Que imposto é esse

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Que imposto é esse - Eduardo Cucolo
Eduardo Cucolo

SP e indústria ganham com reforma tributária, mas transição traz risco, diz diretor do Ciesp

Tributarista Helcio Honda vê equívocos em imposto seletivo e solução para Zona Franca de Manaus

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São Paulo

A desoneração do setor industrial com a reforma tributária é tão significativa que mesmo uma alíquota somada de 26,5% sobre o consumo trará ganhos para o setor. Essa é a avaliação do advogado Helcio Honda, diretor do Departamento Jurídico da Ciesp (Centro das Indústria do Estado de São Paulo) e sócio fundador do escritório Hondatar.

"Uma alíquota de 20% seria o ideal, mas se você fizer a conta do resíduo tributário, que você absorve pela cumulatividade, por incrível que pareça, ainda é melhor esse sistema do que o que nós temos hoje", afirma o tributarista em entrevista para a Folha.

Ele também espera que o sistema de devolução dos créditos de tributos sobre insumos seja rápido e faz uma analogia com a devolução do IVA (Imposto sobre Valor Agregado) europeu para turistas de fora da região

Homem de terno e gravato no corredor do seu escritório
Helcio Honda, diretor do Departamento Jurídico da Ciesp (Centro das Indústria do Estado de São Paulo) e sócio fundador do escritório Hondatar - @timoteoanderson/Divulgação

"Quando você faz compras na Europa, pega a nota, preenche o formulário e, no aeroporto, é reembolsado. É um sonho de consumo para a indústria aqui, que fica anos para recuperar um crédito tributário."

Apesar desses pontos positivos, o diretor do Ciesp afirma que o período de transição para os novos tributos trará muitas dificuldades para as empresas e que a manutenção do IPI (Imposto sobre Produtos Industriais) é a forma errada de se garantir a necessária sobrevivência da Zona Franca de Manaus.

Veja trechos da entrevista.

SISTEMA DISFUNCIONAL
A reforma é um passo importante, porque o atual sistema é totalmente disfuncional. O ICMS é o nosso principal vetor de problema. Não só as 27 legislações. Temos muitas sub-legislações. Cada estado tem um formato, você tem substituição tributária, diferimentos, regimes especiais, então realmente ficou muito complexo.

TRANSIÇÃO
Descomplicação total teremos somente em 2033. Até lá, vamos conviver com dois sistemas. Para esses anos realmente vai ser muito difícil. A proposta é a alíquota começar com 1% e ir subindo, e as outras têm que fazer o contrário. O que sobe sempre é simples, o que desce nunca é tão fácil, em se tratando de tributos. A transição tem que ser rápida. Se você acredita no sistema, não precisa ficar testando alíquota.

BENEFÍCIO PARA INDÚSTRIA
O ponto que para o setor industrial é fantástico é o princípio da não-cumulatividade plena. Quando você fala na não-cumulatividade, não está falando só da sua empresa, tem que olhar a sua cadeia produtiva inteira. Se você não tem crédito [do tributo], ele virou custo, está no preço. Esse resíduo de perda vai chegando até o último componente, que vai vender ao consumidor final. Esta perda é muito grande para a indústria, para cadeias longas. Por isso a indústria tem apoiado a reforma.

Outro ponto positivo é a questão dos ressarcimentos. Hoje o ICMS não tem prazo de ressarcimento. Quando você faz compras na Europa, pega a nota, preenche o formulário e, no aeroporto, é reembolsado. É um sonho de consumo para a indústria aqui, que fica anos para recuperar um crédito tributário.

ALÍQUOTA
Uma alíquota de 20% seria o ideal, mas se você fizer a conta do resíduo tributário, que você absorve pela cumulatividade, por incrível que pareça, ainda é melhor esse sistema do que o que nós temos hoje. Para muitos setores vai ser positivo, exceto para a indústria da construção civil e para o saneamento.

ZONA FRANCA
A reforma constitucional tratou de cinco tributos de consumo: IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS. Dos cinco, quatro vão acabar, um vai remanescer. Até 2073, se não for prorrogado, como sempre foi, nós teremos o IPI, por conta da Zona Franca, um imposto anacrônico, sem sentido, que não é moderno. A Zona Franca não subsiste sem o IPI. Ele cria um diferencial competitivo enorme. Quem vai pagar essa conta vai ser o consumidor.

Tinha que ter outra medida compensatória, e não uma medida tributária. Não discutimos e não retiramos a importância da Zona Franca. Tem que realmente ter uma proteção, porque sem a Zona Franca realmente é muito difícil ter emprego, ter a proteção da floresta. Porém eu entendo que a proteção está errada.

IMPOSTO SELETIVO
Tem que limitar muito o conceito do que pode ser fato gerador do imposto seletivo. Quando discutiu a emenda constitucional [da reforma], o intuito era esse, o imposto sobre itens danosos à saúde. Mas veio "à saúde ou ao meio ambiente". Virou arrecadatório, virou o conceito que era o IPI, que a gente queria extinguir. Aí entraram situações como o carro elétrico, o carro a combustão, as bebidas açucaradas. E o retrocesso maior: somos exportadores de minério de ferro e vai ter imposto seletivo que vamos exportar.

SPLIT PAYMENT
Tem uma figura nova chamada split payment, muito controvertida. A teoria seria que, ao fazer o pagamento, o próprio sistema bancário pega e vai fazer a separação [do imposto]. A inspiração foi o Simples, que são vários tributos que você paga em uma alíquota só. Todo mundo falava, mas quem vai gerir isso aqui? Como é que a Receita vai receber? Na hora que você paga a guia do Simples, já faz a divisão.

Mas o IVA tem uma particularidade, você tem que abater o crédito. Eu paguei R$ 1.000 mais os 27% do IVA, R$ 1.270. O banco vai retirar os R$ 270 e dar R$ 1.000 para você. Mas você vai falar, "eu não tenho que pagar R$ 270, porque tenho crédito". Como é que vai fazer essa compensação? A regulamentação do split payment é um grande desafio. Evita a sonegação? Realmente. Mas é uma dificuldade operacional grande.

SÃO PAULO GANHA
Por conta do destino e do fim dos incentivos fiscais, São Paulo a médio prazo tenderia a ganhar. Ele tem o maior mercado consumidor e hoje é o grande perdedor com os incentivos. A mercadoria acaba vindo aqui, e a gente tem que pagar o crédito dos outros.

Se você olhar a colocação das plantas industriais, elas se movem pela questão tributária. Isso devia estar no fim da lista de preocupações. Tem de pensar em logística, canais de distribuição, mercado consumidor, fontes produtoras. Essas questões ficam em terceiro plano.

Você consegue estabelecer uma empresa frente a um concorrente com uma diferença absurda entre preços relativos. O fim desse incentivo regional ajuda bastante, com uma alíquota mais uniformizada. É outro ponto fantástico. Hoje você nem sabe quantas alíquotas têm de ICMS.

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