Descrição de chapéu Coronavírus

Cardiologista de UTI morre de Covid-19 no Rio

Celso de Almeida Felício, 68, tinha testado negativo para o vírus

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Rio de Janeiro

Já aposentado, Celso seguia trabalhando como cardiologista de UTI e atendendo em consultório. Teimoso, só não foi dar plantão no hospital na sexta-feira anterior a sua internação porque o filho e a mulher quase o amarraram em casa.

O médico Celso de Almeida Felício morreu no dia 17 de abril, no Rio de Janeiro, após contrair o novo coronavírus, aos 68 anos.

Um homem dança com a filha
O médico Celso de Almeida Felício com a filha Milena - Arquivo Pessoal

Como trabalhava na terapia intensiva em um hospital em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, Celso fez um exame para Covid-19 no final do mês de março. O resultado foi negativo. Porém, cerca de duas semanas depois, ele, sua mulher, Myriam, e seu filho, Marcelo, que moravam na mesma casa, na Barra da Tijuca, zona oeste carioca, começaram a ter febre.

Como o resultado do exame do pai havia sido negativo, não imaginavam ter o novo vírus, conta Marcelo. Ele diz que chegou a pensar, no entanto, na possibilidade de o pai ter se infectado em algum momento, já que trabalhava com pacientes que haviam contraído a doença. “‘Ele é meu pai, meu exemplo, me deu tanto, se eu pegar dele está tudo bem’. Foi isso que se verbalizou na minha mente”, conta.

Myriam, de 68 anos, ficou cinco dias na cama, sem forças nem mesmo para comer. Foi então que Celso e Marcelo, de 43, começaram a sentir falta de ar. Assim como Myriam, Celso era ex-fumante, era também hipertenso, mas mantinha o problema controlado com medicação. No dia 14, os três foram para um hospital privado na capital fluminense. Celso já quase não falava. Ao chegar, falou apenas, baixinho, “cadeira de rodas”.

Marcelo conta que a última vez que viu o pai foi no corredor do hospital, cruzou com ele, já em uma cama, quando voltava da tomografia. Após exames, Celso foi levado à UTI.

Na noite do dia seguinte, entrou em coma induzido. Segundo os médicos que o acompanhavam, ele soube do estado estável de mulher e filho. Myriam e Marcelo, que seguiam internados recebendo oxigênio, foram avisados pela equipe médica da morte de Celso na manhã do dia 17, uma sexta-feira.

“Quando eu soube da notícia do meu pai, fiquei apavorado, pela minha mãe [que é asmática] e por mim, porque eu não sentia nenhuma melhora”, diz Marcelo. “Tudo o que a gente negava vira ao contrário​ e você só pensa coisa ruim.”

Quando não estava trabalhando, o médico gostava de fazer móveis em uma mini oficina de marcenaria na casa da família, na ilha das Garças. Nos churrascos promovidos pela família, era Celso que comandava a churrasqueira. Segundo o filho, sua profissão, porém, era também sua vocação. Examinava todos que o procurassem, inclusive os barqueiros que atuam naquela região de ilhas da Barra da Tijuca.

Um irmão de Celso tomou as providências quanto ao enterro, no cemitério São João Batista, onde a família tem jazigo. Marcelo e Myriam tiveram alta no dia 20, mesmo dia em que o médico havia sido enterrado. O teste dos três, feito no hospital, deu positivo para Covid-19.

Marcelo conta que o pai, que foi diretor-geral do Hospital Federal de Bonsucesso, no Rio, reclamava, desde o início da pandemia, da falta de equipamentos de proteção adequados no hospital público em que dava plantões em Duque de Caxias. “Trabalhar sem EPI é jogar um soldado na guerra sem nem um revólver”, diz o filho, professor de língua portuguesa e filologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

“Eu considerava aquela pessoa quase mágica”, diz Marcelo sobre o pai. Foi ele, conta, que o estimulou a seguir seu desejo de cursar letras, após ficar perdido entre a música e o direito. Pianista, Marcelo foi aluno da Escola Nacional de Música, e depois entrou na faculdade de direito, mas não era aquilo que queria fazer. “‘Você tem que fazer o que ama’, ele dizia”. Celso era o pai adotivo de Marcelo, que perdeu o pai na adolescência após um infarto.

Além do filho e da mulher, Celso deixa ainda duas filhas, Carla e Milena.

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