"É comunista ou corrupto?", perguntou o militar, na ditadura, a um amigo de Marcos de Castro, então preso —o amigo apelava por sua soltura. Marcos era de esquerda. "Ruim", retrucou o militar. "Se fosse corrupto era mais fácil de soltar."
O jornalista era um alvo por escrever artigos contra a ditadura, mas não integrou movimentos considerados terroristas. Era fiador de Fernando Gabeira, então membro do MR8, e isso bastou.
Prezava por lealdade. Certa vez disse a um dos filhos: "Meu filhos, um homem não pode nem furar greve, nem ser dedo duro".
Outra convicção marcante que tinha era contra estrangeirismos. Quando perguntado se o nome da filha Luísa era com z ou s, e se tinha acento, respondia "da forma como é no Brasil. Em Portugal essa pergunta é inaceitável".
Nascido em Uberaba (MG), Marcos cresceu em um ambiente efervescente. O pai organizava encontros com muito samba e discussões políticas na casa da família —prática que ele replicaria—, e a mãe tinha uma vasta biblioteca.
Cursou letras no Rio e fez carreira no Jornal do Brasil, onde entrou como revisor. Chegou a ser editor de esportes graças ao rigor na linguagem, combatendo lugares comuns. Mas durou pouco como chefe: assim que foi orientado a demitir alguém, recusou.
Durante 20 anos, foi leitor para cegos no Instituto Benjamin Constant. Só a família sabia. Não achava que solidariedade era para se capitalizar.
Morreu no último dia 22, aos 83. Foi enterrado com a bandeira do Flamengo e sob o canto do hino, o que ele dizia que seria seu maior momento como flamenguista. Deixa a mulher Helga, os filhos Emanuel, Luísa, Lúcio e Mateus, e dois netos.
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