Helio Beltrão

Engenheiro com especialização em finanças e MBA na universidade Columbia, é presidente do instituto Mises Brasil.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Helio Beltrão

'Wokeism' é o exagero dos despertos

Precisamos ter empatia com injustiçados, mas sem vitimismo e culpa automática

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Na antiga Grécia, antes mesmo de Platão e Aristóteles, o conceito de "isonomia" foi consagrado como o mais perfeito ideal político. A isonomia foi o antídoto que a democracia grega encontrou contra a tirania e o governo aristocrático, regime de privilegiados que detêm mais direitos que os demais. Demóstenes, grande orador, exaltava a isonomia, aplicável a todos, que "invalida qualquer lei que não afete os cidadãos igualmente".

Naquele momento, no entanto, mulheres e escravos permaneceram como "subcidadãos", sem direito a voto. Mas o ideal político dos gregos perdurou e se espalhou lentamente, sob a alcunha de "igualdade perante a lei". A humanidade amargou 2.400 anos para que a isonomia passasse a vigorar no mundo livre. Agora, depois de pouco mais de cem anos, estamos deturpando o conceito e passando dos limites, com o "wokeism".

A palavra "woke" (ou "desperto") significa "alerta e consciente contra preconceito e discriminação na sociedade". É saudável e imprescindível que todos tenhamos empatia com os indivíduos marginalizados, injustiçados, humilhados. É meritório, portanto, estar "woke". No entanto, é um problema aplicar sistematicamente a doutrina do "wokeism", que santifica o vitimismo e atribui culpa automática baseada no tom de pele, gênero, orientação sexual, ou status social.

Sua premissa pode ser traduzida assim: sempre que houver uma proporção de cargos de liderança distintas da população, ou diferenças de renda, necessariamente é devido à discriminação.

O "wokeism" é descendente do marxismo e de sua filosofia do ressentimento contra os "opressores" ricos. Mas é ainda pior, pois propõe um igualitarismo radical, que transborda do ressentimento ao ódio. Não se baseia em respeito, cordialidade, tratamento justo, gentileza, imparcialidade. É uma atitude de fúria contra um certo "poder social percebido", que descamba para caça às bruxas, censura, cancelamentos e humilhações públicas, tema discutido aqui nas duas colunas anteriores.

Ao olhar as pessoas como peças de Lego que compõem um aglomerado de uma classe identitária —não como um indivíduo responsável por suas ações—, há uma desumanização, que suprime a empatia e libera a verve descontrolada. E não se endereça o problema do marginalizado, pois um mero tuíte não promove mudança concreta. O ódio ao rico é maior que a empatia ao marginalizado.

O ideal do igualitarismo é, por definição, incompatível com a isonomia. A sua busca é uma distopia abominável, como ilustrou o escritor americano Kurt Vonnegut no início do conto "Harrison Bergeron": "O ano era 2081 e todos eram finalmente iguais, não apenas perante Deus e a lei. Eram iguais em tudo. Ninguém era mais inteligente, bonito, forte ou rápido que os demais. Foi uma conquista das emendas 211, 212, e 213 da Constituição...".

É fácil perceber que, no dia seguinte a um distópico igualitarismo material forçado, todos voltariam a ser diferentes. Indivíduos livres nunca serão iguais; e indivíduos iguais nunca serão livres. Os adeptos do "wokeism" não percebem as consequências desastrosas do igualitarismo. A natureza humana, tão desprezada pelo "wokeism", evidencia que os indivíduos possuem distintas disposições a trabalhar, preferências de profissão, talentos, aspirações...

O "woke" se vê como defensor de "justiça social", mas, como dizia Hayek, toda vez que se agrega "social" a outra palavra, o novo termo passa a significar o contrário. De fato, propõe-se um justiçamento revanchista em prol de um grupo seleto.

Há na verdade uma classe com direitos distintos, geradora de inequidades e legitimada em lei. É o Estado, que pode suprimir liberdades individuais, esbulhar propriedade e imprimir dinheiro para si. Mas curiosamente essa classe não é foco dos despertos.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.