Marcia Dessen

Planejadora financeira CFP (“Certified Financial Planner”), autora de “Finanças Pessoais: O Que Fazer com Meu Dinheiro”.

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Riscos ocultos

Questione os critérios de classificação de risco usados pela instituição financeira

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Compartilho sugestão de carteira de investimento, de perfil conservador, enviada por uma corretora a um cliente: 10% em CDI com liquidez diária; 30% em CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários) que remunera inflação + juro prefixado; 10% em fundo imobiliário; 50% em COE (Certificado de Operações Estruturadas) de três anos.

Uma carteira conservadora, na teoria, não prioriza a rentabilidade e valoriza os atributos de liquidez (resgatar/vender quando quiser) e segurança (baixo risco de crédito e de mercado), mesmo que resulte em rentabilidade menos atraente.

A carteira sugerida pela corretora não tem nada de conservadora, tem enorme concentração em risco de crédito (CRI e COE), risco de liquidez (COE, CRI e Fundo Imobiliário) e elevado risco de mercado (CRI, COE e fundo imobiliário).

Liquidez é um dos principais atributos desejados por investidores. Mesmo os considerados agressivos querem contar com a possibilidade de desfazer a posição, se assim desejarem. Não por acaso, a liquidez do mercado acionário é diária.

A carteira sugerida aloca apenas 10% em ativos com liquidez diária, quando seria razoável uma alocação entre 30% e 50% do capital aplicado, em razão de diversos fatores, como idade, cenário econômico e necessidade de complementação de caixa.

Para a ínfima parcela de liquidez a corretora indica um fundo de renda fixa classificado como “crédito privado” e “curto prazo”: potencial risco de crédito e Imposto de Renda (20%) desnecessariamente elevado.

A segunda indicação, 30% em CRI, vem acompanhada dos argumentos de que o investimento é isento de IR (verdade) e com possibilidade de venda antecipada, sugerindo o atributo de liquidez.

Em relação aos riscos potenciais, que não são poucos, nenhum comentário. Risco de crédito sem proteção do FGC (Fundo Garantidor de Créditos); risco de liquidez e de mercado, já que a venda antecipada é feita no mercado secundário, se houver comprador. Se a taxa prefixada desse título subir, a valorização poderá ser negativa.

Alocação de 10% em fundo imobiliário: risco de liquidez e de mercado, já que as cotas são negociadas no mercado secundário (se houver liquidez), pelo preço de mercado, como no caso do CRI.

Por fim, pasmem, 50% em COE! Uma complexa operação estruturada com derivativos, com vencimento em três anos. É nula a hipótese de liquidez antecipada. Possibilidade de ganho? Se o preço de todas as quatro ações envolvidas subir, no período da operação, o investidor recebe parte do ganho. Se o preço de uma das ações cair, o investidor recebe o capital de volta, três anos depois, sem nenhum rendimento.

Talvez o maior e menos transparente risco do investidor seja o potencial conflito de interesses desse aconselhamento. Se percebido ou comprovado, haverá quebra de confiança do cliente em relação à instituição.

O “fee” de um COE, além de elevado, não é conhecido, está embutido na operação estruturada. Quanto maior for o ganho da instituição financeira, menor será a chance de retorno positivo do investidor.

O ganho na venda é imediato e generoso: a instituição financeira ganha pela montagem da operação; a comissão do agente comercial, uma das mais altas do mercado, pode chegar a 5%. Ambos não dependem do desempenho da operação ou da permanência do cliente. No caso do CRI e fundo imobiliário, o ganho da intermediação financeira também é no ato.

Não posso afirmar que há conflito de interesse nesse caso, mas é seguro dizer que essa carteira não é conservadora para o investidor e é rentável para o vendedor.
 

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