Eliane Trindade

Editora do prêmio Empreendedor Social, editou a Revista da Folha. É autora de “As Meninas da Esquina”.

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Eliane Trindade

Produtora de cinema que veio do circo aposta em longas políticos

Ex-ongueira e artista circense, Joana Henning vai levar para a telona a saga do assassinato do ex-prefeito Celso Daniel (PT) e fazer série sobre juíza morta por milicianos

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“Quem Matou Celso Daniel?” e “A Juíza” são dois dos principais projetos audiovisuais em desenvolvimento pela Escarlate, produtora butique que chegou ao mercado em 2016 com aposta em histórias midiáticas da crônica política, social e policial brasileira.

O misterioso assassinado do ex-prefeito petista em 2002 vai virar documentário e longa de ficção, enquanto a morte da juíza Patrícia Acioli por milicianos nasce como série de TV, ambos pelas mãos da produtora Joana Henning, 35.

“Queremos emocionar as pessoas com histórias que merecem ser contadas”, diz a brasiliense, que já foi ongueira e artista de circo na juventude em Brasília e virou produtora de eventos no Rio de Janeiro, antes de entrar para o mercado audiovisual.

Foi em São Paulo que Joana ancorou o estúdio de criação e plataforma de conteúdo audiovisual, que vai da produção ao lançamento e distribuição.

Casada com Pedro Parente, ex-ministro do Planejamento no governo FHC e presidente da Petrobras na administração Temer, a produtora estreante acredita em temáticas fortes para atrair público e investidores.

A Escarlate, que já teve o ex-ministro da Cultura Sérgio Sá Leitão, atual secretário da área de São Paulo, tem trilhado caminhos alternativos para não ser tão dependente da Ancine e do Fundo Setorial do Audiovisual, princinpais fontes de financiamento do cinema nacional.

"A pandemia nos mostrou que estamos na trilha certa", diz Joana, diante da crise no setor e a transformação dos modelos de exibição e atração do consumidor.

Com o fechamento das salas de exibição e a impossibilidade de montar sets de filmagens, todos os projetos em andamento na Escarlate sofreram mudanças de cronograma e até mesmo de rota.

“Olhamos para a nossa carteira, analisamos orçamentos e viabilidade financeira e técnica nesse cenário”, explica a gestora. “Retrabalhamos conteúdos em formatos mais econômicos e em coproduções.”

Uma das primeiras medidas foi adiar o lançamento da principal aposta de 2020, a comédia “De Perto Ela Não é Normal”, escrita e estrelada por Suzana Pires, que arrastou 500 mil espectadores para o teatro.

“É um filme sobre empoderamento feminino, da jornada de uma mulher que se liberta das imposições da sociedade desde a infância à meia-idade”, explica Joana.

Coprodução com a Globo Filmes e com elenco estelar, de Ivete Sangalo a Angélica, a comédia feminista prevista para chegar às salas de cinema em abril foi reprogramada para estrear em 5 de novembro no Telecine.

“Neste cenário de pandemia, será uma estreia virtual ancorada em um campanha digital de engajamento de fãs”, diz a produtora.

O longa e a série documental do caso Celso Daniel, com direção de Marcos Jorge e roteiro de Lusa Silvestre, também passou por ajustes com a equipe em home-office.

“Adiamos a ficção. O grupo de pesquisa e roteiro mais o diretor passaram a trabalhar numa terceira plataforma, a de histórias em quadrinhos.”

O recurso barateia custos e poderá ser usado na ficção. “Estamos buscando novas formas de nos comunicar com o espectador”, explica a produtora.

A ideia é lançar o documentário em janeiro de 2022, duas décadas depois do assassinato.

Todo o desenvolvimento de “Quem Matou Celso Daniel” foi bancado com recursos da Escarlate. O documentário está orçado em R$ 3,5 milhões e o longa em R$ 6,5 milhões, ambos em negociação com canais.

“Nossa estratégica é buscar financiamento privado. Começamos a vender as janelas de exibição para cobrir o investimento”, diz Joana. Até o momento, o projeto segue sem subsídios fiscais.

“Cinema é indústria e tem que ter sócio", afirma a produtora. "Todos os envolvidos entram com risco e investimento. Seja financeiro seja prestação de serviço. Temos uma equipe engajada com o resultado do filme.”

As filmagens devem começar no segundo semestre do ano que vem, com aposta em bilheteria.

“É um filme polêmico, mas popular. Logo na abertura, deixaremos claro que é uma história a ser contada exatamente como aconteceu ou como nos foi contada. Temos responsabilidade com fatos, mesmo sendo ficção.”

A pandemia forçou mudanças também em “A Juíza”, que teve o roteiro adaptado em um trabalho remoto comandado de Los Angeles pela escritoria Laura Malin, coprodutora da série.

As locações ficaram mais enxutas. No desenho da segunda temporada, a série evoluiu para um retrato de protagonistas femininas brasileiras na luta por Justiça, de Marielle a Zuzu Angel.

“Ganhamos tempos de desenvolvimento para aprofundar as histórias para filmar no ano que vem”, diz Joana.

Certa de que a retomada do setor será mais lenta e penosa, a dona da Escarlate se permite ser otimista com o Oscar de melhor filme para o coreano “Parasita” e a consolidação do streaming, com a explosão de espectadores em plataformas como Netflix.

“A escolha do primeiro filme de língua estrangeira na categoria principal do Oscar sinaliza que o mundo quer o cinema globalizado”, analisa Joana. "Mas a boa notícia vem com a incerteza de como esses novos mercados vão retomar suas engrenagens pós-pandemia."

Ela lembra que a gripe espanhola (1917-1918) impactou decisivamente o audiovisual, marcando o surgimento dos grandes estúdios.

“Aquele momento difícil pavimentou novos caminhos e soluções”, diz ela, referindo-se ao surgimento da Paramount em 1918.

“A pandemia gerou quebradeira no modelo de exibição que então vigorava, de expositores independentes agrupados em cadeias e associações, para o de grandes monopólios vigente até agora.”

Com alma de artista e formação em canto lírico, a ex-trapezista Joana parece não se abalar diante dos sobressaltos no mercado audiovisual.

Aos 15 anos, ela começou a fazer aulas de circo, experiência que moldou sua vida pessoal e profissional. Aos 17, fundou a ONG Rua do Circo, em Brasília.

“Entendi ali a empatia direta da vulnerabilidade social com o circo, que é muito inclusivo”, diz ela, sobre o projeto voltado para crianças e adolescentes em situação de rua.

Um ambiente que a fez se multiplicar em funções como trapezista, palhaça, professora, gestora, captadora, em paralelo à maternidade também precoce.

Aos 18 anos, tornou-se mãe de Davi, 15. Anita, 5, nasceu no Rio, para onde se trasferiu, ao decidir enverendar na produção executiva de eventos como a Festa Literária de Periferias.

Uma nova guinada se deu com o casamento com Parente, em 2018, realizado em uma locação idílica, a Estufa Fria, em Lisboa. Os dois se conheceram em um aniversário de um dos filhos dele, com quem ela trabalhara.

“Começamos a conversar e bateu. Simples assim", resume Joana, sobre a paixão que impactou também o lado profissional.

Na época, Parente presidia a Petrobras, um dos maiores financiadores do audiovisual no país.

“Eu tive que fazer algumas renúncias como produtora. O que foi muito bom”, diz ela, sobre as medidas de compliance para evitar problemas de lado a lado por eventuais conflitos de interesses.

“Já era comprometida com segurança institucional, mas isso cresceu e acho que todo ambiente que fica seguro tem mais chance de prosperar.”

Depois da saída dele da Petrobras, o casal se transferiu para a capital paulista, onde Joana começa a construir sua marca no audiovisual. "Como nosso foco é captação privada, para além dos incentivos, São Paulo é o lugar."

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