governo gaúcho, onde vive desde 2019 com Chica e Bento, cães da raça schnauzer.

O tucano foi o primeiro governador a morar no prédio centenário, abrigo da Campanha da Legalidade de Brizola, desde a saída do petista Olívio Dutra (1999-2003). Agora, ele quer alugar um apartamento na capital gaúcha e se dividir entre São Paulo, onde vive o namorado, Thalis Bolzan, e viagens para falar sobre as eleições.

O anúncio da renúncia, depois de meses de flerte com o PSD de Gilberto Kassab, foi feito na última segunda-feira (28), em uma entrevista a jornalistas com cerca de duas horas de duração, onde apareceu ladeado por tucanos gaúchos.

Ao encerrar a novela, porém, Leite deixou em aberto seus próximos passos —candidatura à Presidência, ao Senado ou mesmo reeleição no RS seguem na mesa.

Quando recebeu a Folha em uma das salas do palácio, na manhã de quarta-feira (30), Leite parecia animado, mas ainda esquivando respostas definitivas sobre qual candidatura deve abraçar. A entrevista ocorreu antes de Doria dizer a aliados que estava desistindo da disputa ao Planalto.

O que pesou na decisão para ficar no PSDB e recusar o PSD, depois de meses de conversa? A gente tem uma boa parceria com o PSD em nível local, isso sempre nos manteve próximos e aproximou o presidente nacional, Kassab.

Eu tenho 20 anos de história no PSDB, fui prefeito, sou governador pelo PSDB e entendo que a gente precisa trabalhar para criar um caminho que tenha viabilidade para enfrentar essa polarização que está posta entre o atual e o ex-presidente. Não quero simplesmente ser candidato a presidente, eu quero ajudar a construir uma alternativa.

Muita gente entende que meu nome deva liderar um projeto, mas, se for para liderar, eu entendo que deva ser buscando convergência com estes atores políticos que já estão aí colocados e não dispersando em mais candidaturas.

O senhor disse que a renúncia abre várias possibilidades e não tira nenhuma, o que significa que reeleição, Senado ou Presidência estão na mesa. O que falta para a definição? Me realizo participando da atividade política, ajudando a construir caminhos e me sinto preparado para assumir o papel de liderança. Mas não tenho obsessão por isso. É legítimo que cada pessoa tenha uma aspiração, que deseje ter protagonismo, é compreensível que quem foi prefeito, governador, até projete ser presidente da República. Essa definição, de qual papel vou ocupar neste processo eleitoral, será feita a partir dessas conversas.

Então, falta a convenção? A convenção vai ser o ato formal que vai consolidar o que tivermos politicamente ajustado anteriormente. Tem muita coisa aí, abril, maio, junho, para nessas discussões, encontros, buscarmos a convergência em torno de uma candidatura —pode, inclusive, não ser do PSDB.

Se as aspirações pessoais não devem estar acima do interesse de viabilizar uma alternativa, a aspiração partidária também não pode. Se houver um nome em outro partido, desse campo político, que tenha melhor viabilidade eleitoral, acho que temos obrigação de entender isso e ajudar a construir em torno desse nome.

O senhor vê alguns nomes possíveis? Posso citar o nome da senadora Simone Tebet (MDB-MS) como um nome importante, uma senadora que mostrou posição, capacidade política, é muito legítimo que ela se apresente.

O senhor não considera uma tentativa de virada de mesa e de tapetão perder as prévias e ainda assim buscar a vaga de candidato do PSDB? O próprio governador João Doria disse, em fevereiro, como eu falei na coletiva, que estará lá adiante, se for o caso, disposto a apoiar. Isso mostra a abertura dele, a abertura que todos têm que ter.

As prévias são válidas, houve um vitorioso delas. Faz quatro meses que elas aconteceram, de lá para cá temos alterações na realidade da vida dos brasileiros, por conta de uma inflação persistente, causada até por conta de uma guerra nesse meio tempo. Tantas coisas mudam no cenário, não faz sentido ficarmos acorrentados às prévias, embora elas sejam legítimas e sejam uma referência, sem dúvida nenhuma, que dão a pré-candidatura ao governador João Doria. Agora, ele mesmo já disse da sua abertura para entendimento diverso.

A fala que o senhor cita é de fevereiro, há três dias ele falou em golpe. Ninguém está tentando reverter as prévias, dizer que não valeram ou que foram fraudadas. O que se está dizendo é: precisamos manter abertura e disposição para buscar convergência. O PSDB está sentado com outros partidos e discutindo, inclusive, se for o caso, apoiar outro candidato. Não faz sentido que para dentro do próprio partido não houvesse essa mesma disposição.

FHC, liderança importante do partido, se manifestou publicamente dizendo que as prévias deveriam ser respeitadas. Total acordo com o presidente, eu respeito as prévias. Todos estamos respeitando.

Mas reabrir a discussão não as coloca em xeque? Não, porque se há uma disposição do próprio candidato de discutir alternativas eventualmente, não tem deslegitimação. Até porque, há uma convenção, lá na frente, que tem que homologá-las ou não.

Tenho confiança que as discussões políticas vão se encarregar nas próximas semanas e meses ou de confirmar que há viabilidade na candidatura escolhida nas prévias ou conduzir para outro caminho, que pode ser, inclusive, uma candidatura fora do PSDB.

O senhor disse que teve uma conversa com Doria, por telefone, antes de tornar pública sua decisão pela renúncia. Como foi essa conversa? Uma conversa amistosa. Eu disse a ele: João, estou comunicando a minha renúncia e vou me manter no PSDB, porque não vou dispersar energia. Se eu quisesse simplesmente ser candidato a presidente, me foi oferecido um caminho seguro, firme, mas quero ajudar a construir uma saída para o país. Estou me colocando à disposição, justamente porque a renúncia me abre muitas possibilidades e não me tira nenhuma. Falei essa frase para ele, e meu sentimento é de colaborar.

E o que o senhor ouviu dele? Que tem o mesmo sentimento. Ele compreendeu, a conversa foi amistosa. Eu não estou indo contra ninguém, estou me apresentando e me deixando em condição de disponibilidade. O governador pode falar pelas palavras dele.

Luciano Huck o visitou alguns dias antes de o senhor anunciar sua decisão de sair do governo e ficar no PSDB. Essa conversa pesou na decisão? O Luciano e o Paulo Hartung estiveram juntos aqui me visitando, jantaram comigo. São dois brasileiros muito interessados em ajudar a viabilizar uma alternativa para o país, eles têm participação nas discussões, nos movimentos.

Hartung tem sua trajetória como político, como senador, como governador [do ES], uma referência em gestão e na capacidade política. E o Luciano, embora não tenha escolhido a atuação político-partidária, tem uma participação em movimentos sociais, em movimentos de renovação política, muito importante. Eu considero duas vozes a serem ouvidas. Foi uma conversa de reflexão sobre caminhos, sobre alternativas, próximos passos.

O senhor tem ao seu lado tucanos de Minas Gerais, como o deputado Aécio Neves. O senhor age guiado por conselhos do deputado? Eu tenho uma trajetória política, fui vereador, prefeito, governador, posso ser avaliado pela minha própria trajetória. Eu sou guiado pelas minhas convicções, minhas crenças, meus ideais, não preciso de outros guias e, como agente político, um formador de grupo, ouço conselhos, converso com quem tem algo a dizer.

O deputado Aécio Neves tem uma trajetória no partido, tem sua atuação e é um dos integrantes que entende que eu poderia assumir um papel de liderança, entre tantos outros que têm o mesmo entendimento.

Estender essa divisão não pode rachar ainda mais um partido que aparece enfraquecido nas pesquisas? Negar a conversa sobre um problema na empresa, na família, não resolve o problema. Melhor estender uma conversa, para ter bem resolvida uma situação, do que fingir que não existe. Existe uma situação que exige a discussão sobre a viabilidade de candidaturas e a gente vai usar toda a pista para conversar sobre isso.

O mais importante é a gente ter uma candidatura viável, que ajude a sair dessa polarização entre Lula e Bolsonaro.

Até a definição da candidatura entre MDB, PSDB e União Brasil, o senhor será uma sombra de Doria, candidato chancelado nas prévias? Como vai se posicionar? Um agente político, ex-prefeito, ex-governador que vai estar buscando mobilizar as pessoas para estarem unidas em torno de um projeto alternativo, que eu tenho disposição de liderar se houver esse entendimento. E, se for o caso, ser liderado por outra pessoa que tenha essa capacidade. Então, não tem sombra ou qualquer outra coisa. Eu usarei o capital político que acumulei em favor de gerar entusiasmo e motivação em torno de uma alternativa para o país.

O que o senhor acha que pesa mais no seu nome, em comparação a Doria, para ser opção? Capacidade política e de gestão ambos demonstraram ter, o que precisa ser discutido agora é capacidade eleitoral. Não só do candidato, por suas qualidades, mas das circunstâncias. Geraldo Alckmin, em 2006, candidato à Presidência, fez 40% dos votos no primeiro turno. Em 2018, o mesmo Alckmin fez 4%. Não mudou o Alckmin, mas o cenário, o contexto, o humor, o sentimento da população.

Doria, quando prefeito de São Paulo, no momento que falavam do nome dele como alternativa para presidente, tinha 12%, 13% de intenção de votos. Era outra circunstância, outro momento, hoje as pesquisas dão a ele percentuais mais baixos. Mudou o sentimento e é isso que a gente precisa entender, o que a população está procurando.

O senhor acha que seu nome é mais viável no sentido rejeição? Do ponto de vista eleitoral, o que as pesquisas indicam da posição de cada um, não dá para desprezar que o grau de desconhecimento nosso é mais baixo, porque, afinal, meu estado tem quatro vezes menos população que o estado de São Paulo, e uma rejeição menor.

Os níveis de conhecimento sobre um e outro são muito díspares, a rejeição é menor do nosso lado e estamos no mesmo patamar de intenção de votos. Mas não é só sobre isso. A gente vai sentar, como eu disse, temos tempo para que o sentimento e o entendimento de cada um sejam colocados para construir convergência.

FHC já disse que votaria em Lula contra Bolsonaro. O senhor votou no atual presidente em 2018, já avaliou como um erro. Como se decide entre os dois hoje? Esse vai ser meu trabalho nessas eleições, evitar que tenhamos uma repetição daquele segundo turno. Temos que buscar um caminho melhor e vejo que as pesquisas indicam isso, a gente tem a possibilidade de furar essa polarização e levar outra candidatura ao segundo turno.

Não cabe emitir uma opinião sobre um segundo turno hipotético, quando não sabemos o que as candidaturas vão colocar, que Lula vem, com que agenda, que sentimento embala essa candidatura, nada disso está claro para antecipar qualquer opinião.

O senhor votaria em Bolsonaro novamente? Não sei como as candidaturas vão se apresentar, mas seguramente Bolsonaro se mostra um problema para o Brasil. Nem por isso Lula é melhor.

Se restar a questão local, seu nome não sendo escolhido nacionalmente, como o senhor disse na entrevista da renúncia, o senhor estaria voltando atrás em uma visão que defende há anos, que a reeleição é um problema do sistema político. Como justificar isso ao eleitor? Eu vou trabalhar pela reeleição do projeto, temos bons nomes para isso, a começar pelo vice-governador, Ranolfo Vieira Júnior (PSDB), que vai assumir o governo, tem capacidade política para dar sequência a agenda que implementamos aqui. O entendimento sobre qual será a candidatura será tomado pelo grupo político, pelos partidos…

Mas no caso de o senhor ser o nome, como trabalhará isso com o eleitorado? Se lá na frente houver entendimento diverso, de partidos inclusive que estiveram conosco na Assembleia Legislativa, por uma situação absolutamente excepcional, isso será avaliado. Mas tenho confiança que não será necessário, que vamos garantir a continuidade do projeto sob outra liderança, como eu pude fazer em Pelotas.

Qual o balanço que o senhor faz de seu governo e o que faltou fazer? O RS que assumimos tinha salários atrasados, atrasos em pagamentos para fornecedores e prestadores de serviços, só na saúde R$ 1,1 bilhão. Se acumulavam dívidas, impostos aumentados e mesmo assim o estado não conseguia pagar as contas. O RS que estamos entregando tem as contas em dia, pagamos dívidas deixadas por governos anteriores, reduzimos impostos, voltamos a praticar as menores alíquotas de ICMS, e abrimos o maior volume de investimentos da história recente do estado.

Nosso déficit previdenciário do ano passado teria sido de R$ 15 bilhões, sem a reforma, e ficou em R$ 9 bilhões. O único estado que fez reforma administrativa, revisando benefícios do servidor público, como vantagens temporais e outras que pressionavam nossa despesa com a folha, que caiu.

Acho que dentro da agenda que se propunha e da agenda que tínhamos capacidade de fazer num ambiente como a pandemia, não posso dizer que tenha faltado, mas há muito por fazer.

O que vem a seguir? Tem planos fora da política? O Ulysses Guimarães dizia quando perguntavam da vida pública que ela era pública, porque vida não era. A gente vive na política uma vida bem menos glamourosa do que se possa imaginar, porque se submete a ansiedades, angústias das pessoas, pelas redes sociais, sempre sendo demandado, com receio que qualquer gesto, movimento seja mal interpretado. Não é fácil, mas ao mesmo tempo me realiza muito. Ver o impacto que tem na vida das pessoas é extremamente gratificante. Digo isso porque não sou candidato a mito nem a salvador da pátria, sou cidadão, ser humano e entendo que tenho uma vocação que coloco à disposição para atuação na política.

Eu vou estar presente certamente no debate político deste ano, como líder de um projeto, como candidato, logo mais saberemos em que condição, mas não me eximirei de uma participação ativa.


RAIO-X

Eduardo Leite, 37
Nascido em Pelotas, é bacharel em direito pela UFPel (Universidade Federal de Pelotas). Filiado ao PSDB, foi vereador, secretário municipal e prefeito em sua cidade natal. Eleito em 2018, aos 33, governador do Rio Grande do Sul.

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