A intentona do 8 de Janeiro melhorou a situação política de Luiz Inácio Lula da Silva, ao menos por algum tempo. O apoio firme do governo petista à reeleição de Arthur Lira (PP-AL) para o comando da Câmara também ajuda. O projeto luliano de se aproximar dos governadores, tratados indistintamente como parceiros, foi facilitado pelo terrorismo golpista das falanges de Jair Bolsonaro.
O resultado da eleição de outubro fizera do Congresso um território muito perigoso para Lula. A Câmara foi ocupada por uma inédita maioria de partidos golpistas, reacionários e negocistas. O PL, nacional-mensalista, reunião de negocistas ávidos com bolsonaristas, saíra das urnas com o maior número de deputados.
A distribuição meio canhestra de ministérios para a direita apenas atenuara a situação minoritária do lulismo no Congresso, vide a negociação mambembe com o União Brasil.
Dez dias depois de eleito, Lula passou a dar caneladas nas ideias econômicas do "centro democrático", aquelas elites e fatias muito minoritárias do eleitorado que o ajudaram a vencer a eleição apertada.
O presidente e o comando do PT praticamente alienaram os representantes políticos desses ditos centristas, dando-lhes lugar quase simbólico no escalão mais alto do governo. Pelo menos até agora, no que diz respeito a programas e ideias, a "frente ampla" se tornou frentinha. A aliança é mais "business as usual", divisão de poder a fim de obter votos no Congresso.
O resultado da intentona foi isolar o PL e reacionários mais animados. Parlamentares correm o risco de perder o mandato e de cadeia. Além do mais, Lula e Lira acertam a distribuição de cargos no comando da Câmara e no Executivo. As prebendas serão entregues depois da reeleição de Lira, nesta semana, o que deve organizar o bloco de apoio aos dois presidentes, talvez comum.
O país mais civilizado se juntou a Lula em janeiro. O presidente tomou providências para tentar enfraquecer o golpismo no Exército e recolocar os militares na casinha, nos quartéis, mas não apenas.
Lula ajuda a expor barbaridades maiores do bolsonarismo, como o massacre dos yanomamis ou a entrega de partes ainda maiores do país, da Amazônia em particular, ao crime organizado (garimpo, grilagem, o tráfico associado). Apareceram indícios de que ao menos praças do Exército colaboram com as tropas de ocupação do crime em Roraima, com garimpeiros, tal como o fazem milícias e policiais militares corruptos.
Por outro lado, ao menos nos discursos palanqueiros, Lula reitera o programa da "Carta para o Brasil de Amanhã". Lançado poucos dias antes do segundo turno, em economia o texto é em geral uma mistura do pior de Lula 2 com o essencial de Dilma 1.
A carta e os discursos recentes de Lula são genéricos e, apesar de assustarem donos do dinheiro grosso, ainda não têm consequência prática maior além de manterem as taxas de juros e o preço do dólar em níveis excessiva e desnecessariamente altos. Mas, assim, o presidente dá tiros no pé. Perde a oportunidade de atenuar a baixa da economia neste 2023.
As críticas de Lula a "liberais", "mercado" ou coisa que o valha poderiam até ser apenas uma espuma politiqueira de mudanças razoáveis de política econômica. A questão é saber quanto dessa conversa é retórica para as bases ou se há intenção de repetir bobagens e desastres (Dilma 1).
O país está na lama da miséria, a extrema direita é enorme, quase uma revolução popular, há golpistas por toda a parte, o Congresso muda como as nuvens sombrias, e o eleitorado se divide quase ao meio. O apoio político a Lula é instável. O risco de afundar ainda mais a economia é enorme.
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