Nicolás José Isola

Filósofo, mestre em Educação, doutor em Ciências Sociais, coach executivo e consultor em storytelling.

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Liderar é ouvir o que não queremos ouvir

O que nos incomoda, se deixarmos entrar, nos molda

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Liderar não é apenas liderar uma equipe de pessoas para atingir seus objetivos. Liderar é ouvir. Mas, principalmente, ouvindo o que não queremos ouvir.

O tenista Rafael Nadal costuma dizer que é o chefe do seu treinador e do seu fisioterapeuta: ele paga a ambos. Mas se ele não deixa espaço para que eles lhe digam tudo o que pensam, por mais cru e doloroso que seja para ele como jogador, então não faz o menor sentido que eles estejam ao seu lado. Eles estão ao seu lado para dizer o que dói, o que incomoda. Porque o que nos incomoda, se deixarmos entrar, nos molda.

O mesmo deve acontecer num negócio com qualquer líder e sua equipe. Se um líder não estiver aberto a críticas, como poderá melhorar? Ou seja, como é que a mudança ocorre sem que outros atores nos mostrem um caminho alternativo ou nos digam que o caminho que estamos seguindo não é o correto?

Rafael Nadal (à dir.) e o seu técnico Carlos Moyá durante treino em Mallorca (ESP); o tenista costuma dizer que é o chefe do seu treinador
Rafael Nadal (à dir.) e o seu técnico Carlos Moyá durante treino em Mallorca (ESP); o tenista costuma dizer que é o chefe do seu treinador - Jaime Reina - 17.jun.22/AFP

Bill Gates diz que, como jogador de Bridge, tem um treinador que está sempre ao seu lado. Está ali não para dizer quão excelente Gates é, e ainda bajulá-lo, mantendo seu emprego sendo complacente. Está lá para mostrar todas as falhas. É pago para indicar a Bill Gates quais são os seus erros.

O problema é que a maioria dos seres humanos se recusa a ouvir seus erros, preferimos não os ver ou ignorá-los.

Como coach executivo, vejo inúmeras vezes equipes desenhadas com um único objetivo: mostrar ao líder que ele é o Rei Sol, que ele brilha e é lindo. Eles são satélites do seu narcisismo.

Acredite, caro leitor, isso é muito mais comum do que você imagina. Os C-Levels tendem a ouvir cada vez menos sobre seus próprios erros. Como acontece na política, nos altos escalões do poder os ouvidos ficam atentos e se escuta cada vez menos (sempre um pouco menos). O poder funciona assim desde tempos imemoriais. Os conselheiros e bobos do príncipe tendiam mais a cair nas boas graças de Sua Majestade do que a mostrar-lhe suas imperfeições.

Ser líder exige aguçar os ouvidos, por isso, é tão importante passear pelos escritórios, conviver com as pessoas, conversar com o pessoal da limpeza, sair para ver o que está acontecendo. Porque aí o líder pode receber mensagens diagonais e transversais que lhe permitem potencializar o seu papel.

Diversidade também é cercar-se de pessoas diferentes de mim, que me contam coisas incômodas de ouvir. Diversidade é aceitar que existem outras narrativas além da minha, porque a minha narrativa não é o centro do universo. Diversidade é perceber que existem muitas formas de liderar diferentes das minhas (e ainda melhores).

Um líder que se isola na sua zona de conforto, que se dedica a perguntar ao seu espelho o quão bonito ele é, é relegado ao seu ego autorreferencial, sujeito à sua gratificação a curto prazo.

Cuidado, você pode permanecer no cargo por décadas: mas ser chefe não é ser líder. Não fique confuso.

Ter autoridade para dar ordens não é ser a referência para os outros, a estrela que marca um rumo, uma visão, um sentido.

Se você é um líder, deve aumentar sua capacidade auditiva para ouvir coisas desagradáveis ou dolorosas. Aí, onde termina a sua zona de conforto, começa a grama fértil do seu aprendizado, onde as habilidades que lhe faltam podem florescer.

Se, como Nadal, você quer ser um dos melhores, então precisa se cercar de pessoas que lhe dizem o que não é agradável de ouvir. Seu sucesso depende disso: de olhar de perto as suas sombras.

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