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Aliados do centrão demonizam governo, que precisa recompor base, diz senador petista

Humberto Costa, vice-presidente e coordenador eleitoral do PT, admite problemas na comunicação e articulação de governo

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Brasília

Vice-presidente nacional do PT, o senador por Pernambuco Humberto Costa, 67, atribui a um pecado de origem a expressiva participação do centrão no ministério de Lula (PT), sem contrapartida no Congresso Nacional.

"Hoje são 9, 12 ministérios que estão na mão do centrão, de partidos que não dão a mínima resposta política em relação a pautas importantes para o governo", disse em entrevista à Folha.

Afirmando que muitos beneficiários de emendas demonizam o governo na ponta, incluindo prefeitos, o senador defende a recomposição da base.

O senador Humberto Costa (PE), coordenador do grupo de estratégia eleitoral do PT - Pedro França - 3.jul.2024/Agência Senado

Coordenando o grupo de trabalho encarregado da estratégia eleitoral do PT, Humberto Costa admite problemas na comunicação, articulação e coordenação do governo Lula, mas aposta em um melhor desempenho nas eleições de outubro.

O Datafolha indicou estabilidade na aprovação do governo, mas há um percentual expressivo de reprovação. Qual a origem do problema?
Tem um problema de comunicação. Está melhorando, mas ainda precisa ter uma melhora muito expressiva no que diz respeito às redes sociais. Acho que o governo fez muitas coisas, as coisas não chegam até as pessoas. E, às vezes, também não chegam porque alguns dos atores políticos de hoje usufruem dos recursos do governo e são contra o governo. A gente tem que enfrentar a nossa debilidade própria e tem que enfrentar essa comunicação ativa contra a gente.

Muitos aliados que têm ministério, muitos partidos que têm ministério, que têm emenda, que têm espaço e que lá na base trabalham o tempo inteiro para demonizar o governo, para demonizar o PT. Então, o problema da comunicação é muito complexo.

O sr. acha que a própria base aliada contribui para a reprovação do governo?
Tem muita gente que faz parte da base desses partidos aí que, embaixo, lá na ponta, trabalha contra o governo. Não tenho dúvida disso.

Alguns problemas são meio que pecados originais, na minha opinião. Cedemos muito quando houve a formação do governo. Hoje são 9, 12 ministérios que estão na mão do centrão, de partidos que não dão a mínima resposta política em relação a pautas importantes para o governo.

A gente não pode entregar todos os anéis porque depois vêm os dedos. Houve um problema, pecado original. E nos estados essa coisa também é muito forte. Prevaleceu o critério que cada deputado tem que ter um órgão público. E, na verdade, isso também não se traduziu em votos.

O sr. acha que isso causa uma frustração na base original do governo?
Frustração, mas também todo mundo compreende a situação. Agora, houve um erro inicial, no sentido de que se deu muito espaço para esses partidos, sem o compromisso de ter resposta para aquilo que é crucial. Hoje, nós temos que lutar para aprovar a pauta do governo e lutar para impedir que seja aprovada a pauta da oposição. Essas pautas de costumes, contra os indígenas, contra os direitos humanos.

E a base vai toda junta, né?
Uma parte grande, né? E a desculpa é, digamos, algo incompreensível. ‘Não, nós temos compromisso com a pauta econômica.’ E olhe lá, né? Além disso, não tem compromisso nenhum. Como pode um ministro dizer isso do seu partido, da sua base?

O sr. fala em impedir a pauta da oposição, mas o que se viu no Senado foi a omissão do governo. Os próprios líderes disseram que o governo tem que focar no que une, economia. É a estratégia errada?
Não, acho que em alguns momentos isso tem que ser levado em consideração porque a repercussão das derrotas do governo é sempre ruim. Mas há temas que a gente precisa ter capacidade de vislumbrar o enfrentamento porque as coisas podem não ser catastróficas como se pensa.

A extrema direita teve dois reveses muito importantes recentemente. Um deles foi o chamado PL do estupro, que eu acho que muita gente vacilou para entrar nessa briga. Ainda bem que o governo entrou, mas depois que viu que tinha uma coisa forte da sociedade.

Aí você pega essa PEC da privatização das praias, que eu acho que a gente, enquanto governo, entrou meio devagarinho. Depois é que a coisa foi sendo assumida e tal. Há temas que têm que ter enfrentamento.

Qual a solução para a infidelidade do centrão no Congresso? O que o sr. propõe, uma reforma ministerial?
Acho que precisa. E acho que o governo tem essa percepção. Quando passar a eleição municipal, já serão quase dois anos de governo. Sempre é um bom momento para fazer uma avaliação do que funcionou.

Certamente não é aceitável que existam propostas que o governo tenha 120, 130 votos, quando, na verdade, o tanto de partidos representados no governo é muito maior do que isso. Tem que ter uma mudança. E tem que ser uma mudança que recomponha a base política dentro do Congresso Nacional.

Como exigir desses aliados fidelidade?
Ora, os caras não têm ministério? Os ministérios não são importantes para fazer política? Os caras não foram para lá como exigência dos partidos? Tem que ter uma contrapartida em relação a isso. Se tal ou qual ministro não tem força política para representar a sua base, que se discuta isso.

Criou-se a expectativa de que, com a saída do ministro Paulo Pimenta da Secom, haveria reforma ministerial, o que não aconteceu. O sr. acha que o governo perdeu a oportunidade?
Pessoalmente acho que a necessidade de mudança já vem há um certo tempo. Mas acho que o presidente vai saber qual é a hora. Eu imagino que, à luz dos resultados da eleição municipal, é possível que haja algum tipo de composição. E acredito que essa questão da sustentação do governo no Congresso vai estar no núcleo de uma eventual mudança.

[Alexandre] Padilha vai resistir até lá? Arthur Lira já o chamou de desafeto pessoal e incompetente.
Não é normal que você tenha uma articulação política em que uma pessoa que é titular não tenha mais diálogo com o presidente de uma das Casas. Óbvio que não cabe ao presidente da Câmara definir quem vai ficar à frente. Mas é óbvio que é um problema você ter que ter uma outra pessoa que faz esse diálogo imediato.

Não quero entrar no mérito das razões que levaram a isso. Agora, o fato de que a gente tem tido algumas derrotas importantes aqui mostra que temos um problema na articulação política do governo com o Congresso.

Aliados de Bolsonaro falam que a eleição municipal vai servir de bússola da preferência do eleitor, inclusive com impacto nas eleições para presidente da Câmara e do Senado. O sr. concorda?
Não. Porque a eleição municipal tem as características da localidade que extrapolam inclusive essa disputa política. No Nordeste, por exemplo, tem muita gente do PP que se relaciona com o governo, o PT. Então, uma leitura fria do resultado em relação aos partidos, não creio que tenha expressão muito grande de quem tem mais força ou não.

Tem alguns lugares que obviamente isso vai pesar. O resultado da eleição de São Paulo vai ser um resultado político de dimensão nacional que permite fazer uma leitura. O que vai acontecer em Belo Horizonte. Não é somente a questão do PT. No Rio de Janeiro, acho que a vitória do Eduardo Paes [PSD] é uma vitória nossa, assim como Boulos.

O sr. citou três capitais, SP, BH e RJ como resultados que permitiram uma leitura nacional.
Não, eu acho que esses três resultados são importantes. Tem Porto Alegre, que nós estamos na disputa. No Nordeste, acredito que temos muita chance em Fortaleza e em Teresina. Temos uma grande chance no Maranhão. Estamos disputando no Rio Grande do Norte e em João Pessoa também. Em Recife. Com toda certeza, o resultado de 2024 será melhor que o resultado de 2020. O PT vai crescer.

O sr. falou do problema de comunicação, mas segurança pública também é apontada como uma das maiores preocupações do brasileiro. De que forma isso tem aparecido nas eleições?
Muito forte. Inclusive fizemos uma pesquisa qualitativa e realmente o tema da segurança pública está entre os primeiros. Saúde e educação vêm depois. Veja que coisas como inflação, desemprego e tal, não estão na cabeça. Acho que o governo está consciente de que não tem como não se mexer, não se intrometer nisso.

O que existe de proposição global para a segurança pública hoje é essa da extrema direita, que é pau, matar gente, essas coisas todas. Segurança pública vai ser um tema e o governo tem que dar uma resposta a isso no curto prazo, senão a própria disputa de 2026 nós vamos entrar com o pé no cano.

Eu acho que vai ser o tema, tem sido em toda eleição. E onde a gente sempre tem sofrido porque a conversa deles é que a gente gosta de bandido, essa conversa toda.


RAIO-X | Humberto Costa, 67

Senador da República e vice-presidente nacional do PT, é coordenador do grupo de trabalho do partido para as eleições municipais. Foi ministro da Saúde entre 2003 e 2005, no primeiro governo Lula. Médico e jornalista, foi também vereador, deputado estadual e deputado federal.

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