Becky S. Korich

Advogada, escritora e dramaturga, é autora de 'Caos e Amor'

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Becky S. Korich

Brasil do Norte, Brasil do Sul

Se a Coreia pode, por que nós não podemos?

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O lampejo do governador de Minas Gerais, Romeu Zema, sobre a divisão do Brasil, atiçou os defensores do "muro já". Um dia depois ele mudou o tom e disse que a sua fala foi tirada de contexto, mas, fato ou fake (é só ler a entrevista para tirar uma conclusão), a ideia do separatismo ficou no ar e produziu os seus efeitos. O primeiro deles foi a queda da popularidade do governador, que desceu para o Sul na tabela do ranking da popularidade digital.

"Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia"

A ideia é antiga, época em que ainda éramos colônia portuguesa. O lugar era o mesmo, na então capitania de Minas Gerais. Embora não fosse estritamente separatista, a Inconfidência Mineira tinha um caráter regionalista. Não alcançou imediatamente seus objetivos, mas fez nascer o Brasil que é hoje. Os idealizadores —Tiradentes, Claudio Manuel da Costa e seus consortes— defendiam a independência política da Coroa Portuguesa. Lutavam por justiça, liberdade e igualdade.

O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), em evento de debate dos 10 anos do arcabouço jurídico anticorrupção brasileiro, em São Paulo
O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), em evento de debate dos 10 anos do arcabouço jurídico anticorrupção brasileiro, em São Paulo - Zanone Fraissat - 31.jul.23/Folhapress

"A novidade era a guerra entre o feliz poeta e o esfomeado"

Na mesma Minas Gerais, ressurge essa ideia "genial", cheia de aspas: a criação de uma união dos Estados do Sul e Sudeste, com base no "protagonismo" dos estados situados nessa região. Com um objetivo inverso ao da Inconfidência: menos justiça, liberdade e igualdade.

"Essa alma brasileira
Despencando da ladeira"

A integridade territorial do Brasil já resistiu a vários movimentos separatistas, mas esse em especial tem uma fundamentação "brilhante": não se pode (sic) "dar um tratamento bom para as vaquinhas que produzem pouco e deixar de lado as que estão produzindo muito". A teoria das vaquinhas, talvez tenha sido uma forma elegante de falar: de um lado os "produtivos", do outro, "os outros".

"Mas o Brasil vai ficar rico
Vamos faturar um milhão
Quando vendermos todas as almas
Dos nossos índios num leilão"

A verdade é que separados já estamos. Vivemos mundos diferentes, da falta de luz elétrica a cidades inteligentes, num mesmo Brasil dividido, desencontrado e desigual. Só falta construir o muro. Curioso que o Centro-Oeste foi deixado de lado no discurso: seria uma região híbrida de acordo com a produção do ano? Mas vê-se no traço do mapa separatista que Mato Grosso está inserido no bloco Sul-Sudeste, um pequeno ajuste territorial em nome da soja e do milho.

"Da força da grana que ergue
E destrói coisas belas"

Sob os aspectos políticos e econômicos, tudo estaria "resolvido". Mas teríamos que nos acostumar com acarajé sendo comida internacional no Brasil do Sul, Rita Lee sendo uma estrangeira para o Brasil do Norte. Teríamos dois times para disputar a copa do mundo: chances dobradas (ou divididas?) para vencer. E, claro, Jericoacara, Fernando de Noronha e Trancoso ficariam como enclaves do Sul e Sudeste, para os "mais produtivos" descansarem.

"O Brazil não merece o Brasil
O Brazil tá matando o Brasil"

Não é hora de mais divisões. Não é porque estamos cheios de pedaços, é que podemos nos deixar estraçalhar.

"Alguma coisa está fora da ordem."

Salve Chico, Gil, Lenine, Renato Russo, Caetano, Elis e todos os que fazem o nosso Brasil ser um.

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