Jerson Kelman

Engenheiro, foi professor da Coppe-UFRJ e dirigente de ANA, Aneel, Light, Enersul e Sabesp

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Jerson Kelman
Descrição de chapéu Energia Limpa

Reservatórios de regularização estocam água quando sobra e usam quando falta

Aumento da frequência e da intensidade de secas e cheias deve ser enfrentado com 'ação adaptativa'

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Como engenheiro com formação em hidrologia, estive envolvido em diversas crises hídricas, inclusive a energética, causada pelo esvaziamento dos reservatórios das usinas hidrelétricas, em 2001, e a de abastecimento de água para a Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), em 2015.

Por isso não me surpreendi quando fui procurado por alguns jornalistas que, motivados pela atual seca que ocorre na maior parte do Brasil, queriam saber sobre perspectivas de colapsos ainda em 2024 —tanto de abastecimento de água quanto de suprimento de energia elétrica.

Carro aparece na margem da represa Billings durante a seca de 2015 - Jorge Araújo - 29.jan.15/Folhapress

Respondi que, como todos sabem, alguns dramas já estão ocorrendo. Por exemplo, incêndios florestais e colapso da navegação em rios da região Norte, com interrupção do fluxo de pessoas e de mercadorias. E que certamente outros problemas localizados surgirão ainda em 2024, antes do final da estação seca.

Porém, não prevejo dificuldades de abastecimento de água na RMSP e de abastecimento de energia elétrica em todo o país, porque ainda há suficiente água nos reservatórios, construídos décadas atrás.

Completei a resposta explicando que as usinas térmicas estão sendo acionadas não por falta de água nas hidrelétricas, como ocorria no passado, e sim para atender o pico de carga no final da tarde, quando as placas fotovoltaicas param de produzir e o consumo de eletricidade aumenta. Ou seja, em 2024 as térmicas atendem a uma necessidade de potência (produção instantânea), não de energia (produção média), diferentemente do que ocorreu em 2001 e 2021.

Nos últimos anos, a construção de novos reservatórios tem sido obstaculizada devido aos impactos locais, em geral deletérios, tanto os ambientais (por exemplo, corte de vegetação) quanto os sociais (por exemplo, reassentamento das famílias que vivem na área a ser alagada). São objeções às vezes intransponíveis.

Porém há casos em que as entidades de licenciamento decidiriam diferentemente se considerassem não apenas os efeitos locais mas também a segurança hídrica de grandes aglomerados urbanos, como a RMSP, e a segurança energética de todo o país. Ou se, inspirados na recente catástrofe que se abateu sobre o Rio Grande do Sul, incluíssem na análise o papel dos reservatórios no amortecimento de cheias pelo efeito da estocagem temporária do excesso de água.

No livro "Climate Future: Averting and Adapting to Climate Change", Robert Pindyck argumenta que limitar o aumento de temperatura em 1,5ºC ou 2ºC em relação ao período pré-industrial significa monumental esforço econômico, muito difícil de ser alcançado. Ele defende que não basta envidar esforços para diminuir a emissão de gases que causam o efeito estufa. É preciso também que se ponham em prática iniciativas "adaptativas" para proteger as populações vulneráveis das consequências das mudanças climáticas.

O aumento da frequência e da intensidade das secas e cheias deve ser enfrentado, como a humanidade tem feito há milênios, com a "ação adaptativa" de construir barragens com reservatórios de regularização para estocar água quando sobra e usá-la quando falta. Porém, antes disso, será necessário adotar uma metodologia de licenciamento ambiental com uma visão mais holística do que a atual.

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