Nelson Barbosa

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

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Nelson Barbosa

A volta dos que não foram

Compor com o centrão não é necessariamente sentença de morte

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As eleições para o comando do Congresso explicitaram, mais uma vez, a importância de maioria parlamentar para a governabilidade.

Desde meados dos anos 1980, todos os presidentes que conseguiram terminar mandato recorreram a negociações com o centrão para governar. De um lado, sem maioria parlamentar, o Executivo fica sujeito a pautas-bomba e pedidos de impeachment que impedem sua capacidade de ação pública.

Do outro lado, sem participar do governo, o centrão perde acesso a cargos e recursos públicos vitais para sua sobrevivência política e econômica. Certo ou errado, o fato é que o governo precisa do centrão, o centrão precisa do governo, e isso não é de hoje.

Quem conhece nossa história sabe que, desde dom João 6º, oligarquias se apropriam de parte do Estado, seja o regime autoritário ou democrático. Antigamente o nome disso era “patrimonialismo”. Hoje o nome da moda é “extrativismo”.

Mas, para você não ficar desanimado e focando no período recente, lembro que mesmo com centrão, com tudo, também houve estabilização monetária sob o governo tucano e crescimento econômico com redução de desigualdades sob o governo petista.

Compor com o centrão parece inevitável, mas não é necessariamente sentença de morte se o governo tiver projeto político progressista e souber promover transparência em suas relações com o Congresso. Por esse motivo, li com algum cansaço críticas aos eventos desta semana como retorno à “velha política”, ao “toma lá dá cá” de cargos e verbas entre o Planalto e o Congresso.

Faz parte da política indicar pessoas de confiança para cargos públicos, desde que os indicados tenham qualificação necessária e sigam os bons preceitos da administração pública.

Se não tiverem, trocam-se os nomes e segue o jogo. No mesmo sentido, também faz parte da democracia a alocação de parte dos recursos públicos por emendas parlamentares, desde que isso seja feito com transparência e prestação de contas.

No mundo ideal de alguns colegas economistas, todos os cargos de governo deveriam ser técnicos, e todas as políticas públicas, decididas por estudos baseados em evidências (o nome da moda é RCT), sem interferência política. No mundo real, cargos de alta direção nunca são somente técnicos e, devido à complexidade dos temas envolvidos, várias questões de governo não conseguem ser resolvidas somente por avaliação matemática e estatística.

O grau de incerteza em vários assuntos sociais e econômicos, bem como diferenças de opinião sobre a sociedade que queremos, torna necessário avaliação política para governar. Nesse processo, é necessário negociar, sim, com o centrão, mas não só com o centrão. Se o centrão dá estabilidade ao governo, os polos do debate dão a direção do governo.

Na economia, o polo preponderante do governo Bolsonaro é um misto de monetarismo de museu (“o governo está quebrado”) com austríacos de circo (“o mercado resolve tudo”).

Por enquanto, os interesses do centrão e da equipe de ideologia econômica estão alinhados em achatar salários. Nas demais questões, a aliança não é tão certa, pois várias lideranças do centrão dependem de orçamento, estatais e monopólios para manter seu poder político.

E, como crescimento econômico com exclusão social tende a gerar problemas eleitorais, prevejo que o centrão terá atritos com o governo se a economia não decolar como esperado, à medida que as eleições de 2022 se aproximarem. Certeza mesmo eu só tenho uma: o centrão também participará do governo de quem ganhar a eleição de 2022.​

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