Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Mauricio Stycer

Como separar o joio do trigo

Em tempos de crise, aumenta o consumo de TV, e a qualidade cai ainda mais

O programa Ver TV, apresentado por Laurindo Leal Filho entre 2006 e 2017 - Divulgação

Na semana passada, convidei meus seguidores no Twitter a perguntarem o que quisessem sobre televisão. Recebi cerca de 60 questões, a maior parte sobre novelas, mas também algumas sobre realities, curiosidades sobre alguns programas específicos, erros de programação e situações em que as emissoras desrespeitaram os espectadores.

Respondi a cerca de duas dezenas em um vídeo (está disponível em meu blog no UOL). Mas a pergunta mais difícil eu deixei de lado. "Existem critérios objetivos para definir 'qualidade' na televisão?", quis saber Tiago Barbosa.

Já tentei responder a essa pergunta várias vezes nos últimos dez anos. A maior dificuldade deve-se ao fato de que a TV aberta comercial no Brasil, oferecida de forma gratuita, é um empreendimento que depende de audiência e é mantido por publicidade.

Disso resulta que a tendência maior seja oferecer ao espectador o que se supõe que ele queira assistir.

Meu critério de qualidade se estabelece, por isso, a partir de um ponto partida muito básico: divido a programação entre a que apenas reitera fórmulas já testadas e a que se arrisca a surpreender o público e desafiá-lo a pensar. Esse segundo grupo de programas, claro, é minoritário.

Tenho a sensação de que, em tempos de crise econômica, como o atual, a situação se agrava. Parece que, enquanto aumenta o consumo de TV aberta, provocado por falta de outras opções de lazer ou desemprego, há um rebaixamento ainda maior da qualidade.

Por fim, repito algo que me parece óbvio, mas é ignorado por alguns colegas de ofício: não é possível fazer crítica sem contextualização.

Não dá para comparar novela da Globo com série da HBO, não me parece correto colocar lado a lado um programa destinado a adolescentes e outro que busca alcançar um público adulto, nem é honesto avaliar atrações de gêneros diferentes. E por aí vai.

Aproveito e respondo a outras três questões interessantes que deixei de lado no vídeo.

Bráulio Nóbrega perguntou se enxergo a possibilidade de algum dia emissoras tradicionais como Globo, SBT, Record e Band implantarem programas de crítica e autocrítica da mídia nos moldes do que foi o Observatório da Imprensa comandado por Alberto Dines.

Infelizmente, não enxergo essa possibilidade. O relevante Observatório da Imprensa na TV, que Dines apresentou entre 1998 e 2016, foi exibido só por emissoras públicas. O mesmo ocorreu com o Ver TV, apresentado por Laurindo Leal Filho entre 2006 e 2017.

Ainda que sejam concessões públicas, os canais comerciais da TV aberta não julgam necessário dar maiores satisfações sobre o que exibem e deixam de exibir. E fica por isso mesmo.

Um leitor que se identificou como Luh fez a pergunta que mais estimulou a minha imaginação. "Se você pudesse fazer voltar uma emissora de TV já extinta, qual seria e por quê? Excelsior, Tupi, Manchete ou MTV Brasil?" Adorei pensar nessa possibilidade.

Gostaria muito de ter a oportunidade de ver a programação das TVs Rio e Excelsior dos anos 1960. Era muito criança na época em que viveram seu auge. Pelos muitos relatos que existem, foram dois canais que produziram muita coisa de qualidade.

Por fim, Yuri quis saber se estou assistindo a alguma série no momento ou se só vejo programas exibidos na TV aberta. Estou vendo na Netflix (e recomendo) "Feliz!", uma série bem maluca, na qual um ex-policial e agora assassino de aluguel (Christopher Meloni) é levado a mudar de vida por causa de um unicórnio, que conversa com ele.

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